sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Falares... com pronúncia do Norte.

     A propósito de um pedido de colaboração, no âmbito dos falares do Português, recupero os sons e os sentidos de uma canção.

     É certo que todas as línguas têm uma melodia própria.
     Há mesmo quem procure caracterizar os falares distintos de cada língua.
    A pronúncia do norte de Portugal tem uma canção só para ela. Assim o interpretou Rui Reininho (vocalista do grupo Grupo Novo Rock - GNR), em colaboração com Isabel Silvestre (cantora portuguesa identificada com os cantares folclóricos de Manhouce - região influenciada pelo Douro e Beira Litoral), no álbum Rock in Rio Douro (1992):


         PRONÚNCIA DO NORTE

Há um prenúncio de morte
Lá do fundo de onde eu venho
Os antigos chamam-lhe ralho
Novos ricos são má sorte

É a pronúncia do Norte
Os tontos chamam-lhe torpe

Hemisfério fraco outro forte
Meio-dia não sejas triste
A bússola não sei se existe
E o plano talvez aborte

Nem guerra, bairro ou corte
É a pronúncia do Norte

Não tenho barqueiro nem hei-de remar
Procuro caminhos novos para andar
Tolheste os ramos onde pousavam
Da geada às pérolas as fontes secaram

Corre um rio para o mar
E há um prenúncio de morte

E as teias que vidram nas janelas
esperam um barco parecido com elas
Não tenho barqueiro nem hei-de remar
Procuro caminhos novos para andar

E é a pronúncia do Norte
Corre um rio para o mar


   Na variação que o Português possui, "Nem guerra, bairro ou corte" é o que se impõe, para reconhecimento de uma diversidade e riqueza linguísticas feitas de um tempo ainda em curso ("Meio-dia não sejas triste") e de um espaço com múltiplas coordenadas ("A bússola não sei se existe").

    Está aí a natureza viva da língua: (sobre)viver na sua progressiva atualização e ativação, à procura de "caminhos novos para andar".

2 comentários:

  1. É engraçado que vi o Grupo Novo Rock há cerca de 15 dias, em Vila Flor, nas festas de São Bartolomeu,

    com o Toli César Machado (depois de ter «recusado», digamos assim, dezenas de bateristas, assumiu agora o lugar), o Jorge Romão e o Rui Reininho na frente, enquanto por trás atuava uma banda de suporte com um guitarrista, um teclista e um baterista.

    Para lá do jogo paronímico evidente no título e no primeiro verso da letra aqui deixada, e de uma variação na procura de caminhos novos para andar (numa morte anunciada, naturalmente: corre um rio para o mar), penso que muitas vezes a verdadeira interpretação da lírica come on & ana cabe mais numa teoria que li de Gastão Cruz, sobre a poesia de Ramos Rosa: «de um sentido que faz uma música de sentido».

    O Rui Reininho esteve no seu melhor, com trocadilhos em linguagem livre, como o professor Arnaldo Saraiva disse ser característico do Porto, embora no fim (acontece a muito boa gente)Rei Rui fosse vencido, num braço de ferro, pelo vinho tratado que foi bebendo da região... Ir_
    reconhecível e quase não reconhecendo depois, ao final, os amigos. O corpo de Cristo tem destas coisas, para quem foi e até já ajudou à missa... do padre Rui Osório.

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    1. Caso para dizer, Vitorino, que, entre o prenúncio e a pronúncia, houve língua com sentido(s) e consentida, até que o "o corpo de Cristo" os fez perder e a fez correr "do rio para o mar".

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