Mostrar mensagens com a etiqueta Poesia concreta. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Poesia concreta. Mostrar todas as mensagens

domingo, 25 de novembro de 2012

Ser vil e servil

      Hoje é tempo de poesia concreta, poesia feita dos sentidos que os tempos têm reconfigurado, nas relações entre o escrito e o visualmente construído.

      O exemplo é de Alexandre O'Neill (e de como já ele previa bem os emoticons destes tempos).



      Tal como me sinto: ser vil e servil.

     É o balanço que me dá, depois de um fim de semana a corrigir testes.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Com letras e números em abraço

      Assim o escrevi num soneto, dedicado a alguns dos meus alunos, há já quatro anos - talvez inspirado em leituras da altura e desse mistério rendido ao facto de números e letras organizarem a nossa vida.

     Retomo um excerto de O Código Da Vinci, de Dan Brown:

                                 
                                          1.618

     «Voltou-se para o mar de rostos interessados.
     - Quem sabe dizer-me que número é este?
     Um aluno do curso de Matemática, sentado numa das últimas filas, levantou o braço.
     - É o número PHI. - Pronunciava-o como fi.
     - Muito bem, Stettner - disse Langdon. - Senhoras e senhores, apresento-lhes o PHI.
     - Não confundir com PI - acrescentou Stettner, sorrindo. - Como nós, matemáticos, costumamos dizer... (...)
     Enquanto carregava o projector de diapositivos, Langdon explicou que o número PHI derivava da sequência Fibonacci, uma sequência famosa não só por a soma de dois termos adjacentes ser igual ao termo seguinte, mas também por os quocientes de dois termos adjacentes terem a surpreendente propriedade de se aproximarem de 1.618: PHI!
    A despeito da aparente origem místico-matemática, explicou Langdon, a faceta verdadeiramente extraordinária do número PHI era o seu papel como elemento constitutivo fundamental da natureza. Plantas, animais e até seres humanos, todos possuíam propriedades dimensionais que obedeciam com uma espantosa exactidão à razão de PHI para 1.
    - A ubiquidade do número PHI na natureza - continuou Langdon, apagando as luzes - excede claramente a coincidência, e por isso os Antigos assumiram que tinha sido preordenado pelo Criador do Universo. Os primeiros cientistas chamavam a um-ponto-seis-um-oito a Proporção Divina. (...)
    - Isto é espantoso! - exclamou alguém.
    - Pois é - admitiu uma outra voz -, mas o que é que tem a ver com arte?
   - Ah! - disse Langdon. - Ainda bem que alguém pergunta. Projectou um novo diapositivo, um pergaminho amarelado no qual estava representado o famoso nu de Leonardo da Vinci, O Homem de Vitrúvio, assim chamado em honra de Marcus Vitruvius, o brilhante arquitecto romano que exaltou a Proporção Divina no seu texto De Achitectura
   - Ninguém compreendeu melhor do que da Vinci a estrutura divina do corpo humano. Da Vinci chegava ao ponto de exumar cadáveres para poder estudar as proporções da estrutura óssea do ser humano. Foi o primeiro a mostrar que o nosso corpo é literalmente formado por blocos constitutivos cuja razão proporcional é sempre igual a PHI.
    A turma inteira dirigiu-lhe um olhar carregado de dúvida.
    - Não acreditam? - desafiou-os Langdon. - Da próxima vez que forem para o duche, levem uma fita métrica. (...) Todos vocês. Rapazes e raparigas. Experimentem. Meçam a distância do topo da vossa
cabeça até ao chão. Então dividam esse valor pelo da distância do vosso umbigo até ao chão. Adivinhem lá que número vão obter.
    - Não me diga que é PHI! - exclamou, incrédulo, um dos futebolistas.
   - Digo, sim senhor - respondeu Langdon. - PHI. Um-ponto-seis-um-oito. Querem outro exemplo?Meçam a distância do ombro às pontas dos dedos, e então dividam-na pela distância do cotovelo às pontas dos dedos. Outra vez PHI. Mais uma? Anca ao chão a dividir por joelho ao chão. PHI. Articulações dos dedos das mãos. Dos pés. Divisões espinais. PHI, PHI, PHI. Meus amigos, cada um de vocês é um tributo ambulante à Proporção Divina. (...)
    Durante a meia hora seguinte, mostrou-lhes diapositivos de obras de Miguel Ângelo, Albercht Dürer, Da Vinci e muitos outros, demonstrando a obediência intencional e rigorosa de todos estes artistas à Proporção Divina na disposição das respectivas composições. Mostrou a presença do número PHI no Pártenon de Atenas, nas pirâmides do Egipto e até no edifício das Nações Unidas em Nova Iorque. O número PHI aparecia na estrutura organizacional das sonatas de Mozart, na 5ª Sinfonia de Beethoven, nas obras de Bartók, Debussy e Schubert. O número PHI, disse Langdon aos seus alunos, fora inclusivamente usado por Stradivarius para calcular a localização exacta dos
espelhos nos seus famosos violinos.
    - Para terminar - disse, dirigindo-se ao quadro -, voltamos aos símbolos. - Traçou cinco linhas que se interceptavam para formar uma estrela de cinco pontas. - Este símbolo é uma das imagens mais poderosas que vão ver este semestre. Formalmente conhecido como pentagrama... ou pentáculo, como lhe chamavam os Antigos... é considerado por muitas culturas simultaneamente divino e mágico. Alguém sabe dizer-me porquê?
     Stettner, o matemático, levantou a mão.
     - Porque, se traçar um pentagrama, as linhas dividem-se automaticamente em segmentos de acordo com a Proporção Divina.
    Langdon dirigiu-lhe um orgulhoso aceno de cabeça.
    - Muito bem. É verdade, as razões dos segmentos lineares num pentáculo são todas iguais a PHI, o que faz deste símbolo a expressão perfeita da Proporção Divina.

