sábado, 7 de março de 2020

Cinco Palavras de António Vieira

     Título de um novo romance de Manuel Maria, um livro à guarda do tempo na ânsia de o poder ler.

    Fossem cinco as palavras! São muitas mais, impressas em páginas que, à semelhança de outras publicações já produzidas e a julgar por outras histórias que já deram livros (também eles com títulos de cinco palavras), merecem leitura atenta.
    Um amigo lança um romance, uma amiga apresenta-o, outros amigos assistem e um rosto impõe-se aos olhos de todos e muitos mais, bem presentes, de todas as idades. Muitos vão reparando na capa, folheando o que o autor sublinha ser uma obra de ficção, com a seiva da História, da Literatura e da(s) Humanidade(s) e de uma personalidade, tão nacional como do mundo, colocada no centro da narrativa.
     Com a chancela da editora "Lugar da Palavra", a Biblioteca da Escola Secundária de Gondomar foi o ponto de encontro para sorrisos, afetos e saberes partilhados, numa fraternidade também construída com palavras ditas e escritas (tais como as do missionário jesuíta que é dado a ler).
      Padre António Vieira, orador e prosador, revive nas linhas agora escritas e expostas a um público leitor que precisa de conhecer mais do homem, do tempo e da visão do mundo seiscentista, para nele perscrutar um ideólogo do "novo mundo", um profeta, um fundador de mitos futuros feitos de fraternidade, de uma espiritualidade e de uma união de povos, etnias e línguas (das mais eruditas às vulgares). Trata-se de um pensador na vanguarda de um tempo no qual os ladrões já se multiplicavam; a cor da pele distinguia colonizadores de colonizados ou determinava a condição de dono e a de escravo; as línguas eram também confrontadas com preconceitos (como os da língua de cultura e erudição face aos linguarejares índios e negros).
     O "Pai Grande" (Payassu) foi dos primeiros a reconhecer a diferença, a tolerância nos homens e no que os define; a defender um sentido de miscigenação dos idiomas, numa legitimação tanto do culto "pulcro" como dos registos comuns do "belo" ou do "bonito", para não falar das sonoridades escutadas em todas as cores da ação missionária. A aproximação fazia-se, então, a um Quinto Império (com um Papa "angelicus" e um imperador cristão), abraçando judeus, cristãos, muçulmanos numa espécie de paraíso, a construir em vida entre os homens e não a doutrinar como prémio a alcançar depois da morte (atualidade tão inquestionável).
      Se o Homem é a língua que usa, na composição caleidoscópica de Vieira - orador, escritor, pensador, humanista, diplomata, político, "influencer" de um tempo pleno de teatralidade na vida ou de vida tão feita de teatro -, firmaram-se a multiplicidade e a multimodalidade do Português, que também é voz, face, gesto, grafia e "História de Futuro".  

     "Não é tudo isto verdade?" Eis as cinco palavras que Manuel Maria relembra, reproduz, repete, reforça para a (re)descoberta de um homem e de uma obra de tempos. Outros certamente virão (mas estes serão... Contas de um outro rosário). Ainda bem!

7 comentários:

  1. Foi, sem dúvida, um momento maravilhoso: pelos amigos incríveis, pela apresentação rigorosa e motivadora da nossa Dulce e pelo nosso querido Manel - e tudo o que possa dizer sobre ele "sabe a pouco". E "Não é isto tudo verdade?"
    Agora, o teu belíssimo texto, Vítor Oliveira, (pelo seu conteúdo e pela apurada forma) leva-me(nos) a lançar-te o desafio:para quando "um livro teu"?
    ...esperando...

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    1. Obrigado, pelas palavras e pelo desafio.
      Quanto à resposta, tu melhor do que ninguém a conheces. Quem sabe! Um dia... a seguir ao teu.

