Passada a tormenta, a bonança ainda vem longe.
Ao folhear um jornal de há dois dias, retomei um tópico que tem vindo a ser mais do que discutido nos últimos dias: os resultados dos exames.
Em termos de balanço, lia-se o seguinte num dos artigos noticiosos do dia:
A cor, vem a questão negra da situação; a preto, e como título principal, nomeia-se a disciplina que nem tem tido os piores resultados nos últimos anos, mas notícia é notícia e, portanto, quando se falha, aí vai logo para primeiro plano o que correu mal; logo abaixo, três conclusões da jornalista, as quais ascendem a uma espécie de subtítulo ou parágrafo destacado.
Depara-se, então, com o 'alunos... já não sabiam identificar um complemento directo'.
É verdade que não. Também não o tinham que fazer, porque o que se pretendia era mesmo a identificação de um sujeito sintáctico. E não dos mais imediatos, considerando que o contexto frásico proposto corresponde a uma questão crítica no ensino da gramática.
Quanto a isto, basta relembrar a instrução:
Quanto a isto, basta relembrar a instrução:
GRUPO II
2.2. "Indique a função sintáctica desempenhada pela expressão «a indiferença e a hostilidade» (linha 27)."
A remissão para o texto implicava um segmento "... até que vinham a indiferença e a hostilidade...", no qual existe um fenómeno de inversão entre o sujeito e o predicado (subordinados). Naturalmente, a função de sujeito seria determinada pela pronominalização admissível ( > vinham elas), pois não seria possível a de complemento directo ( >*vinham-nas), ou pela regra da concordância tipicamente desencadeada pelo sujeito ( > vinha a indiferença).
Trata-se de um caso de enunciado subordinado com características de um caso de construção inacusativa, ou seja, de uma oração (subordinada) cujo núcleo verbal ou predicador não requer complementação acusativa.
Trata-se de um caso de enunciado subordinado com características de um caso de construção inacusativa, ou seja, de uma oração (subordinada) cujo núcleo verbal ou predicador não requer complementação acusativa.
Curioso é o facto de alguns colegas me terem dito que abordaram estes casos em aula. Interessante é saber que os próprios alunos reconheceram a falha e que haviam trabalhado este cenário, mais os testes que permitiriam identificar a função solicitada.
O que falha? Muita coisa. Uma delas: a tensão da situação e do imediatismo de resposta (induzida até pela tipologia de resposta curta), que poderia ser contrariada pela solicitação da aplicação de um teste comprovativo; outra, o processamento cognitivo requerido, com um foco de atenção num aspecto crítico algo distinto da percepção automatizada (porque habitual, mais recorrente) para encontrar um complemento directo na posição pós-verbal - o que se pode revelar algo próximo da irreflexão, da inconsciência e do desconhecimento de que a localização pós-verbal de um segmento não se associa exclusivamente ao complemento directo; uma terceira, a aplicação do teste da questão ('O que é que vinha?'), certa e imediatamente relembrada pelos alunos, mas não exclusiva do complemento directo (pois essa mesma interrogação também corresponde à do sujeito sintáctico não humano).
Assim o que parecia não o era; os testes de identificação permitiriam fazer as devidas distinções, caso tivessem sido aplicados e reconhecidos como marcantes para um conhecimento mais explícito (e consciente) da língua. Conclusão: "os alunos já não sabiam", porque o caso também não era dos mais simples; porém, disto basta dizer que eram cinco pontos a menos, não a razão plena do insucesso propagado. O caso é bem mais complexo, como o apontei anteriormente.
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