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sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

Mais um dia... para os tricaidecafóbicos ou de outras fobias afins.

          Nova sexta-feira 13, ora pois então.


   Reza a tradição que é dia de azar, conforme já se explicou em apontamentos anteriores. Vários factos, mais ou menos supersticiosos, mais ou menos históricos assim o entendem.
      No Tarot, a carta do arcano maior número treze, é verdade, representa a Morte. Contudo, entendida esta última como fim de um ciclo não significa, definitivamente, o fim de tudo. Simboliza não a perda da vida, mas uma transformação de relevo, uma fase de desprendimento a dar lugar ao renascimento. Como uma forma de libertação (de desapego ao que possa representar a crise, o negativo), é uma "morte" ansiada.
     A imagem de um esqueleto a manejar a foice sobre um campo de pessoas, por mais assustadora que pareça, traz consigo a leitura da passagem, do transitório para uma nova etapa. Em hora de mudança, é tempo de superação.
     Associar isto tudo a uma sexta-feira é razão para, pelo menos, suspirar pela mudança: a do fim de semana que se anuncia. Nem pela parascavedecatriafobia nem pela frigatriscaidecafobia.

    Não sou, de facto, tricaidecafóbico. Sou pela leitura da mudança. Venha ela! Afinal, prefiro uma sexta-feira 13 a qualquer segunda-feira de outro número que seja.

terça-feira, 1 de janeiro de 2019

A começar o ano

      Abre-se 2019 com poesia.

      Em Português, do Brasil, há uma receita de ano novo a cumprir. Boa forma de começar o ano.

Declamação do poema "Receita de Ano-Novo" (Carlos Drummond de Andrade)

RECEITA DE ANO-NOVO

Para você ganhar belíssimo Ano Novo 
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz, 
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido 
(mal vivido talvez ou sem sentido) 
para você ganhar um ano 
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras, 
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser; 
novo 
até no coração das coisas menos percebidas 
(a começar pelo seu interior) 
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota, 
mas com ele se come, se passeia, 
se ama, se compreende, se trabalha, 
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita, 
não precisa expedir nem receber mensagens 
(planta recebe mensagens? 
passa telegramas?)

Não precisa 
fazer lista de boas intenções 
para arquivá-las na gaveta. 
Não precisa chorar arrependido 
pelas besteiras consumadas 
nem parvamente acreditar 
que por decreto de esperança 
a partir de janeiro as coisas mudem 
e seja tudo claridade, recompensa, 
justiça entre os homens e as nações, 
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal, 
direitos respeitados, começando 
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo 
que mereça este nome, 
você, meu caro, tem de merecê-lo, 
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil, 
mas tente, experimente, consciente. 
É dentro de você que o Ano Novo 
cochila e espera desde sempre.

                                                     Carlos Drummond de Andrade, op. cit, pág. 85

    Algarismos somados (2+0+1+9), chega-se ao número de meses do novo ano; somado o 1+2, chega-se ao 3.

   Parece ser ano divino, pela perfeição e totalidade simbólicas do número. Assim o façamos e o mereçamos (e, já agora, que deixe de cochilar dentro de nós e se erga para a vida).

quarta-feira, 30 de abril de 2014

'Os Lusíadas' e o número da besta

     Estudos sobre numerologia e simbologia numérica associados à literatura são inúmeros e Os Lusíadas são mais um exemplo de obra a isso destinado.

     Tudo começa porque, ontem, um aluno me perguntou qual era o verso da epopeia camoniana que estava relacionado com o número da besta, o 666. Uns riam-se; outros estavam expectantes e todos esperavam ouvir a explicação de uma curiosidade que a professora de Português lhes tinha incutido, mas que, parece, o professor de Literatura estava mais destinado a responder. Não sei se é bem o caso, mas assim passou a ser.
     Hoje foi a aula para se chegar à resposta e contei com a colaboração de alguns estudantes que tentaram chegar à solução, na procura que fizeram (disseram-me) pela internet. Dois cenários surgiram: um relacionado com o Canto VII; outro com o IX. Afinal, não era o verso, porque há mais do que um. E, no final da aula, foram muitas mais as referências, todas elas contribuindo para uma leitura reveladora de alfabetos muito diversificados para o conhecimento, com os números a constituirem-se como um processo de o Homem aceder e compreender a coerência do mundo, pela construção de um sentido a atribuir ao universo.
     Começados com a obra literária por excelência (a Bíblia) - na súmula de tradições, de culturas, de saberes e acontecimentos que marcam a humanidade -, orientou-se para a leitura do último livro, o 'Apocalipse' (termo grego para 'Revelação'). No fim dos tempos (críticos), anuncia-se uma mudança, um novo tempo. No capítulo 13, versículo 18, lê-se: 

