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quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

Um questão de sujeito(s)

     Não se pode dizer que seja novidade! Versão para outro(s) sujeito(s).

     Já se abordou uma questão similar em apontamento anterior: a do sujeito sintático de uma oração que, indevidamente, deu lugar a resposta que, no contexto do apontamento, só fazia sentido na orientação crítica pela política do momento (se é que não é a de todo o sempre).
      Desta feita, a versão da interação é outra:

Cartoon espelhando uma interação infeliz

    A felicidade de um sujeito é questão deveras polifacetada, a julgar pelas respostas dos alunos. Talvez a questão docente não tenha sido a melhor, na interação criada. Nada como explicitar o que se pretende, para que o discurso pedagógico resulte mais ajustado aos objetivos pretendidos. Se de sujeito sintático se trata, é bom que se questione acerca do mesmo, para não saírem outros, indesejados (nem o poético, nem o lírico, nem o discursivo, nem os que os alunos sugerem, na riqueza de "conhecimentos de mundo" que têm).
      Assim preferia, na boca da professora, a questão "Qual é o sujeito sintático da frase?" A variedade de respostas ficava bem mais inoportuna e inadequada (questões básicas de interação que um cartoon põe a nu, se não forem mesmo representativas de situações reais a evitar).
     Cá por mim, para além da questionação a corrigir, também não me ficava pelo sujeito clássico na sintaxe. No caso do nível secundário, por exemplo, apostava nos que surgem invertidos, para que não fique a ideia de que o sujeito sintático é sempre aquele segmento que abre uma frase ou oração (Diz-se que não há questões perfeitas / É interessante que o sujeito esteja no final da frase / À questão da professora responderam os alunos - só para me ficar por alguns casos críticos da localização sintática do sujeito).

       Por aqui me fico, para não ter que dizer que lá se foram os predicados - não os da frase, mas os dos alunos, cujas virtudes ficaram muito a desejar, um pouco também por causa do que a professora perguntou.

domingo, 15 de setembro de 2019

Polissemia

      Quando o dever não dá lugar a pagamento.

    O dever de obrigação (deôntico) difere do de probabilidade (epistémico). Também há o dever das tarefas solicitadas, o do reconhecimento, mais o das dívidas a pagar (não sendo obrigação, bem que o podiam ser em qualquer dos casos, para evitar a falta, o silêncio e a injustiça). E na confluência de todos, vem o cómico:

Cartoon colhido do 'Facebook'

     Se ao primeiro se associa a atribuição e o reconhecimento (daí 'dever' ser sinónimo de 'atribuir-se'), ao segundo é dado o significado do pagamento ('estar em dívida'). É o que dá o termo ser polissémico (ou, então, o sentido de crise andar muito apurado).

    Mais uma razão para se diversificar o vocabulário nas interações, não vá um aluno pretender brincar com a situação (e o significado das palavras).

      

domingo, 28 de outubro de 2018

Anedota com muita linguística

      Entre a flexão, o traço semântico e os subentendidos pragmáticos.

      Assim que ouvi a anedota, pensei que a linguística explica tudo neste diálogo que parece existir entre um(a) professor(a) e um aluno chamado Manuel (mas que poderia também ter outro nome qualquer, nomeadamente o espertalhão do Zezinho):

      - Manuel , diga o presente do indicativo do verbo caminhar.
      - Eu caminho... tu caminhas... ele caminha...
      - Mais depressa!
      - Nós corremos, vós correis, eles correm!

      A flexão verbal em tempo, modo, pessoa e número é um dos dados de análise regular em termos morfológicos. Quanto aos traços sémicos [+rápido] e [+movimento] conjugados, dão por certo para reformular a palavra de partida e chegar a um outro verbo.
  Quanto à pragmática, ainda ali pela interpretação coerente e motivada pelo(s) subentendido(s) implicado(s) no "Mais depressa!". E caminhar mais depressa pode ser perfeitamente correr.
   
