domingo, 30 de setembro de 2012

A propósito dos dias de ouro

      Traduzindo: "Golden Days".

       Foi com este título em inglês que fui à procura da cantora... portuguesa e mulher do Norte, carago!
       Ninguém diria. Parece uma voz daquelas de produção anglo-americana, mas, já que é portuguesa, é para bem melhor. É de ouro.


       GOLDEN DAYS

I can see that look in your eyes
I can explain why I cause you pain
I'm a dirty need in the rain
Turning the time
Tears have gone by
Without a warning or a sign
Whatever wanted was for you too

Make me feel alive
Make me feel so sweet
Make me feel complete
Make me feel so plaint
Feel divine
Make me feel so real
Make me feel so proud
Make me feel like a star
My golden days

Now that she is done
Like stones in my pride
But you are the only one
That I ever wanted to
That I ever wanted to

(You) Make me feel alive
Make me feel so sweet
Make me feel complete
Make me feel so plaint
Feel divine
Make me feel so real
Make me feel so proud
Make me feel like a star

Turning and turning
Racing my morning
Now I 'm sleeping
We ve got each other

Uh Uuuh Uh Uuuh Ah Aaah

And you make me feel alive
So sweet
Complete
So plaint
Divine
So real
So proud

Like a star
My golden days

And now I can feel
That look in your eyes?

     Fica o registo para que surjam mais cantigas com esta voz que, com “Start Stop”, se lançou com um disco a solo, depois de Mónica Ferraz ter integrado os 'Mesa'. 

      You make me feel alive / Make me feel so sweet / Make me feel complete / Make me feel so plaint / Feel divine...

sábado, 29 de setembro de 2012

Sujeitos e dependências

      Novo exemplo de sintaxe, para um caso de configuração do sujeito sintático.

     Q: A função sintática de modificador restritivo ou apositivo do nome.  
       Esta é uma função sintática interna ao grupo nominal. O sujeito, por sua vez, é uma função sintática interna ao grupo frásico, portanto, nuclear e soberana face ao modificador do nome. 
          1- A rapariga levantada é minha irmã. 
          2- A rapariga que está levantada é minha irmã. 
     Na primeira frase o grupo nominal "a rapariga levantada" é sujeito. "Levantada" é o modificador restritivo do nome. 
      Na segunda frase, já complexa, incluímos a oração subordinada adjetiva relativa restritiva dentro do sujeito também? É que essa oração ocupa a mesma função sintática e o antecedente do pronome relativo é "a rapariga".

      R: Permita-me um primeiro apontamento, por uma questão de coerência: modificador restritivo está para modificador não restritivo (ou apositivo ou, ainda, explicativo).
       Um segundo: o sujeito é uma função sintática nuclear ao nível da frase (não do grupo frásico, por esta designação estar mais para a descrição de um tipo de constituinte).
      O sujeito sintático da frase 2) é, de facto, 'A rapariga que está levantada', para o predicado 'é minha irmã'. Assim o indicam os testes de constituência (ou testes fundamentais para identificação dos constituintes):
        a) o da substituição do GN (por equivalente) : A jovem que está de pé é minha irmã.
     b) o da pronominalização: Ela é a minha irmã (Ela, quem? > A rapariga que está levantada)
        c) o da topicalização: Minha irmã é a rapariga que está levantada.
        d) o da frase clivada: É a rapariga que está levantada que é minha irmã.
        e) o da inserção: A rapariga que está levantada realmente é a minha irmã.
       f) o do par pergunta-resposta: Quem é a minha irmã? > A rapariga que está levantada.
        g) o da passiva (não aplicável).
         O constituinte mantém a sua integridade em qualquer um dos testes, pelo que se trata de uma unidade.    
    A natureza complexa da sua configuração não invalida o reconhecimento de, a um segundo nível de análise (interno), um sujeito dependencial representado pelo anafórico 'que'. A natureza dependencial da oração relativa (restritiva) justifica a sua integração no grupo nominal matriz.

       Esta questão sublinha, ainda, a importância de se trabalhar diferentes configurações do sujeito sintático, vulgarmente reduzido a grupos nominais básicos e/ou a realizações de ordem pronominal.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Uma noite depois de muitos dias

    Trocou-se a sala de aula por um restaurante.