“Aquele que tem sabedoria calcule o número da besta, pois é o número de um homem e seu número é seiscentos e sessenta e seis”

     A leitura de um (sentido ou tipo de) "Homem" coincide com a cosmovisão antropocêntrica que o Renascimento traz para o Mundo - refletida em Os Lusíadas, num ideário que subjaz à própria arquitetura e construção da epopeia. E na tríplice configuração do "6" não será estranha toda uma simbologia que as próprias línguas de cultura sublinharam.
      No hebraico, as letras apresentavam valores numéricos; o mesmo sucedia na antiga Grécia (séc. IV a. C.), comparecendo a letra clássica do dígamo para representar o '6' (cf. tabela à direita), numa configuração gráfica próxima do atual "S" do alfabeto. Por outro lado, é sabido que, até ao século XVII, a Europa conviveu com cálculos matemáticos baseados na numeração romana (os algarismos árabes aparecem em textos portugueses pelo século XV e só se vulgarizam um século mais tarde).
     Nesta medida, a associação da grafia latina aos números sugerirá uma relação que - à exceção dos zeros para letras que não representam algarismos romanos - conduzirá a escrita da palavra 'sol' para o número seis; o mesmo sucede com a redação do nome 'Jesus'. Caso para dizer que, ora numa orientação mais pagã ora noutra mais cristã, a "revelação" simbólica e numerológica acontece. 
     O aparecimento das cartas do Tarot pelos séculos XIV-XV trouxe também consigo a leitura de sinais, no que aos vinte e um arcanos maiores diz respeito. O número seis corresponde à carta dos Enamorados, dos Amantes e traduz o caminho da escolha (segundo o livre arbítrio), da encruzilhada e da hesitação, com risco de erro e dispersão. Ao contrário do três (carta da convergência e da unidade), o seis (3 x 2) convoca a divergência de forças (dois sentidos) - é o reflexo dessa dualidade composta de corpo Vs espírito. Desta dupla dimensão (revista no contraste 'feritas / divinitas', materialidade / espiritualidade) se compõe o conteúdo de Os Lusíadas, publicados em 1572 (ano que, na operação matemática familiar dos 'noves fora', resulta em seis). Os 8816 versos da obra, nas 1102 estâncias, foram já largamente estudados por Jorge de Sena numa perspetiva numerológica. Não o fez com o foco no número da besta, mas a possibilidade existe, atendendo aos seguintes dados:

i) a leitura do título da epopeia, segundo uma configuração alatinada e numa aproximação ao grego antigo (particularmente ao dígamo), revela a presença de três números seis, para não falar na presença do cinco e do um (que também somados resultam no número seis);

ii) o sexto verso de cada uma das três estrofes da Proposição (Canto I) - 6 6 6 - reflete um conjunto de características relacionado com a excecionalidade do humano herói lusíada, associada à força, à intemporalidade e à divinização (“Mais do que prometia a força humana”; “Se vão da lei da Morte libertando”; “A quem Neptuno e Marte obedeceram”);

iii) as oitavas somadas até ao verso 666 conduzem até ao segundo verso da estância 84 de cada canto e, no caso do canto I ("Já o raio apolíneo visitava / Os Montes Nabateios acendido, / Quando o Gama cos seus determinava / De vir por água a terra apercebido"), remete para o espaço terrestre  dos Montes Nabateios (onde o Gama está prestes a ser traiçoeiramente atacado, por influência de Baco), espaço elevado e posicionado entre a referência a um deus (Apolo) e um homem (Gama), como que prenunciando a divinização deste, assim que superar a prova que lhe está destinada;

iv) o canto VI é o do segundo consílio (convocado por Baco) - que colocará os portugueses novamente à prova, pela congeminação divina que criará uma tempestade marítima - e tem no verso 666 (estrofe 84) a marca da força a enfrentar ("Assi dizendo, os ventos, que lutavam / Como touros indómitos, bramando, / Mais e mais a tormenta acrecentavam");