       Aluno inteligente!

domingo, 14 de fevereiro de 2016

Modalidade(s) de 'poder'

      Entre as várias multifuncionalidades que 'poder' tem, para lá da que decorre de uma capacidade / habilitação para algo, vem também a que se impõe pela crença e pelo desejo.

      Tudo a propósito de uma dúvida que me chega pela manhã (é nesta que se começa o dia):

     Q: Que modalidade e valor pensas estar presente neste segmento: "Não pode ser, não pode ser. Deus não podia consentir em tal" (Maria, em Frei Luís de Sousa). Obrigada.

       R: Comecemos por situar o "tal" - o tema / assunto de que se fala.

    "E pensar que havia de morrer às mãos de mouros, no meio de um deserto, que numa hora se havia de apagar toda a ousadia refletida que está naqueles olhos rasgados, no apertar daquela boca! Não pode ser, não pode ser. Deus não podia consentir em tal."

Telmo (João Villaret) e  Maria (Maria Dulce) 
no filme "Frei Luís de Sousa" (1950) 

       Na interlocução de Maria com Telmo (cena I do ato II), o enunciado proposto é revelador de uma crença do falante (Maria) face a um acontecimento. 
      Convocando uma crença religiosa assumida, a filha de Madalena e Manuel de Sousa Coutinho não acredita num facto que, naturalmente, não deseja e que, em função do contexto e da época representados na ação (príncípios do século XVII, conforme se lê na didascália inicial do primeiro ato), alimentou a esperança sebastianista do tempo: a da morte do jovem rei (condição necessária para que o seu regresso pudesse efetivar-se).
    Focando o segmento sublinhado, este reflete uma construção com o verbo modal 'poder' a transmitir a negação de uma possibilidade, matizada por uma subjetividade assente numa crença ("Não pode ser. Não pode ser") que acaba por ser projetada para um futuro (a ler-se na forma 'podia' do enunciado seguinte: "Deus não podia consentir em tal").
     Esta forma ‘podia’ atende a características específicas, à semelhança do que acontece em inglês com o contraste 'can / could'. Segundo Tim Stowell1, estes modais apresentam-se frequentemente neutralizados na sua interpretação presente/passado, em determinados contextos sintático-semânticos. Não obstante a forma do pretérito imperfeito, 'podia' ('could') não tem necessariamente interpretação de passado - o que pode ser exemplificado com o final da réplica de Maria. A negação, a recusa que subjaz a 'não podia' aponta para várias implicaturas: não querer que D. Sebastião tenha morrido; a morte de D. Sebastião é uma tragédia; Deus não permite que tal tragédia possa acontecer. Resulta, assim, uma enunciação a refletir uma posição pautada pela incerteza velada face à factualidade (a morte de D. Sebastião) e por um perigo iminente face à crença (a de que Deus possa agir de alguma forma contra o rei). 
     Em suma, exprime-se a não factualidade (desejada) da situação e uma crença (sujeita aos limites de qualquer fé), implicando uma força argumentativa próxima da expressão do desejo do falante.
     Consideradas as condições pragmáticas na produção do discurso e uma vez analisada a realização de 'poder' neste segmento textual, evidencia-se uma réplica que está para o ato da recusa, da rejeição, encarado pela personagem Maria, no plano da modalidade epistémica marcada pelo valor do impossível, mais matizado pelo fator das crenças e dos desejos do que pelo da realidade ou factualidade das certezas - um 'poder' que, não o sendo, é a possibilidade negada ou a impossibilidade subjetivamente equacionada.
    É neste enquadramento que a linguista americana Angelika Kratzer2 refere o conceito de modalidade "bulética" (numa tradução livre e literalmente aportuguesada, a partir de ‘bouletic’), para transmitir, enquanto subtipo da modalidade epistémica, o que é possível ou necessário no âmbito dos desejos ou das expectativas do falante.
NOTAS: 
1) STOWELL, Tim (2004:621-636) - "Tense and modals" 
in GUÉRON, Jacqueline e LECARME, Jacqueline (eds.) - The syntax of time, Cambridge, MIT Press

2) KRATZER, Angelika (1981: 38-74) - "The notional category of modality",
in EIKMEYER, H-J.e RIESER, H. (eds) - Word, worlds, and contexts: new approaches to word semantics
Berlin, W. de Gruyter

      A (im)possibilidade das crenças sempre moldou o saber e o conhecer - pelo menos, enquanto assim se desejou.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

"Branca Flor a mim basta basta"

      Assim se repetiram as palavras ouvidas de um pequeno grande livro da literatura infanto-juvenil.

