segunda-feira, 18 de abril de 2011

Tarquínio ou um exemplar de primavera romântica (até ao fim)

     Ainda que o título da obra seja plural, Primaveras Românticas (1872), o seu autor teve um percurso singular para um tempo feito de conformismos, poderes instituídos, conservadorismos de valores.

     Há 169 anos, nascia Antero de Quental em Ponta Delgada, o mentor da Geração de 70 (de onde saíram nomes e actos que marcaram o final do século XIX: Eça de Queirós, Teófilo Braga, Ramalho Ortigão, Oliveira Martins, só para referir os mais sonantes; as Conferências do Casino Lisbonense, "As Farpas", o projecto das Cenas da Vida Portuguesa, só para mencionar os mais marcantes).
     Por trás de tudo, estava Antero - poeta da reflexão estética e do papel social e civilizador da expressão poética, pensador e defensor do espírito científico-filosófico de combate ao sentimentalismo ultra-romântico dominante em Portugal pela década de 60 do século XIX.
     Não obstante o espírito polémico, revolucionário, activo, questionador da tradição artística obsoleta e paralisante, um percurso pessoal crítico e influenciado pela metafísica, bem como pela religião, cruzou-se com o pessimismo filosófico de Schopenhauer e de Hartmann, expressos na composição de, entre outros, Sonetos Completos (1886) - uma das formas poéticas que adopta para a consciencialização do processo de libertação da condição humana.

EVOLUÇÃO

Fui rocha em tempo, e fui no mundo antigo
tronco ou ramo na incógnita floresta...
Onda, espumei, quebrando-me na aresta
Do granito, antiquíssimo inimigo...

Rugi, fera talvez, buscando abrigo
Na caverna que ensombra urze e giesta;
Ou, monstro primitivo, ergui a testa
No limoso paúl, glauco pascigo...

Hoje sou homem, e na sombra enorme
Vejo, a meus pés, a escada multiforme,
Que desce, em espirais, da imensidade...

Interrogo o infinito e às vezes choro...
Mas estendendo as mãos no vácuo, adoro
E aspiro unicamente à liberdade.

Antero de Quental, in Sonetos (1861)
        
      Trinta anos depois, o autor destes versos far-se-ia em nada, interrompendo a evolução (ou antecipando-a, abandonando esta imensidade que é a vida).

     Nessa libertação, nessa fuga romântica persistiu um ideário que, porém, acabou por contradizer algum do sentido e do objectivo com que pautou a vida a que pôs fim: o da crença e o da opção pela mudança e pela ruptura, em prol do desenvolvimento intelectual, político e cultural.

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