v) a estância 666 é precisamente a do início do canto VII, aquela que dá conta da concretização do caminho da escolha, do objetivo da viagem - a chegada dos marinheiros à Índia (“Já se viam chegados junto à terra / Que desejada já de tantos fora, / Que entre as correntes Índicas se encerra / E o Ganges, que no Céu terreno mora. / Ora sus, gente forte, que na guerra / Quereis levar a palma vencedora: / Já sois chegados, já tendes diante / A terra de riquezas abundante”) - ou o cumprimento do feito planeado;

vi) a chegada à Índia, por mais que seja desejada, constitui uma desilusão (por ser local onde se troca a vida humana do Gama por dinheiro) só (re)compensada no canto IX com a Ilha dos Amores (num plural que conjuga a dimensão corpórea - das relações mantidas entre marinheiros e ninfas - com a espiritual - no prémio e na glória simbolicamente representados) - o segundo verso da estância 84 do canto IX (o 666) é precisamente o que explicita a união dos marinheiros e das ninfas ("Destarte, enfim, conformes já as fermosas / Ninfas cos seus amados navegantes, / Os ornam de capelas deleitosas / De louro e de ouro e flores abundantes."), na realização corpórea e espiritual dos amantes (relembre-se a carta VI do Tarot), na ascensão humana à "divinitas", depois de um percurso em busca do local onde o "bicho da terra tão pequeno" não "indigne o Céu sereno".

     Na linha do exposto, revê-se a escrita das letras numa configuração numérica simbólica, traduzindo uma mentalidade que, desde os tempos medievais, procura compreender o(s) sentido(s) oculto(s) do Universo e tentar determinar o destino humano. Não será por acaso que o verbo 'contar' (números) e 'contar' (histórias) apresentam raiz etimológica comum.
     A numerologia, com cálculos de previsões, interpretações e até  especulações transcendentes ou mágicas surge, impondo-se com a Idade Média e o Renascimento, quando a ordem universal se baseava na razão numérica (filosofia derivada de Santo Isidoro: "A razão dos números não deve ser desprezada. Na realidade em muitas passagens das Sagradas Escrituras, quanto mistério eles revelam" - in Etimologias, III, iv, i). Consagrado como fator de configuração na Criação Divina, o número assumiu-se com lugar de destaque na criação artística, em geral, e na literatura, em particular.

    Na arquitetura de Os Lusíadas não deixa, pois, de perpassar a ideia de que as relações numéricas são relevantes para o significado da obra; para a interligação da natureza com a vida humana e, consequentemente, para a expressão da arte. Nesta última, os números são mais um alfabeto para o conhecimento.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Dos mitos do fim do mundo

       Depois da sequência mágica, vem a lembrança fatídica.

       Duas alunas abeiraram-se de mim, entre o envergonhado, o assustado e o curioso, colocando a questão: se eu acreditava que o mundo ia acabar no dia 21.
     Disse-lhes que sim... e que devíamos agendar uma festa de despedida para o dia anterior. Riram-se.
       O facto é que insistiram, na busca de algum apaziguamento. Queriam perceber a razão por que toda a gente fala nisso. E foi o fim do mundo para mim: perdi o meu intervalo.
     Fi-las lembrar o que elas tinham ouvido aquando da passagem do milénio; fi-las saber que já muito antes tinha sucedido o mesmo com todos os milénios; muito rapidamente dei-lhes a saber algumas vidências e profecias que, no tempo em que foram formuladas, não tiveram o resultado anunciado (felizmente, para alguns casos; infelizmente, para outros).
      O ano 2012 teve já tratamento fílmico, numa abordagem do que a civilização maia previa como ano crítico para um povo, num jogo numerológico em que o dia 21 de dezembro se apresenta como fatal.
     Hoje pode dizer-se que o "fim do mundo" para essa civilização foi muito antecipado.
   Sabe-se também que muitos dos conhecimentos, das crenças, das divindades, dos costumes associados condicionam a visão do mundo e nessa relativização tudo deve ser equacionado - nomeadamente a mudança de ciclos. A alteração de qualquer ritmo no que fosse o aparecimento da luz solar seria visto como um sinal divino e ameaçador, particularmente para uma entidade suprema para a vida desta civilização mesoamericana (Kulkulcán era a versão maia do deus Quetzalcóatl asteca). Um eclipse solar teria, por certo, um significado muito para além daquele que atualmente pode ser cientificamente descrito. E este seria apenas um incidente no meio de tantos outros a contemplar.
     Foi então que perguntei às minhas interlocutoras o que elas achavam se, neste mesmo dia, um satélite deixasse de funcionar e, por exemplo, inviabilizasse o funcionamento de todos os dispositivos eletrónicos no mundo (telemóveis, multibancos, telefones, televisores, rádios, internet, só para falar dos mais familiares). A resposta veio pronta e válida, para qualquer data do que ainda resta de 2012 ou de anos vindouros: "Era o fim do mundo!"

