Ler um livro quando se está no local da intriga é duplamente motivador. Há quase um ano foi assim.
O encontro de Daniel Sempere com uma obra de Julián Carax (A Sombra do Vento), no Cemitério dos Livros Esquecidos, é um exemplo de paixão pelos livros; o fascínio pela escrita revê-se numa caneta que, de tão desejada e estimada, só pode ser merecida por quem vive um mesmo tipo de amor. São estas as chaves, estes os sinais de leitura para o desvendar de uma intriga feita de mistérios, encontros e desencontros, perseguições, regressos, descobertas.
"Ainda me lembro daquele amanhecer em que o meu pai me levou pela primeira vez a visitar o Cemitério dos Livros Esquecidos. Desfiavam-se os primeiros dias do Verão de 1945 e caminhávamos pelas ruas de uma Barcelona apanhada sob céus de cinza e um sol de vapor que se derramava sobre a Rambla de Santa Mónica numa grinalda de cobre líquido.
- Não podes contar a ninguém aquilo que vais ver hoje, Daniel - advertiu o meu pai. - Nem ao teu amigo Tomás. A ninguém.
- Nem sequer à mamã? - inquiri eu, a meia-voz.
O meu pai suspirou, amparado naquele sorriso triste que o perseguia como uma sombra pela vida.
- Claro que sim - respondeu, cabisbaixo. - Para ela não temos segredos. A ela podes contar tudo."
Assim se inicia o romance, a mostrar que "poucas coisas marcam tanto um leitor como o primeiro livro que realmente abre caminho até ao seu coração. Aquelas primeiras imagens, o eco dessas palavras que julgamos ter deixado para trás, acompanham-nos toda a vida e esculpem um palácio na nossa memória ao qual, mais tarde ou mais cedo - não importa quantos livros leiamos, quantos mundos descubramos, tudo quanto aprendamos ou esqueçamos -, vamos regressar"; ou, ainda e na voz de Julián, que "Os livros são espelhos: só se vê neles o que a pessoa tem dentro".
Fecha o romance como começou: num ciclo de vida que se repete e se marca por leves diferenças, por mais intensas que tenham sido as etapas que o compõem.
Assim foram acompanhadas as férias por Barcelona, cidade tão misteriosamente conhecida por Carlos Ruiz Zafón, escritor catalão; representada numa intriga que, traçada pelo imaginário do romance gótico, remonta à primeira metade do século XX. Perante o entusiasmo vivido, há escritores que vale a pena reencontrar: venha O Jogo do Anjo.
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