     Para alguns, foram anos de convívio; para outros, apenas um - prova de que não é necessariamente o tempo que faz a questão.
   Não obstante as diferenças, lá estavam todos à hora combinada, sem manuais, sem cadernos, sem apontamentos. Sãos, brilhantes, crescidos.
     O entusiasmo dos que entraram no ensino superior cruzou-se com a alegria do reencontro para os que, mais ano menos ano, lá estarão também; com uma festa de aniversário com direito a "Parabéns a você" e a "ÉFE - ERRE - A"; com o convívio que, demorado ou breve, fez questão de se (a)firmar, para sublinhar o quanto valeu a pena tudo o que se conseguiu.
      No fim, um poema.


     Foram simples versos para um momento que se quer repetido à última sexta-feira de setembro, dos anos que estão para vir.

     O regresso a casa, depois de uma semana de trabalho e do desejado reencontro, não deixou de ter ecos de saudade, das aulas de 12º ano numa turma que, por variadíssimas razões, dificilmente vai ter par.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Pessoa: de toda a gente e ninguém

   Prestes a celebrar 125 anos de nascimento (em 2013), começa a comemoração já este ano, a propósito do Dia Europeu das Línguas que ontem se festejou e que, num dos cartazes do evento ("As Línguas Abrem Caminho"- 2010), pôs Fernando Pessoa como rosto do país.

   As línguas, na sua realização mais popular, tem expressão em pequenos poemas, como as quadras.
   Pessoa produziu muitas e sobre elas vão os alunos pronunciar-se num discurso de um minuto. Têm de apresentar o poema, declamá-lo, indicar as palavras / expressões-chave e explicar por palavras próprias a mensagem transmitida.
   Alguns dizem que um minuto é pouco tempo, mas, quando chega a hora da produção, o minuto reduz-se a trinta / quarenta segundos. Outros ultrapassam ligeiramente os sessenta segundos.
   O certo é que passam a falar do autor; veem como o poema recorre a muitas palavras que, de tão comuns, acabam por ganhar uma dimensão metafórica; trabalham um texto que reflete mensagens muito úteis - algumas moralizadoras, outras bastantes acessíveis à lição e ao conhecimento de mundo de qualquer ser humano, outras ainda muito associadas a um Pessoa que irão conhecer daqui a alguns anos.
    Por ora, familiarizam-se com pequenos textos, memorizam-nos, declamam-nos, ilustram-nos e pesquisam a caricatura de um criador com muitas faces.

    Assim, na voz desse poeta, verificam como a língua se faz sua pátria ("A minha pátria é a língua portuguesa" - Bernardo Soares).

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Das "virtudes" literárias na boca de ministros...

    Os últimos tempos têm sido pródigos no recurso à literatura em bocas ministeriais.

    Houve já tempo em que um primeiro ministro foi elogiado pelo seu interesse pela literatura portuguesa e pela forma como discorria, junto ao Tejo e na companhia de um jornalista, sobre textos e autores portugueses - tudo isto mais na avaliação de alguns incautos do que propriamente daqueles que viam o país ir ao fundo numa "crónica de morte (mais do que) anunciada".
    Hoje repete-se a cena (não vejo melhor termo, lembrando a expressão de alguns alunos meus, quando se referem a algo que os incomoda: "Que cena!"). Passos Coelho cita Camões, reportando-se ao canto V e aos versos que, na voz de um Vasco da Gama junto do rei de Melinde, lamentam o facto de não se achar "Nenhum sinal aqui da Índia", "Sem vermos nunca nova nem sinal / Da desejada parte Oriental". Viriam, depois, os ventos favoráveis que conduziriam os navegadores à terra ansiada.
    Com tais sinais de cultura, na ânsia de uma Índia para estes nossos tempos, só espero que a Literatura não se torne exemplo para a realidade (tal como a querem fazer parecer). É que da Índia euforicamente desejada, no canto V, cedo o poeta passou à disforia com que se passou a ver o destino alcançado, no canto VIII: 

"Veja agora o juízo curioso
Quanto no rico, assi como no pobre, 
Pode o vil interesse e sede immiga 
Do dinheiro, que a tudo nos obriga."