    Na arte, diz-se também estar o soneto como a forma mais perfeita da literatura.
    Catorze (são os versos) dividido pelo número 1.618 resulta no número 8,652657...
    Os dois primeiros algarismos dessa sequência infinita são precisamente o 8 (a soma das duas quadras) e o 6 (a dos dois tercetos). Entre os dois não figura o 7 (que se diz mágico), ainda que se prefigure no arredondamento da décima.
   Se na sequência numérica por nós normalmente reconhecida  o 8 e o 6 são mediados pelo 7, dir-se-ia que aí se encontra um ritual de passagem, uma fronteira para dois eixos compositivos: do sétimo para o oitavo verso cumpre-se a ponte entre duas metades do soneto. Talvez, por isso, no soneto camoniano "Alma minha gentil que te partiste", esteja muito mais aí a chave de ouro, segundo a linha interpretativa de uma composição poética marcada pela temática central do 'amor' (um amor vivido, "ardente", que o sujeito poético pretende colocar no plano da idealização, de uma eternização que supere os limites terrenos, mundanos).

   
     E. M. de Melo e Castro "Soneto Soma 14x" (1963)


    Ernesto M. de Melo e Castro prefere a leitura do soneto enquanto soma (horizontal dos algarismos) catorze vezes, pela expressão da poesia concreta e visual - um discurso que se materializou e cristalizou num outro código (gráfico-numerológico).
       Duas quadras e dois tercetos - a totalidade de versos no soneto - evidenciam-se graficamente numa organização estrófica com a mesma ordem de leitura do verso da esquerda para a direita, ou vice-versa.
     A leitura vertical da sequência numérica é menos significativa face ao título da composição, mas não deixará de constituir um jogo revelador de somas combináveis com a própria noção de soneto: a coluna da esquerda totaliza 49 (noves fora quatro - uma quadra); a seguinte e a do meio somam, cada uma, 35 (noves fora 8 - duas quadras; sem esquecer que 35+35 = 70, noves fora 7 - uma quadra e um terceto); a penúltima, 28 (noves fora um - a unidade do soneto, para não referir a soma de 2+8, a totalizar 10 - o habitual verso decassilábico); a última coluna, à direita dá 63 (o 6 que representa os dois tercetos; 3, a composição versificatória do terceto).
       Números e letras; Matemática e Literatura (Poesia). 
       Para quê separar códigos que a Proporção Divina juntou?

    ... tem o Homem que saber interpretar a sua própria criação e as suas convenções. Tudo dele depende, sabendo que, nos contrários, também há lugar para os afectos: "letras e números dando um abraço".

domingo, 11 de outubro de 2009

Poesia do nosso tempo... e do barroco

     A propósito de um comentário a um 'post' que refere o facto de a poesia visual e a concreta manterem relações com o período barroco. E não só!

      Buscar a motivação imagética que possa estar por trás de um poema concreto, na verdade, não está muito distante dos poemas emblemáticos de Alciati (jurista italiano, autor da obra Emblematum liber, publicada em 1531). Estes foram muito conhecidos entre os séculos XVI e XVII e, na generalidade, eram compostos por um mote (provérbio ou outra expressão emblemática), uma ilustração e um texto epigramático.
      Esta tendência iconográfica tem sido, inclusivamente, estudada para cruzar formas artísticas e estéticas que se enriquecem mutuamente - caso da poesia e da pintura. Dir-se-ia mesmo que estas relações encontram-se já sublinhadas na Ars Poetica de Horácio e na máxima "Ut Pictura Poesis" (numa irmandade das artes em torno e/ou em busca de sentidos). Daí o reentendimento de muitos textos poéticos - como os de Camões, por exemplo, à luz dos códigos culturais convencionais bem como das fontes (artísticas) da sua produção lírica.

Pormenor de "A Primavera", de 1478 (Boticelli)

CANÇÃO IV

A instabilidade da Fortuna,
os enganos suaves de Amor cego,
- suaves, se duraram longamente - ,
direi, por dar a vida algum sossego;
que pois a grave pena me importuna,
importune meu canto a toda a gente.

Camões
(excerto inicial)

Aquele dos meus olhos doce lume,
por quem alegre fui, por quem sou triste,
e a vida em largas queixas se consume,
donde está, cego Amor? (...)

Camões
(excerto de "Éclogas")

... aqueles cujos peitos
ornou de altas ciências o destino,
esses foram sujeitos
ao cego e vão Minino,
arrebatados do furor divino.
Camões
(excerto de "Epigramas")

       Nesta circularidade do tempo, neste mito do eterno retorno (tópico mais romântico), nesta cegueira humana de que o amor participa como "frecheiro cego", pauta-se a consciência da finitude da existência e a da vontade de contrariar, de algum modo, a heraclitiana constatação de que um homem não se banha duas vezes na mesma água. Preocupação clássica!

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Poesia do nosso tempo

     A sugestão (visual, sonora, sintáctica, semântica) do fluir e do imediatismo voraz do nosso tempo.

    Esta foi a proposta, em 1958, do poeta Ronaldo Azeredo (Rio de Janeiro, 1937-São Paulo, 2006).

in Poesia Concreta, antologia de vários escritores (1962)

     Concreta... tão verdadeira e tão real.

    Tenho de arranjar um antídoto para isto.