quinta-feira, 17 de março de 2011

Memória(s) de ouvido

       Dos tempos da adolescência, ficou uma grande voz...

      Elis Regina (ou a mais familiar "Pimentinha"), cujo nascimento a 17 de Março de 1945 hoje lembro, era a voz de "Fascinação", "Eu sei que vou te amar", "Águas de Março", "Alô, Alô, Marciano", "Madalena" - melodias que passavam na rádio e na televisão; que rodavam no gira-discos lá de casa, ainda em vinis de 45 rotações.
      De tanto uso, um ou outro ficou inutilizado; mas ficou gravado na memória auditiva: "Os sonhos mais lindos sonhei. / De quimeras mil um castelo ergui...", "Eu sei que vou te amar / Por toda a minha vida eu vou-te amar / Em cada despedida eu vou-te amar / Desesperadamente eu sei que vou-te amar...", "Alô, Alô, Marciano / Aqui quem fala é da terra / P'ra variar estamos em guerra...", "Ó Madalena, o meu peito percebeu / que o mar é uma gota / comparado ao pranto meu...".



É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho
é um caco de vidro, é a vida, é o sol
é a noite, é a morte, é um laço, é o anzol
é peroba do campo, o nó da madeira
caingá, candeia, é o Matita Pereira


É madeira de vento, tombo da ribanceira
é o mistério profundo
é o queira ou não queira
é o vento ventando, é o fim da ladeira
é a viga, é o vão, festa da cumeeira
é a chuva chovendo, é conversa ribeira
das águas de março, é o fim da canseira
é o pé, é o chão, é a marcha estradeira
passarinho na mão, pedra de atiradeira

Uma ave no céu, uma ave no chão
é um regato, é uma fonte
é um pedaço de pão
é o fundo do poço, é o fim do caminho
no rosto o desgosto, é um pouco sozinho

É um estrepe, é um prego
é uma ponta, é um ponto
é um pingo pingando
é uma conta, é um conto
é um peixe, é um gesto
é uma prata brilhando
é a luz da manhã, é o tijolo chegando
é a lenha, é o dia, é o fim da picada
é a garrafa de cana, o estilhaço na estrada
é o projeto da casa, é o corpo na cama
é o carro enguiçado, é a lama, é a lama
é um passo, é uma ponte
é um sapo, é uma rã
é um resto de mato, na luz da manhã
são as águas de março fechando o verão
é a promessa de vida no teu coração

É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho
é uma cobra, é um pau, é João, é José
é um espinho na mão, é um corte no pé
são as águas de março fechando o verão
é a promessa de vida no teu coração

É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho
é um passo, é uma ponte
é um sapo, é uma rã
é um belo horizonte, é uma febre terçã
são as águas de março fechando o verão
é a promessa de vida no teu coração

É pau, é pedra, é o fim do caminho
é um resto de toco, é um pouco sozinho

Pau, pedra, fim do caminho
resto de toco, pouco sozinho

Pedra, caminho
Pouco sozinho

Pedra, caminho
É o toco


      Registos de um tempo revivido num tristonho Março, que bem podia ser Janeiro - o mês da morte da cantora (17 de Janeiro de 1982) -, entre o frio e o molhado, com "águas são de Março", mas "não fecham o verão". Grande música, grande voz, grande canção.

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