      Lá está: aos nossos olhos, com os nossos costumes, conhecimentos e vivências o fim do mundo também é falado / previsto / previsível, sem uma data concreta, com tanto de catastrófico quanto das dependências que temos a todo e qualquer momento. Conclusão: é o próprio homem a construir o fim do mundo (pelo que deve ter mais medo de si mesmo e das necessidades que cria).

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Doze em dose tripla

     O dia fez-se do "doze", inclusive no mês e no ano.

     Tanta coincidência causa alguma estranheza, curiosidade. Há quem veja nisso sinal de qualquer coisa (não sei se boa, se má).
      É um dado que a vida humana se encontra marcada por este número: o calendário anual apresenta doze meses (o gregoriano, por contraste com o juliano, que só tinha dez meses); o povo babilónico estabeleceu a sua base numérica em torno do doze (não do dez, como o nosso sistema numérico atual); doze signos associam-se a doze casas do zodíaco; doze eram os apóstolos, bem como as tribos de Israel; havia doze portas na cidade de Jerusalém; a Bíblia refere o número dos eleitos como sendo 12 vezes 12.000 (cifra representativa da totalidade dos santos).
     Nos arcanos maiores do Tarot, XII é a carta do Enforcado - símbolo da sujeição e servidão. Suspenso pelo pé, a posição antinatural do homem é entendida como provação, malogro em toda e qualquer busca de aquisição material. A única saída parece ser da ordem do espiritual.
    O 12 é, efetivamente, o fecho de um ciclo: fim e evasão fora da matéria; tudo o que foi adquirido de material deve ser abandonado, numa espécie de renúncia forçada, de sacrifício (ofício sacro) pessoal e de desapego capaz de conduzir ao espírito.
      No abandono do material, do físico, a libertação é possível, mas pela ordem do abandono voluntário, do recuo, do castigo que se impõe como saída para uma dimensão distinta.

    Não bastasse tudo isto, diz-se ainda que 21.12.12 vai ser, segundo a civilização maia, a data do fim do mundo - o primeiro não é um doze, mas o seu inverso. 

terça-feira, 24 de maio de 2011

Com letras e números em abraço

      Assim o escrevi num soneto, dedicado a alguns dos meus alunos, há já quatro anos - talvez inspirado em leituras da altura e desse mistério rendido ao facto de números e letras organizarem a nossa vida.

     Retomo um excerto de O Código Da Vinci, de Dan Brown:

                                 
                                          1.618

     «Voltou-se para o mar de rostos interessados.
     - Quem sabe dizer-me que número é este?
     Um aluno do curso de Matemática, sentado numa das últimas filas, levantou o braço.
     - É o número PHI. - Pronunciava-o como fi.
     - Muito bem, Stettner - disse Langdon. - Senhoras e senhores, apresento-lhes o PHI.
     - Não confundir com PI - acrescentou Stettner, sorrindo. - Como nós, matemáticos, costumamos dizer... (...)
     Enquanto carregava o projector de diapositivos, Langdon explicou que o número PHI derivava da sequência Fibonacci, uma sequência famosa não só por a soma de dois termos adjacentes ser igual ao termo seguinte, mas também por os quocientes de dois termos adjacentes terem a surpreendente propriedade de se aproximarem de 1.618: PHI!
    A despeito da aparente origem místico-matemática, explicou Langdon, a faceta verdadeiramente extraordinária do número PHI era o seu papel como elemento constitutivo fundamental da natureza. Plantas, animais e até seres humanos, todos possuíam propriedades dimensionais que obedeciam com uma espantosa exactidão à razão de PHI para 1.
    - A ubiquidade do número PHI na natureza - continuou Langdon, apagando as luzes - excede claramente a coincidência, e por isso os Antigos assumiram que tinha sido preordenado pelo Criador do Universo. Os primeiros cientistas chamavam a um-ponto-seis-um-oito a Proporção Divina. (...)
    - Isto é espantoso! - exclamou alguém.
    - Pois é - admitiu uma outra voz -, mas o que é que tem a ver com arte?
   - Ah! - disse Langdon. - Ainda bem que alguém pergunta. Projectou um novo diapositivo, um pergaminho amarelado no qual estava representado o famoso nu de Leonardo da Vinci, O Homem de Vitrúvio, assim chamado em honra de Marcus Vitruvius, o brilhante arquitecto romano que exaltou a Proporção Divina no seu texto De Achitectura
   - Ninguém compreendeu melhor do que da Vinci a estrutura divina do corpo humano. Da Vinci chegava ao ponto de exumar cadáveres para poder estudar as proporções da estrutura óssea do ser humano. Foi o primeiro a mostrar que o nosso corpo é literalmente formado por blocos constitutivos cuja razão proporcional é sempre igual a PHI.
    A turma inteira dirigiu-lhe um olhar carregado de dúvida.
    - Não acreditam? - desafiou-os Langdon. - Da próxima vez que forem para o duche, levem uma fita métrica. (...) Todos vocês. Rapazes e raparigas. Experimentem. Meçam a distância do topo da vossa
cabeça até ao chão. Então dividam esse valor pelo da distância do vosso umbigo até ao chão. Adivinhem lá que número vão obter.
    - Não me diga que é PHI! - exclamou, incrédulo, um dos futebolistas.
   - Digo, sim senhor - respondeu Langdon. - PHI. Um-ponto-seis-um-oito. Querem outro exemplo?Meçam a distância do ombro às pontas dos dedos, e então dividam-na pela distância do cotovelo às pontas dos dedos. Outra vez PHI. Mais uma? Anca ao chão a dividir por joelho ao chão. PHI. Articulações dos dedos das mãos. Dos pés. Divisões espinais. PHI, PHI, PHI. Meus amigos, cada um de vocês é um tributo ambulante à Proporção Divina. (...)
    Durante a meia hora seguinte, mostrou-lhes diapositivos de obras de Miguel Ângelo, Albercht Dürer, Da Vinci e muitos outros, demonstrando a obediência intencional e rigorosa de todos estes artistas à Proporção Divina na disposição das respectivas composições. Mostrou a presença do número PHI no Pártenon de Atenas, nas pirâmides do Egipto e até no edifício das Nações Unidas em Nova Iorque. O número PHI aparecia na estrutura organizacional das sonatas de Mozart, na 5ª Sinfonia de Beethoven, nas obras de Bartók, Debussy e Schubert. O número PHI, disse Langdon aos seus alunos, fora inclusivamente usado por Stradivarius para calcular a localização exacta dos
espelhos nos seus famosos violinos.
    - Para terminar - disse, dirigindo-se ao quadro -, voltamos aos símbolos. - Traçou cinco linhas que se interceptavam para formar uma estrela de cinco pontas. - Este símbolo é uma das imagens mais poderosas que vão ver este semestre. Formalmente conhecido como pentagrama... ou pentáculo, como lhe chamavam os Antigos... é considerado por muitas culturas simultaneamente divino e mágico. Alguém sabe dizer-me porquê?
     Stettner, o matemático, levantou a mão.
     - Porque, se traçar um pentagrama, as linhas dividem-se automaticamente em segmentos de acordo com a Proporção Divina.
    Langdon dirigiu-lhe um orgulhoso aceno de cabeça.
    - Muito bem. É verdade, as razões dos segmentos lineares num pentáculo são todas iguais a PHI, o que faz deste símbolo a expressão perfeita da Proporção Divina.