     Em terra dominada pelo "ouro", por esse vil metal "luzente e louro", a vida humana pouco vale - reflexão tão atual para estas terras tão lusitanas, mais atentas à economia e à finança mundial do que ao valor da pessoa humana. Caso para pedir ao Senhor Primeiro Ministro que leia Os Lusíadas na íntegra; que descubra que a Índia não foi o local onde se acolheu "um fraco humano", esse "bicho da terra tão pequeno". Perceberá, então, que não estamos tão interessados assim em lá chegar, onde por certo não se "terá segura a curta vida" por ser local que vê preterida a vida humana, troca-a pelo poder do dinheiro.
      Certo é que, no regresso, os marinheiros "Entraram pela foz do Tejo ameno" e "houveram vista do terreno / Em que naceram, sempre desejado" - e só o fizeram porque (ainda) havia pátria.

     E, de novo, surgem as palavras e a reflexão quinhentistas tão adequadas ao nosso tempo presente: "Oh! Grandes e gravíssimos perigos, / Oh! Caminho de vida nunca certo, / Que aonde a gente põe sua esperança,/  Tenha a vida tão pouca segurança!".

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Acordai... e... a cor dai

       Em tempos cinzentos escuros, de tanta crise, é preciso cor.

      Se nos anos sessenta do século XX havia a expectativa e nada mudava; se hoje se espera e pouco ou nada se alcança, o tempo repete-se.
     Também nos anos sessenta, Luís de Stau Monteiro, no seu Felizmente Há Luar!, punha na voz dos populares a frustração face às mudanças que não aconteciam. E na ânsia ou no temor da liberdade, lá figuram os interesses relacionados com a música: 


Sequência de slides sobre Felizmente Há Luar! - Entre o tempo representado e o(s) tempo(s) transposto(s) 
produção de Vítor Oliveira

     E ainda nos anos sessenta Fernando Lopes Graça e José Gomes Ferreira conjugaram a música e a poesia, para um "Acordai" que é um dos mais belos exemplares das cantigas de intervenção da história nacional.

Exibição do Coro de São Domingos

       ACORDAI

Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raiz

Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações

Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!
     
       Era tempo... melhor... É tempo de não só nos livrarmos de quem nos (des)governa mas também nos recordarmos de quem nos colocou neste desgoverno - duas faces para uma mesma moeda ou, então, muitas caras que não nos têm dado nenhuma moeda em troca. Só no-la tiram.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Para Roma, com Amor (I)

       Em Portugal, hoje é dia de estreia....

       Mais um filme de Woody Allen, desta feita dedicado à 'Cidade Eterna'.
     O anagrama Roma / Amor, no Português, resulta na perfeição - o que não sucede no título de outras línguas (nomeadamente a da produção fílmica).
      Depois de 'Meia-noite em Paris' (que apreciei bastante), fico com expectativas relativamente a mais esta outra película inspirada numa cidade que adorei visitar, há cerca de dois anos.
        Fica a lembrança noturna desse espaço que nos marca, pela herança cultural que nos impõe.

      
       Mais dia menos dia, lá estarei no cinema (já que, em Roma,... sempre será mais difícil lá regressar).

       Sabe bem recordar alguns dos espaços calcorreados.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

(Re)Visão

     Passada uma semana, a reposição da ordem.

    Em apontamento anterior, tive a oportunidade de me referir à falta de visão, e ao erro propagado em capa de revista, sobre as mudanças no ensino e a questão "O que andam a aprender os nosso filhos?".
    Esta semana, na coluna do "Correio do Leitor", há uma pequena nota intitulada "Correções", na qual pode ler-se alguma da reposição que se impunha.


    Não se conclua daqui que os complementos agentes da passiva ("outros complementos exigidos pelos verbos") passam a oblíquos. Também não é, portanto, totalmente verdade o que se lê. 
     A economia de espaço da nota não é compatível com maiores explicações, tendo ficado apenas registado que há complementos diretos (os tipicamente pronominalizáveis por 'o'/'a', 'os'/'as', mais as variantes 'lo'/'la', 'los'/'las' e 'no'/'na', 'nos'/'nas') e indiretos (os que, na terceira pessoa, admitem a pronominalização 'lhe'/'lhes'). Há outros complementos, para não mencionar os predicativos, uma forma de complementação em contexto de verbos copulativos (que selecionam predicativos do sujeito) e de verbos transitivos predicativos (que selecionam complemento direto e predicativo de complemento direto).