     No Centro de Recursos-Biblioteca da Escola Secundária de Gondomar, os alunos do 8º ano turma 2 tiveram a oportunidade de ouvir, na voz da própria Clementina Sousa, a história de Branca Flor. Um momento de partilha - com a magia da palavra (f)alada - é sempre uma oportunidade para encantamento e imaginário feitos de fantasia e melodia.
    Entre provas, pedras negras, viagens, duelos, fugas e reencontros, um caminho para a salvação e felicidade é conquistado pela personagem Manuel - um jovem que, ao conhecer Branca Flor, constrói a sua própria vida numa possibilidade de realização pessoal e afetiva.
       Bem diziam os clássicos "Palavras, leva-as o vento" - não pelo sentido de fugacidade e volatilidade que hoje se atribui à expressão, mas pela qualidade e pelo prazer que a oralidade introduz nesse fluir fónico, nessa modulação de âmbito oratório e retórico trazida pelas horas do conto.
     Refere a escritora, na introdução ao livro produzido (algures também numa prateleira da biblioteca), que aprendeu esta narrativa da boca de Diamantino, moço de profissão que dedicava a hora do descanso e almoço a contar histórias. O mesmo viria a fazer Clementina aos seus alunos, enquanto professora; ainda o faz junto de jovens e de todos aqueles que, já não o sendo na idade, se deixam levar pelo melhor que o espírito dessa juventude ainda lhes dá.

 Clementina Sousa enquanto contava Branca Flor, a alunos e a professores  (Foto VO)

     Ora entregues ao registo de alguns pormenores da história ora rendidos ao fantástico que o conto anuncia e desvela, para os alunos envolvidos na atividade não houve tempo senão o que, sem data e sem hora, culminou numa espécie de mil e uma noites vividas no final de uma manhã, também com flores e a doçura do reconhecido e grato encontro.

Alunos e professores à escuta da Branca Flor, na voz de Clementina Sousa (Foto VO)

      Exemplares, sorridentes e à espera da resolução da história, os ouvintes não deixaram de fazer ouvir a sua voz, no final, colocando o dedo no ar ora para fazer algumas perguntas mais ora para deslindar alguns passos de uma narrativa recuperada desse cavalo do pensamento (em que Manuel e Branca Flor também galoparam), para memória de todos.

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Interações 'muito' educativas

     Há tempos, um colega contava-me uma experiência de sala de aula, no mínimo, risível.

     No máximo, este apontamento é o reflexo crítico para uma das grandes preocupações que certos grupos editoriais têm em "facilitar" o máximo do trabalho aos professores. Põem-se no papel de facilitadores, quando deviam ser facultadores de instrumentos credíveis.
     Reza a história o seguinte: estava o professor a corrigir um exercício de Ciências - solicitado para resolução em aula -, quando, na interação posteriormente criada, vive este diálogo:

     - Vamos lá corrigir a tarefa. Que respondeste à questão X, Diogo?
     - Ah, essa é resposta aberta!
   (Se o aluno experiencia a certeza do sucesso, fica o professor incrédulo perante a incoerência da resolução, pois nada faz prever que se discuta a abertura ou o fecho de qualquer coisa que seja). 
     - És capaz de explicar o que te levou a dizer isso?
     - Está aqui nas soluções, professor.
     (E mostra o livro, com uma banda de soluções à esquerda).