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  2. Pois, depois destes comentários de amor verdadeiro ('Não é isto verdade?'), quero dar-te os parabéns por este texto, Vítor, embora, em cada post, reveles esse imenso cuidado com a forma e com o conteúdo.
    Como gostei muito das palavras que teces sobre a tarde do último sábado, à volta do livro do Manuel Maria e dos temas - sempre atuais - que emergem da obra, fiz um convite no olamariana.blogspot.com para viajar na tua Carruagem. De facto, 'melhor era impossível'.
    E reitero o desafio: 'para quando um livro teu?', assim como reitero o desafio que fazes.
    Pode ser antes ou depois do teu, o que importa é que ambos os possam e queiram partilhar.
    Serão muito diferentes, por certo, mas excelentes, tal como vocês o são.
    Um abraço
    Dolores

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    1. Muito obrigado, Dolores, pelo desafio, pela mensagem, pela presença,... por seres quem és. Somos também o que os outros fazem de nós. O bem que somos é sempre um reflexo do bem que nos fazem (sentir). Melhor ainda quando há quem queira que sejamos e façamos mais. Muito obrigado por isso, amiga.
      Sem beijinho nem abraço (por imperativos do Covid-19), mas com toda a amizade que nos faz (querer) cruzar neste caminho da vida, com alguns lugares de encontro, no espaço e no afeto.
      VO

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  3. Meu caro Vítor:
    Antes de mais, a minha gratidão pela tua permanente presença, sempre ao lado do amigo, qualquer que seja.
    Depois, só quem não lê os teus textos publicados na CARRUAGEM 23 não sabe o que fica a perder, tal a eloquência textual que nos ofereces, qualquer que seja o tema que mereça a tua pena (nos tempos modernos, o teu teclado).
    Sobre a admiração que tenho por ti e pelo que escreves, só o pode testemunhar a total e absoluta confiança que em ti sempre depositei e que sempre continuarei a depositar, como, aliás, já te dei prova disso.
    “… um livro à guarda do tempo na ânsia de o poder ler.”
    A propósito, pretendo deixar claro, publicamente, que, se ainda o não leste, não foi por qualquer desconsideração, por mais ínfima que fosse, mas porque tanto eu como o círculo de amigos a que ambos pertencemos sabemos quanto andas sempre, e ainda, assoberbado com trabalho que te não deixa respirar. A única razão. Mas a única mesmo. No formato de livro, em papel e transportável, poderás lê-lo à medida do teu tempo e sem outros constrangimentos que possam prejudicar os teus afazeres pessoais.
    O meu abraço de profunda estima e reiterada gratidão.
    Amigo. Sempre.
    Manuel Maria

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  4. Meu caro Vítor, espero que me perdoes o atraso do meu comentário, que, aliás, já te havia deixado no Facebook.
    Só agora compreendi a razão pela qual o Google não me permitia a publicação. Não o revelo aqui para não ficarem a saber tanto como eu. Em conversa pessoal, dar-te-ei a explicação.
    Aproveito o momento para expressar a minha gratidão à Ana e à Dolores. As palavras de ambas são de um conforto enorme, muito especial, que recebo com particular alegria por se tratar de palavras de duas amigas muito queridas. Sabes bem que assim é.
    O meu abraço.
    Manuel Maria

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    1. Estimado Manel,
      Sabes que as palavras de amigos são sempre valiosas, mas do valor do teu verbo já muito aqui disse(mos) e creio que muito se terá ainda a dizer. Quando terminar a leitura das "Cinco Palavras de António Vieira", (re)escritas por Manuel Maria, outras palavras virão... as minhas inspiradas pela tua obra.
      Não há perdão nem desculpas a pedir; nem deles resposta a dar.
      Interessa estar, independentemente do tempo. Física ou psicologicamente, estamos (contigo). Deste e continuas a dar-nos muito e nós só temos disso proveito tirar. E agradecer!
      Forte abraço meu (nosso, por certo).
      VO

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