     E quanto ao resto do apontamento, muito fica por dizer, rever e corrigir. Mas isso significaria que teria de ser feito um novo conjunto de páginas, para se contra-argumentar, infirmar, refutar quem foi citado ou quem citou, pensando que estava a escrever o mesmo que ouviu dizer.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Versão tudo e nada...

    Tão malogrado é o dia!

    Para tão malfadada data, fica uma bela melodia para contrabalançar o mal que o dia consigo arrasta no tempo - uma versão que os Maroon 5, numa interpretação de Adam Levine, fizeram para a canção de Alicia Keys.


If I Ain't Got You

Some people live for the fortune
Some people live just for the fame
Some people live for the power, yeah
Some people live just to play the game
Some people think that the physical things
Define what's within
And I've been there before
But that life's a bore
So full of the superficial

Some people want it all
But I don't want nothing at all
If it ain't you baby
If I ain't got you baby
Some people want diamond rings
Some just want everything
But everything means nothing
If I ain't got you, Yeah

Some people search for a fountain
(That) promises forever young
Some people need three dozen roses
And that's the only way to prove you love them
Hand me the world on a silver platter
And what good would it be
With no one to share
With no one who truly cares 
For me

Some people want it all
But I don't want nothing at all
If it ain't you baby
If I ain't got you baby
Some people want diamond rings
Some just want everything
But everything means nothing
If I ain't got you, you, you
Some people want it all
But I don't want nothing at all
If it ain't you baby
If I ain't got you baby
Some people want diamond rings
Some just want everything
But everything means nothing
If I ain't got you, you, youuuuuuu

If I ain't got you with me baby
So nothing in this whole wide world don't mean a thing
If I ain't got you with me baby

    Entre os dramas da História e os da vida não há fronteiras, quando os daquela se fazem dos que esta também tem.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Tudo é possível... sabendo!

     A questão não é estranha, mas tem algo a ver com o que não se sabe (mas que se pode vir a saber).

     Q: Como é possível dizer-se que há termos correferentes não anafóricos? Se fazem parte da cadeia de referência não devem ser simplesmente anafóricos face aos antecedentes?

     R: Pode ser que o mais típico na construção de enunciados coesos se associe a cadeias de referência construídas na base de termos anafóricos, o que significa que as relações de dependência entre antecedentes e termos subsequentes são diretamente comprováveis no discurso / no texto (investimento na própria recuperação do já mencionado) ou, então, verificáveis em conhecimentos de mundo partilhados, estabilizados, de relação biunívoca evidente, não discutíveis. O seu imediatismo associativo contribui para que se construam redes referenciais facilitadoras de mecanismos de memorização da informação e sua linearização progressiva na abordagem temática.
      Todavia, nem sempre acontece isto. Há antecedentes e anafóricos que só são compreensíveis na base de um conhecimento de mundo que, eventualmente, só alguns detêm e que, portanto, carecem de uma fundamentação, pesquisa, inferência face ao não dito (apoiada em implicaturas).
      Admitindo um enunciado do tipo de (i), poderá entender-se a necessária relação de Pedro / carro (a bem da possibilidade de coerência do enunciado:

      (i) Não sei onde está o Pedro, mas o carro está na garagem.

      Elipticamente, está a referir-se o carro do Pedro. O facto de o carro estar na garagem significará que o Pedro não está longe de casa, mas não é encontrado pelo sujeito falante. Neste sentido, a implicatura subjacente a este raciocínio permite inferir a relação correferencial dos termos 'o Pedro' e 'o carro'; só que, na verdade, esta relação é não anafórica, uma vez que a dependência dessas palavras se faz porque há o conhecimento, no mínimo, de que o Pedro tem carro e que o Pedro só sai de casa de carro.
     A coesão construída em termos lexicais, nomeadamente com as perífrases e as associações, é reveladora deste tipo de correferência, muito mais interessada em investir no conhecimento acrescentado / a explicitar do que principalmente na memória do já mencionado. Por exemplo, quando, para evitar repetições desnecessárias na escrita, se ensina um aluno que pode substituir Camões por 'o poeta português', na verdade está a estabelecer-se correferência não anafórica entre os termos, pois há muitos mais poetas portugueses além de Camões (o mesmo já não acontecerá tanto com a perífrase 'o épico quinhentista português', por consensualmente aquele ser o mais conhecido, se não for o único que cabe neste conhecimento). 
    Repare-se, entretanto, em (ii)

    (ii) O Pedro não estava em casa, mas o amigo do João não se esqueceu do encontro que havia marcado.

