De regresso aos desafios...
Q: Já que gosta de desafios, lá vai um: na frase 'Os alunos partiram para Lisboa às oito horas' qual é a função sintáctica de 'às oito horas'? Não é da mesma natureza de 'para Lisboa'?
R: Diria que se está perante um caso interessante para distinguir complementos de modificadores. Admitindo que a estrutura argumental do verbo 'partir' (enquanto verbo de movimento) requer um esquema do tipo 'Alguém (X) PARTIR para algum sítio (Y)', X e Y serão tomados como os argumentos necessários à construção sintáctica de um sujeito (x: 'Os alunos') a dar lugar a um predicado que contém um complemento oblíquo (y: 'para Lisboa'), além de um modificador. Neste sentido, 'partir' é realizado como verbo transitivo indirecto. Na frase proposta, 'às oito horas' funciona como um modificador que integra o grupo verbal, pois não se constitui como elemento selecionado pelo núcleo verbal.
Uma forma de diferenciar o estatuto sintáctico destes dois grupos preposicionais ('para Lisboa' e 'às oito horas') é a utilização do teste pergunta / resposta, com a utilização do verbo 'fazer' a substituir um verbo agentivo:
Partiram para Lisboa.
ii) * O que fizeram os alunos para Lisboa?
* Partiram às oito horas.
A aceitabilidade do par pergunta-resposta em (i) assume a anaforização do verbo 'fazer' relativamente a 'partir para Lisboa' enquanto unidade que o núcleo verbal e o seu complemento representam; a agramaticalidade de (ii) evidencia que o verbo anafórico 'fazer' requer a unidade atrás mencionada, pelo que 'para Lisboa' não pode comparecer na questão (por já estar implicada na anaforização, não admitindo separação face ao núcleo verbal); na pergunta só poderão ocorrer os modificadores - como em (i).
Consequentemente, a agramaticalidade da resposta em (ii) advém da impossibilidade de o par pergunta-resposta poder ser realizado nos termos propostos, o que, em última instância, daria sempre lugar à questão 'Partiram para onde?' (a motivar a existência de um complemento).
De novo, sublinha-se a importância da aplicação de testes enquanto instrumentos que possam validar as classificações, as etiquetas que, por si só, de nada valem para a compreensão dos enunciados.
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