    Assim se educa para melhores competências nas aprendizagens!
    Têm já sido várias as experiências de que mais vale não ter em conta o que se diz nessas bandas; que tão mau (ou pior) quanto apresentar soluções inúteis é induzir professores a errar ou a vivenciar situações absurdas junto dos estudantes; que nessas bandas muitas vezes se constroem desconcertos, para não dizer mesmo erros inquestionáveis. Entre vários, o último que encontrei foi o de se assumir a expressão "esta barca de tristura" (segmento vicentino do quadro cénico do Fidalgo, proferido pelo próprio no Auto da Barca do Inferno) como representativa de eufemismo! (Imagino a "suavização" que o termo 'tristura' sugere, comparando com tristeza, ou que a própria personagem condenada deve sentir). 
     Se houver alunos que pensem que os autores devem estar loucos (ao proporem o que não devem), mais vale explicar que pensar é ato mais seguro do que receber respostas, muitas vezes surgidas não porque os primeiros queiram, mas porque alguém acha que os manuais - encarecidos numa época crítica para todas as famílias - vendem mais por isso mesmo. Interesses pouco didáticos ou pedagógicos, portanto.

   Ilusões incompatíveis com a consistência do saber (que para alguém já não é, por certo, prioridade).

terça-feira, 25 de junho de 2013

Diálogo muito pronominalizado

     Acho que foi por causa do exame de Língua Portuguesa de 3º Ciclo (com um caso de pronominalização muito peculiar) que me lembrei deste diálogo.

     Não é coisa inventada. Foi real, ainda que na prossecução de um desafio que ambos os interlocutores quiseram expandir até ao possível.
      E assim resultou:

     Em plena sala de professores, um diálogo entre colegas:
     - Por acaso, terás contigo o DVD do “Clube dos Poetas Mortos”?
     - Tê-lo-ei, por certo.
     - Emprestar-mo-ias, para o passar numa das minhas turmas?
     - Fá-lo-ei com todo o gosto.
     - E importar-te-ias de mo trazer amanhã?
     - Trar-to-ei, sim senhor. Dir-me-ás apenas onde o deixar.
     - Pois… Encontrar-nos-emos por aqui, lá para a hora e meia?
     - Não creio! Deixá-lo-ei, então, no PBX. Pedi-lo-ás quando por lá passares e entregar-to-ão.
     - Ficar-te-ei muito agradecida.
     - Sê-lo-ás para toda a vida!
     E os sorrisos acompanhavam as palavras e os atos.

      Entre os sorrisos de cumplicidade no jogo discursivo dos dialogantes, chegou, por fim, o riso sonoro de uma outra docente que assistia deliciada a esta interação tão preenchida de mesóclises e de tmeses, para bem da pronominalização.

     Fica o exercício complementar: encontrar os antecedentes das pronominalizações. Indicá-los-ia se não tivesse mais do que fazer.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Já não há nobreza como antigamente!

      Por estas e por outras é que convém fazer o molho em casa.

  Quem vai à procura de certos produtos, no supermercado, e depara com erros como o da direita devia reclamar; dizer que o produto tem defeito ou que está impróprio para consumo. 
    Nem a forma de tratamento, típica da nobreza, salva a situação (para o 'dom', há um 'com' muito pouco nobre ou grato aos olhos de quem lê o slogan publicitário).
  O molho até pode ser português, mas é COM CERTEZA de má qualidade no português.
    Destinado a uma francesinha, chega a ser imperdoável que esta venha a ser regada com líquido tão mal anunciado / escrito.
   Se 'sem certeza' é expressão, por que motivo 'com certeza' não o é?
   Também por já ter encontrado este mesmo erro em produções dos alunos acabei por o introduzir numa das interações que passo a reproduzir:

"- André, importas-te de ir pedir o comando do projetor à senhora funcionária?
 - Com certeza, professor.
 - Tudo junto ou separado?

 - Como?! Ah!... Tudo junto.
 - Não, André! Separado!"

   O autor do rótulo para o "dom molho" precisava de uma interação oral destas para se consciencializar da escrita e não incorrer em erro tão escusado.

   O que um professor tem de fazer para os levar a aprender...