    Dizer que 'o Pedro' é 'o amigo do João' não é necessariamente verdadeiro para todas as situações (só para a enunciada), pelo que só um conhecimento extralinguístico admitirá a existência de correferencialidade (não anafórica) entre ambas as expressões. 

   Quando se passa a saber (o que não se sabia), até (passa a) faz(er) sentido aquilo que parecia aparentemente contraditório.

sábado, 8 de setembro de 2012

Serviço público em canal privado

    Mais uma sexta à noite com tourada na RTP1.

    Continua o serviço público (?!) só para alguns, em número mais do que reduzido. Entre a festa de uns, o esforço de outros, mais a dor e o sangue de um animal, comprazem-se os espectadores no círculo à volta da arena, mais todos os que promovem o "grande" espetáculo.
   Talvez não seja menos atroz o que se vê noutros canais televisivos, mas no caso da série 'Pilares da Terra' (2010), no AXN, para lá da natureza ficcional, fica sempre a representação de uma época (nos seus hábitos, na mentalidade, nas cores, nos cenários e ambientes, nos perfis, nos ideais...) feita de conflitos de poder, de guerras, influências religiosas.
    A série é baseada no romance homó-nimo de Ken Follett, publicado em 1989 e dominado por um registo épico-histórico. A ação localiza-se no contexto histórico da Inglaterra do século XII (período normando), logo após o reinado de Henry I. À morte deste por envenenamento (1135), e depois de o filho varão ter sofrido um naufrágio, resta a filha Matilde (Maud) para suceder ao trono. Todavia, uma forte componente da nobreza prefere Stephen (filho do duque da Normandia, Robert, e descendente direto no direito sucessório pela linha dinástica com origem em William I, o Normando).
    Num clima bélico, de desordem e empobrecimento progressivos, assiste-se aos recuos e avanços no sucesso de ambos os pretendentes; aos ganhos e perdas dos que, na corte, os apoiavam e/ou procuravam deles obter bons ofícios; aos sonhos e pesadelos vividos pelos que, distantes deste jogo de interesses políticos, sobreviviam a um ambiente de fanatismo religioso, de adversidade a vários níveis e de forte insegurança. Entre eles, há um homem que sonha construir uma catedral, diferente do que eram os conventos e edifícios-fortaleza. Era o sonho da exaltação da luz, da elevação esguia de colunas, do colorido dos vitrais, do recurso aos arcos quebrados. Um sonho que ultrapassa o homem e o tempo, como a série o prova pelo enredo.


    A produção, para televisão, é assinada, em qualidade, pelos irmãos Ridley e Tony Scott, contando com a participação de um elenco de atores e atrizes numeroso, dos mais conceituados a outros menos conhecidos do público: desde Ian McSahne (o ambicioso bispo Deadwood), Donald Surtherland (primeiro conde de Shiring) e Rufus Sewell (Tom Builder) a Hayley Atwell (a jovem Aliena) e Eddie Redmayne (o misterioso Jack Jackson, o virtuoso seguidor de Tom Builder).

    Era bom, quando se lembrassem de discutir o que é serviço público, ter em conta exemplos de séries como esta, para que haja menos "touradas" e mais hipóteses de se ganhar luz e conhecimento.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Falta de visão

   Quando se ouve o anúncio "Visão... tenha uma", chego, por vezes, a preferir a falta dela.

  Sou leitor assíduo da revista Visão e tenho a leitura desta como um tempo bem passado, nos momentos em que me procuro informar do que se passa à nossa volta.
   Lamentavelmente, a última edição é exceção a esta disposição geral.
   Já, por si, a capa é muito estranha: com informação tão errada quanto a escolha das pessoas a que dá voz e/ou cuja mensagem reproduz (espero que bem, ainda que com conteúdo mau).

