segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Sintaxe difícil... e com elevação!

      Mais um passinho nas dificuldades da sintaxe.

Q: Na frase "Parece que ninguém reparou na tristeza dele.", qual a função sintáctica de "que ninguém reparou na tristeza dele" é de complemento directo? ou, uma vez que estamos perante um verbo copulativo, funciona como Predicativo do sujeito? Obrigada.

R: Segundo a frase considerada, começo por indicar que não se trata de uma realização de ‘parecer’ enquanto verbo copulativo, para não dizer mesmo que há linguistas que problematizam essa classificação da gramática tradicional (cf. João Peres e Telmo Móia, na obra Áreas Críticas da Língua Portuguesa, aproximando a realização do verbo 'parecer' das construções de movimento de elevação). Portanto, não se trata de predicativo do sujeito.
     ‘Que ninguém reparou na tristeza dele’ configura-se como completiva numa construção em que o verbo da frase matriz (parecer) se realiza com a estrutura de um argumento lógico não vazio e um outro vazio. Assim, face à estrutura argumental traduzível em “Algo parece alguma coisa’, diria que a ‘algo’ corresponde sintacticamente um lugar vazio que se identifica com um sujeito nulo expletivo; ‘alguma coisa’ corresponde à completiva em análise com a função de complemento directo.
     Este raciocínio é corroborado ainda pelo seguinte:
     i) a presença de um sujeito nulo expletivo equipara-se a construções típicas do francês e do inglês que preenchem esse argumento pronominalmente (‘Il semble que X’ e ‘It seems that X’, respectivamente); em Português pode encontrar-se construção similar em Ele parece que X’;
     ii) a classificação da completiva em análise, enquanto complemento directo, é justificada pelo próprio teste de pronominalização que, no caso de construção oracional, dá lugar ao demonstrativo ‘isso’ (‘Parece isso’; ‘Ele parece isso’).

     Este é bem um dos casos que interessará trabalhar depois de se estabilizar noções básicas de sintaxe (tanto em termos de construção como de identificação de funções sintácticas). E, de novo, a integração de instrumentos, como os de testagem, nas aulas de gramática é um princípio a considerar. Seria um passo fundamental para um entendimento da sua dimensão experimental, oficinal e/ou laboratorial.

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