    Na arte, diz-se também estar o soneto como a forma mais perfeita da literatura.
    Catorze (são os versos) dividido pelo número 1.618 resulta no número 8,652657...
    Os dois primeiros algarismos dessa sequência infinita são precisamente o 8 (a soma das duas quadras) e o 6 (a dos dois tercetos). Entre os dois não figura o 7 (que se diz mágico), ainda que se prefigure no arredondamento da décima.
   Se na sequência numérica por nós normalmente reconhecida  o 8 e o 6 são mediados pelo 7, dir-se-ia que aí se encontra um ritual de passagem, uma fronteira para dois eixos compositivos: do sétimo para o oitavo verso cumpre-se a ponte entre duas metades do soneto. Talvez, por isso, no soneto camoniano "Alma minha gentil que te partiste", esteja muito mais aí a chave de ouro, segundo a linha interpretativa de uma composição poética marcada pela temática central do 'amor' (um amor vivido, "ardente", que o sujeito poético pretende colocar no plano da idealização, de uma eternização que supere os limites terrenos, mundanos).

   
     E. M. de Melo e Castro "Soneto Soma 14x" (1963)


    Ernesto M. de Melo e Castro prefere a leitura do soneto enquanto soma (horizontal dos algarismos) catorze vezes, pela expressão da poesia concreta e visual - um discurso que se materializou e cristalizou num outro código (gráfico-numerológico).
       Duas quadras e dois tercetos - a totalidade de versos no soneto - evidenciam-se graficamente numa organização estrófica com a mesma ordem de leitura do verso da esquerda para a direita, ou vice-versa.
     A leitura vertical da sequência numérica é menos significativa face ao título da composição, mas não deixará de constituir um jogo revelador de somas combináveis com a própria noção de soneto: a coluna da esquerda totaliza 49 (noves fora quatro - uma quadra); a seguinte e a do meio somam, cada uma, 35 (noves fora 8 - duas quadras; sem esquecer que 35+35 = 70, noves fora 7 - uma quadra e um terceto); a penúltima, 28 (noves fora um - a unidade do soneto, para não referir a soma de 2+8, a totalizar 10 - o habitual verso decassilábico); a última coluna, à direita dá 63 (o 6 que representa os dois tercetos; 3, a composição versificatória do terceto).
       Números e letras; Matemática e Literatura (Poesia). 
       Para quê separar códigos que a Proporção Divina juntou?

    ... tem o Homem que saber interpretar a sua própria criação e as suas convenções. Tudo dele depende, sabendo que, nos contrários, também há lugar para os afectos: "letras e números dando um abraço".

terça-feira, 14 de abril de 2009

Da(s) magia(s) do SETE... Ou não fosse hoje CATORZE

     É um dado cultural: na literatura, na música, ... na arte, na vida.

    Sempre que se pergunta por que razão o sete é um número mágico, são múltiplas as respostas. Começo por concentrá-las num texto que ficará em construção.

Das (im)perfeições do SETE

Ao fim de sete dias de trabalho (até ao sábado e ao domingo!),
lembrei como Deus deve ter trabalhado muito nos dias da criação do mundo.

Daí ter dedicado o sétimo ao descanso!

(Como seria se, em vez de dias, gastasse os sete anos com que Salomão ergueu o seu templo?!
Cumpriria também um para descanso, qual ano sabático?!)

Cansado, quase homem dos sete ofícios,

busquei a harmonia das sete notas musicais,
a variedade das sete cores do arco-íris.
Dos sete astros sagrados 

(Sol, Lua, Mercúrio, Vénus, Marte, Júpiter, Saturno),
voltei a cara para o Sol, para a luz desse Apolo feito deus
também de uma das Sete Artes: a Música 

(para lá da Pintura, Escultura, Arquitectura, Literatura, Coreografia e Cinema).
Senti-me homem,
dividido entre os sete pecados capitais 

(vaidade, avareza, ira, preguiça, luxúria, inveja, gula)
e as sete virtudes cardinais 

(castidade, generosidade, temperança, diligência, paciência, caridade, humildade).
Dos sete sacramentos 
(Baptismo, Confirmação, Eucaristia, Sacerdócio, Penitência, Extrema-unção, Matrimónio), 
alguns já se cumpriram; outros poderão ou estarão para vir 
até aos sete palmos de terra, na sepultura.

Recordei as cantilenas femininas da infância: 

“sete e sete são catorze, com mais sete vinte e um; tenho sete namorados e não gosto de nenhum”.
Só faltava que elas viessem das nazarenas, mais as suas sete saias!

