São tantas as pontas por onde pegar...
Q: Como classificar morfologicamente a palavra 'triste' em "Ela caminhava triste"?
R: A questão formulada merece, inicialmente, dois reparos:
i) o propósito da questão orienta-se para uma classificação que não é de natureza morfológica (centrada na fronteira da palavra), mas sim relativa ao posicionamento que o termo assume na linearidade sintagmática (mais de natureza sintáctica, portanto, e das classes de palavras que se situam nessa posição);
ii) a classificação morfológica é uma instrução que, de acordo com o Dicionário Terminológico, só faz sentido no caso de se querer indicar os constituintes morfológicos da palavra (radical, tema, base, afixos, ...).
Assim, em termos do discurso didáctico, o que se pretende é a classificação de 'triste' quanto à classe de palavras.
Assim, em termos do discurso didáctico, o que se pretende é a classificação de 'triste' quanto à classe de palavras.
Na base desta última orientação, a palavra 'triste' pertence tipicamente à classe dos adjectivos (uniformes quanto ao género); contudo, no exemplo proposto, aparece um caso em que se pode proceder a uma recategorização do termo, aproximando-o de uma realização adverbial. No fundo, trata-se de utilizar 'triste' para caracterizar o processo 'caminhar' (caminhava tristemente).
No caso particular dos adjectivos, é verdade que estes podem funcionar adverbialmente, e certas construções frásicas apontam para casos de formas já lexicalizadas (é o caso de ‘falar alto/baixo’, ‘vender caro/barato’, ‘escrever torto / direito / rápido’). Se os termos destacados são vulgarmente adjectivos quanto à classe de palavras, no que toca ao posicionamento na frase e à sua funcionalidade, eles revelam a ausência de concordância com o grupo nominal que funciona como sujeito (o que mais os aproxima do comportamento dos advérbios). É clássico o caso do poema palaciano “Cantiga partindo-se”, de Johan Roiz de Castel-Branco, e dos versos “Partem tão tristes / os tristes” (no fundo, trata-se do caso de os tristes [olhos] que partem muito tristemente].
Para mais esclarecimentos sobre este assunto, aconselho a consulta da Gramática da Língua Portuguesa de Mário Vilela (Almedina, pág. 238) ou a com o mesmo título coordenada por Maria Helena Mira Mateus (Caminho, pág. 375-6).
Caso para dizer que a tradição já não é o que era! O mundo é composto de mudança... E até Plutão já deixou de ser planeta (pelo menos, na gíria futebolística, por comparação com os -planetas - da primeira divisão).
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