Tema mais do que atual face aos tempos pandémicos que se vivem.
Camões, no final do canto I, reflete sobre esse tema, mencionando o "... Caminho de vida nunca certo: / Que aonde a gente põe sua esperança, / Tenha a vida tão pouca segurança". Enquanto "fraco humano" ou "bicho da terra tão pequeno", há forças que nos superam (no mar, na terra, no Céu). Não há domínio que nos deixe de testar, a ponto de a pergunta surgir: "Onde pode acolher-se um fraco humano, / Onde terá segura a curta vida...?" Mais do que interrogação (retórica), será a constatação da pequenez e da insignificância humanas face ao poder das forças que gravitam em seu torno, fazendo-as cair de um pedestal antinatural e a todo o momento questionável. E, assim, da temática quinhentista rapidamente se dá o passo para a contemporaneidade.
"Shattering", de Leon Keer
Leon Keer, artista holandês reconhe-cido pela sua 3D Street Art - essa capacidade de trans-formar uma superfí-cie plana numa obra-prima multiní-vel -, criou um mural para o festival de arte de rua em Helsingborg, na Suécia. Retratando quatro chávenas de chá empilhadas de modo instável, aca-bou por descrever a obra conseguida com as seguintes palavras: "A vida é tão frágil quanto uma xícara de chá"; "Quero mostrar que a nossa vida pode mudar repentina-mente. Podemos perder um ente querido. Ou a nossa casa. Ou outros grandes artistas mundiais, expoentes da cultura. Por isso, nas xícaras de chá, pintei todos os cenários apocalípticos."
Desta forma, as chávenas que figuram no mural (as Rörstrand, uma conhecida marca de cerâmica centenária muito popular na Suécia) passam a representar uma realidade aumentada, cada uma delas a propor, metaforicamente, um episódio ilustrativo dos efeitos decorrentes, por exemplo, das mudanças climáticas; das falhas e das perdas que fazem com que a terra e o ser humano estejam prestes a "cair".
Um caso evidente de arte pedagógica, consciencializadora, preventiva e intemporal na mensagem a transmitir. Na aproximação com Camões, Leon Keer é mais um exemplo contemporâneo de pintura a rimar com literatura.
Belo post, Vítor. Não conhecia o autor do mural que tão bem representa o equilíbrio frágil do nosso dia a dia.
ResponderEliminarUm abraço, Vítor, e bom fim de semana.
Obrigado, Dolores.
EliminarContinuemos na conquista do equilíbrio, por mais que pareça difícil. É a esperança que se vai (re)construindo.
Beijinho e bom fim de semana.
(E vem aí um feriado... para equilibrar qualquer coisinha!)