Recortes de uma edição da revista Visão, sem qualquer visão do que seja o ensino da língua

   Na verdade, o complemento direto não é substituído por nenhum outro complemento. E quanto ao oblíquo, ele tem uma natureza sintática muito particular: não é direto, não é indireto e ocorre em situações em que o verbo principal seleciona grupo adverbial (ex.: Eles moram MUITO LONGE) ou grupo preposicional (ex.: Ele colocou o livro NA PRATELEIRA) que admita anaforização com um advérbio (ex.: Ele colocou o livro ALI) ou com a sequência 'preposição + isso' (ex.: Todos adequam o trabalho às condições que têm > adequam o trabalho A + ISSO).
     Além disto, o conteúdo da capa não revela o da entrevista que apresenta nas páginas 72 a75, também de conteúdo com muito que se lhe diga, à responsabilidade ora de quem o transmite o conteúdo ora mesmo de quem costuma dar voz àqueles que muitas vezes não sabem o que dizem - o mínimo para quem afirma, e por várias vezes o fez e sem sentido nenhum, "só o 10º ano não tem literatura" (Edviges Ferreira); "Em lado algum do programa de Português se fala de morte - foram retirados os poemas de Pessoa que a abordam" (Maria do Carmo Vieira) ou "No passado havia complementos circunstanciais de tempo, modo, lugar, etc., conforme se precisava. Mas agora desapareceram e só há o desgraçado de um 'complemento oblíquo'" (Teolinda Gersão).
     Ao contrário da conclusão da jornalista Teresa Campos, são exemplos em nada elucidativos de coisa nenhuma: há literatura no programa de 10º ano (quanto mais não fosse pela abordagem da lírica camoniana); a morte figura como tema em vários textos, de Camões a Pessoa, não tendo eu conhecimento de condicionamento na seleção de poemas ou de temas por via dos programas (para não dizer que Mensagem é obra para encontrar vários poemas, nos quais a 'morte' é ingrediente para uma consciência de simbologia e renovação cíclica, de dimensão cultural; "O menino de sua mãe" e "Ela canta, pobre ceifeira" figuram em muitos materiais escolares como textos paradigmáticos da ortonímia, com veios de morte bem distintos das outras 'mortes' ou perdas que subsistem nas dicotomias do sentir e do pensar); o complemento oblíquo não é tudo e não pode ser entendido como transposição direta nem linear dos complementos circunstanciais (ou não fossem alguns destes exemplos de modificadores internos ao grupo verbal).

     Em suma, páginas que li e que não me trouxeram o bem-estar pretendido no anúncio do fim de semana. Caso para dizer que houve muita falta de visão, para uma revista que se diz de crédito.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Morfologia e não só!

   Trabalho cíclico... passado mais de um ano.

   Q: Li sua resposta [acerca da formação do verbo 'encorajar', a partir de 'coragem'] e ficou uma dúvida: como explica a ausência do «m» na evolução coragem > encorajar? Será caso de queda a considerar na formação da palavra? Muito agradecida.

   R: Tive de retomar o apontamento, reler o que escrevi - no fundo, situar-me.
    Começo por sublinhar que a dúvida apresentada assenta na aceitação da formação do verbo 'encorajar' numa das hipóteses entre duas colocadas.

      Nessa linha, responder a esta dúvida, formulada em apontamento anteriorimplica desde já considerar que se deve processar o distanciamento relativamente à componente gráfica, bem como a questões de evolução da língua ao nível fonético.
  Assim, a realização [ku'raӠᾶj] é graficamente representada com um 'm' enquanto indicador do traço de nasalidade da última sílaba. Ora, é esse traço de nasalidade que se perde (não o som [m]) na derivação do nome para a forma verbal 'encorajar'. A sílaba nasal da base derivante dá lugar a uma sílaba não nasal na palavra derivada, além de se processar uma elevação na natureza articulatória do som vocálico e a mudança de acento tónico.
    Registo, ainda, a recorrência deste mecanismo, como se pode comprovar nas derivações 'ferrugem > enferrujar', 'vantagem > avantajar' (por parassíntese) ou 'linguagem > linguajar', 'massagem > massajar', 'portagem > portajar', 'viagem > viajar' (por sufixação). 
    Não há, portanto, o que, em termos de evolução linguística e numa perspetiva diacrónica, se apelida de fenómeno de queda.
 
   Mais um contributo para mostrar como as aparências (gráficas) não devem iludir.