Cansado do sofrimento, fechei-o a sete chaves.


Troquei as sete rogatórias do “Pai Nosso” pelos sete anões da Branca de Neve;
apaguei da memória as sete quedas sofridas a caminho do Gólgota.

Fiquei-me pelo Carnaval, sete domingos antes do da Páscoa.
Na brincadeira e no espírito da diversão, aspirei ao sétimo céu.

Tantas foram as histórias ouvidas dos Sete Livros do Antigo Testamento 
(Job, Salmos, Provérbios, Eclesiastes, Cânticos, da Sabedoria, do Eclesiástico).
Resta a lembrança, no Génesis, de Noé e do Dilúvio: 
de como sete casais de cada espécie animal terrestre e aérea foram salvos na Arca; 
ou de como no sétimo mês esta última descansou no monte Ararat; 
ou de como, após o dilúvio, foi lançado um corvo,
seguido, sete dias depois, de uma pomba. 
Mais sete dias passados, esta regressou com um ramo de oliveira. 
Outros sete dias vieram, para, de novo, ser lançada ao ar e não mais voltar.

Mudaram-se os tempos: mudaram-se as maravilhas antigas para as modernas... ficou o sete.
Talvez por isso hoje tenha de se ver tudo com sete olhos, 
para que nada falhe...
ou para que alguma coisa dê certo.

Homem sem as sete vidas dos gatos, aproveito a que tenho,
sem pintar o sete - entre diabruras ou desatinos.
Sigo o curso do rio, sem as botas de sete léguas, até chegar ao mar.
Aí, qual marinheiro, navegarei pelos sete mares

Tão mais perfeito seria o mundo com os sete princípios da moral pitagórica: 
rectidão de propósitos, 
tolerância na opinião, 
inteligência para discernir, 
clemência para julgar, 
verdade nas palavras e nos actos, 
simpatia e equilíbrio!

GondomarVO

     Outras respostas haveria para mais numerados versos. Também sete são as Leis Universais (Natureza, Harmonia, Correspondência, Evolução, Polaridade, Manifestação e Amor); os dons do Espírito Santo (Sabedoria, Entendimento, Conselho, Força, Ciência, Piedade e Temor a Deus); as glândulas endócrinas (Hipófise, Tiróide, Paratireóides, Supra-renais, Sexuais, Timo e Pâncreas); os grandes mensageiros (Krisna, Buda, Lao-Tsé, Confúcio, Zoroastro ou Zaratustra, Moisés e Jesus); as personalidades de Deus (segundo Zoroastro, são estas a Luz Eterna, a Omnisciência, a Retidão, o Poder, a Piedade, a Benevolência e a Vida Eterna); os meios que o Homem tem para purificar, segundo o Budismo (Domínio de si mesmo, Investigação da verdade, Energia, Alegria, Serenidade, Concentração e Magnanimidade).
      Revejo algumas outras numa canção bem portuguesa, registada na memória da minha adolescência: a música e a voz dos Trovante na "Balada das Sete Saias":

Trovante ao vivo, na interpretação de 'Balada das Sete Saias'

BALADA DAS SETE SAIAS

Sete ondas se noivaram 
Ao luar das sete praias 
Sete punhais se afiaram 
Menina das sete saias 

Sete estrelas se apagaram 
Sete, que pena, chorai-as
Sete segredos contaram 
Menina das sete saias 

Sete bocas se calaram 
Com sete beijos beijai-as 
Sete mortes evitaram 
Menina das sete saias 

Sete bruxas se encontraram 
No monte das sete olaias 
Sete vassouras montaram 
Menina das sete saias 

Sete faunos contrataram 
Sete cornos e zagaias 
Aos sete encomendaram 
Menina das sete saias 

Sete princesas toparam 
Com mais sete lindas aias 
Por sete e sete deixaram 
Menina das sete saias 

Sete danças que bailaram 
Sete vezes que desmaias 
Sete luas te ansiaram 
Menina das sete saias 

Sete vezes se encantaram 
No bosque das sete faias 
Sete sonhos desfolharam 
Menina das sete saias

       Assim se (re)lê e vê o sete, entre a tradição e a (re)criação, na letra da canção.

       E mais haverá para, no futuro, se ir acrescentando, para cumprimento da totalidade e perfeição do número.