Quando tudo passa pelos sons, é bom que se esqueça por momentos a escrita.
Assim tem de ser quando de rima (homofonia ou conformidade sonora geralmente configurada no final de versos) se trata.
Surge o apontamento por causa de uma dúvida:
Q: Entre as palavras 'coroou / passou' e 'trouxe / fosse' a rima é consoante? Ou não?
R: Primeiro de tudo, interessa clarificar que 'rima' é termo para designar homofonias sonoras a partir da sílaba tónica de palavras, integrando obrigatoriamente um núcleo (vocálico) e opcionalmente uma coda (consoante final).
Consultando o Tratado de versificação portuguesa, de Amorim de Carvalho ([1941] 1981, Lisboa, Centro do Livro Brasileiro páginas 77-79), é possível verificar que a rima consoante é aquela que consiste na homofonia completa de sons vocálicos e consonânticos, ou só os vocálicos (quando não existem consoantes) a partir da sílaba tónica; a toante ou assonante, quando apoiada apenas nos sons vocálicos ou nos consonânticos, a partir da sílaba tónica (daí ser designada também de rima incompleta).
Ora, no par 'coroou / passou', é possível verificar que as sílabas tónicas (sublinhadas) têm correspondência total nos sons vocálicos em rima (sem existência de coda, e não obstante a presença de um som de ataque inicial na segunda palavra). Daí tratar-se de rima consoante (ou completa).
Com o par 'trouxe / fosse', já não há correspondência total dos sons que rimam (o núcleo silábico na primeira palavra é um ditongo, ao contrário da vogal fechada no núcleo da segunda). Neste caso, estamos perante rima toante (ou incompleta).
A análise mais precisa da sonoridade das rimas é aquela que admite como preferencial a classificação rima completa (total dos sons) / incompleta (não total), como já o próprio Amorim de Carvalho o admitia em nota na sua obra.
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