sexta-feira, 2 de abril de 2010

As salaam alekum...

          Assim se cumprimenta quem se deixa dominar pela Fúria Divina.


      A construção do romance obedece a um processo de alternância desnivelada: entre duas histórias aparentemente paralelas, com o nível narrativo centrado no egípcio Ahmed a situar-se num ponto mais recuado no tempo face ao que focaliza a intriga de Tomás de Noronha-Rebecca Scott-Frank Bellamy.
    Numa intriga feita de enigmas a descodificar, de aprendizagens a construir e de riscos / desafios a correr, o leitor ganha com a pesquisa feita por José Rodrigues dos Santos e a partilha sobre alguns dos princípios e ideais islâmicos (dos mais pacíficos aos mais fundamentalistas); tira ainda proveito de toda uma história que apresenta diferentes perspectivas do que é o islamismo, o Alcorão e o radicalismo religioso.
        Numa crise mundial em que Ocidente e Oriente são pólos de tensão e de luta pela supremacia de poder, a religião torna-se bandeira para um jogo conflitualmente assumido entre o governo segundo as leis dos homens e o domínio segundo as leis de Deus (não fossem estas últimas interpretadas à luz da racionalidade dos homens!).
        Tudo o mais anda algo próximo da receita de Dan Brown e da personagem Robert Langdon: um perigo instala-se, o confronto com o mau da fita é inevitável, a descoberta é feita (jogando com sinais e raciocínios que um historiador e criptanalista acaba por desvendar ao último segundo). E, para não variar, um toque de sedução para ver se vai durar muito.
         Por fim, há de tudo e para diferentes (des)gostos: entre a afirmação da genialidade do protagonista e a frustração ou desilusão de alguns dos seus intentos.

      Tal como se começou, resta fechar no mesmo tom e com educação: Wa alekum salema (assim se devolve uma saudação).

2 comentários:

  1. Olá.

    Isto hoje é de rajada. Falam-me de livros e de ler por prazer e eu, mesmo sem tempo, não resisto. Tenho essa "fúria divina" na estante, mas ainda não li. Um dos motivos é a sensação de "dejá-vu" que os livros estilo Dan Brown me deixam. Mas nas férias grandes pegar-lhe-ei.
    O meu propósito neste "post" é recomendar um outro livro fantástico que aborda também a cultura muçulmana; é, aliás, uma peregrinação fantástica desde Granada a Roma, passando por Fez, Cairo, Meca entre outras, na companhia de Hasan as-Wazzan ou Jean-Léon de Médicis, como ficou conhecido mais tarde. Refiro-me a "Leão, o africano" de Amin Maalouf. Imperdível. Confesso que o momento em que o li poderá ter influenciado a minha perspectiva (tinha estado em Marrocos e sentido o medievalismo fascinante de Fez, Meknes, Chefchaouan e tinha também decidido aprender a língua árabe - muito mais difícil do que pode ser imaginado. Só começar a escrever da direita para a esquerda demora horas...).
    De qualquer forma, altamente recomendado para quem se sinta atraído pela temática e pelo romance histórico.

    Aqui fica um cheirinho: " Eu, Hassan, filho de Mohamed, o almotacel, eu, Jean-Léon de Médicis, circuncidado pela mão de um barbeiro e baptizado pela mão de um papa, chamam-me hoje o Africano, mas de África não sou, nem da Europa nem da Arábia... Sou filho da estrada, a minha pátria é a caravana e a minha vida a mais inesperada das travessias(...).
    Da minha boca ouvirás o árabe, o turco, o castelhano, o berbere, o hebraico, o latim e o italiano vulgar, pois todas as linguagens, todas as orações me pertencem. Mas eu não pertenço a nenhuma (...) a minha sabedoria viveu em Roma, a minha paixão no Cairo, a minha angústia em Fez, e em Granada vive ainda a minha inocência(...)"

    Digam lá se este início de livro não é fantástico? As primeiras frases de um livro são para mim determinantes. Acho que iniciar uma obra deve ser uma das coisas mais difíceis que existe.

    Ma'a salama (adeus)

    Excelentes leituras.

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  2. Óptima sugestão, que vou considerar.
    Quis ler a "Fúria Divina", primeiro, porque já tinha ouvido falar de algumas experiências bem recebidas por leitores amigos (outros títulos anteriores do autor); segundo, por um grupo de alunos se ter predisposto a apresentá-lo no 'Contrato de Leitura'.
    Para já, quanto a curiosidades orientais islâmicas, fico-me por outro título: "O livro que desceu do céu", de Ahmad 'Abd al-Waliyy Vincenzo. Quando o terminar, digo qualquer coisa.

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