quinta-feira, 22 de março de 2012

Discursos...

    Porque as dúvidas se impõem, quando as definições não são claras.

    Assim mo foi apresentado. Desta forma respondo: com discurso, bem direto.

    Q: Não consigo perceber muito bem a diferença do discurso indirecto-livre e a do discurso directo livre. As definições que encontro parecem muito pouco claras. Será uma questão de moda por causa da escrita dos Saramagos e dos Lobos Antunes? 

   R: Diria por causa desses autores e de outros que pretendam refletir na escrita matizes que a própria oralidade promove, seja para os casos de narrativa oral seja para registos mais elaborados que procurem desenvolver relações e confluências discursivas ou mesmo efeitos de compresença de vozes narrativas distintas (polifonia).
    É certo que tem sido mais habitual e tradicional a abordagem de três formas de relato do discurso: o direto, o indireto e o indireto-livre. No entanto, não só os relatos orais exploram bem o que é uma junção / aproximação / ambiguidade entre o discurso direto de quem relata e de quem é citado como ainda a narrativa literária - marcada pela dimensão reflexiva, de comentário e interação com o narratário - repesca essa estratégia tendencialmente oral para o escrito.
    Os autores citados são um bom exemplo disso, tanto no plano dos romances como no género da crónica.
   Por exemplo, no caso de Saramago e do Memorial do Convento, é possível detetar essa variedade discursiva, essa polifonia de vozes num romance que, num só coro, deixa ouvir a natureza dialogal (interativa, poligerada) e dialógica (convocando para um só enunciado reflexos, ecos, sinais de uma voz plural) da linguagem e da comunicação.
     Perante um narrador que 
       a) assume declaradamente a variedade de perspetivas, de pontos de vista, de focalizações sobre situações, lugares, personagens e o próprio tempo (ora com um pé no século XVIII ora com outro no século XX); 
       b) se implica na narrativa e reflete sobre a própria narração e/ou o ato de escrita; 
      c) cita de forma múltipla e diversificada os pensamentos e as palavras das personagens que constrói, parece ver, quer atingir / transformar (pela crítica) ou com as quais vai solidarizar-se (pela empatia criada); 
        d) se compromete com uma versão crítica, não oficial da História na história que inventa;
       e) simula frequentemente uma espécie de interação com o próprio narratário (explicitamente presente no discurso narrativo),
     adiantam-se já muitas razões para variação e riqueza vocálicas. O discurso narrativo, em termos de composição, permite gravar vários comportamentos verbais dos falantes (com os diferentes registos e/ou traços específicos), geridos intencionalmente pelo narrador. 
      Neste sentido, cabe aqui falar das principais formas de representação e/ou reprodução dos discursos (no discurso narrativo), todas elas a poderem ser revistas no romance considerado:

(Clicar na imagem para reprodução completa das modalidades de discurso: direto, indireto, indireto-livre, direto-livre)


     Riquezas, complexidades que sublinham a singularidade na expressão romanesca, narrativa de vários escritores (de que José Saramago e António Lobo Antunes são exemplo), além da estratégia diversificada e matizada dos relatos orais dos falantes (por exemplo, com ironia, com apartes, com encaixes de comentários, com a desconstrução do discurso e da linguagem, com a coloquialidade e a aproximação ao narratário, entre outros).

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