Há 79 anos nasceu um dos intelectuais e ensaístas contemporâneos mais reconhecidos, em termos internacionais, nos domínios da Estética, Linguística, Literatura, Semiótica e Filosofia: o italiano Umberto Eco.
Não de menor importância é o seu contributo para a literatura mundial, nomeadamente na produção romanesca que já deu títulos como O Nome da Rosa (1980), O Pêndulo de Foucault (1988), Baudolino (2000) ou o mais recente A Misteriosa Chama da Rainha Loana (2005).
Lembro-me de me ter cruzado com o primeiro romance por alturas da exibição do filme, realizado por Jean-Jacques Annaud em 1986. Foi certamente um dos exemplos apreciados, tanto na versão escrita como na cinematográfica. A par da intriga detectivesca não deixava de se recriar toda uma ambiência medieval, pautada não só pela cor epocal das "trevas" mas também pelo sentido de sacralização e de controlo de um saber vastíssimo.
No seio de tudo, um livro: o desaparecido volume sobre a Comédia, de Aristóteles, que comple(men)taria a Poética e a Retórica.
Trailer do filme, na base da exibição cinematográfica no Brasil
A propósito do poder do riso, relembro um excerto de um diálogo entre as personagens Jorge e Guilherme:
- Mas agora explica-me - estava dizendo Guilherme - porquê? Por que quiseste proteger este livro mais que tantos outros? (…) Há tantos outros livros que falam da comédia, tantos outros ainda que contêm o elogio do riso. Por que é que este te incutia tanto pavor?
- Porque era do Filósofo. Cada um dos livros daquele homem destruiu uma parte da sapiência que a cristandade tinha acumulado ao longo dos séculos. (…) Cada palavra do Filósofo, sobre quem hoje em dia juram mesmo os santos e os pontífices, subverteu a imagem do mundo. Mas ele não tinha conseguido subverter a imagem de Deus. Se este livro se tornasse… se tivesse tornado matéria de aberta interpretação, teríamos franqueado o último limite.
- Mas que coisa te assustou neste discurso sobre o riso? Não eliminas o riso eliminando este livro.
- Não, decerto. O riso é a fraqueza, a corrupção, a sensaboria da nossa carne. É o folguedo para o camponês, a licença para o avinhado, mesmo a Igreja na sua sabedoria concedeu o momento da festa, do Carnaval, da feira, desta poluição diurna que descarrega os humores e entrava outros desejos e outras ambições… (…) Mas aqui, aqui - agora Jorge batia com o dedo na mesa, perto do livro que Guilherme tinha à sua frente - aqui inverte-se a função do riso, eleva-se a uma arte, abrem-se-lhe as portas do mundo dos doutos, faz-se dele objecto de filosofia e de pérfida teologia… "
in O Nome da Rosa, trad. de Maria Celeste Pinto, Círculo de Leitores, pp 345-346
Entre o registo do erudito medievalista e o labor do escritor que revisita épocas históricas feitas de enigmas e contrastes (como os retratados nas ordens religiosas monásticas e nos movimentos heréticos), O Nome da Rosa é um romance reconhecido como uma das obras "clássicas", ou melhor, canónicas da literatura mundial.
O filme é para mim um caso único: por vezes prefiro-o ao livro. Li O Nome da Rosa logo que saiu, releio páginas de vez em quando. Li outro, A Misteriosa..., livro que me conduziu a leituras da infância. Outros, tentei mas não fui longe... Anuncia-se agora a tradução do último - em castelhano já está - seria um friso do século XIX. Vamos ver. E teremos, até final do ano, a tradução do primeiro dos quatro volumes de uma História da Idade Média. Vinda de onde vem...
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