quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Estamos nisto! Ortografia do melhor...

      Quando estás preparado para ser informado sobre o que se passa no mundo, ...

       ... as notícias aparecem na sua pior escrita.
    Dúvidas houvesse acerca da influência da oralidade na escrita, os erros comuns na ortografia de palavras como 'feminino', 'ministro', 'príncipe' e afins demonstram-na. Daí que, no plano da correção escrita, seja de abordar estes casos críticos, para que resultem em domínio mais consciente e correto do ato de escrever.
    A televisão começa a dar sinais de como esta competência parece já não ser apanágio do bom exemplo do serviço público e da exposição ao bom uso da língua:

Eis a razão para, sem dúvida(s), preferir o favorecimento, bem escrito (com agradecimento à AC) 

    Claro que não é necessário dominar a etimologia e reconhecer a base latina "PRIvilegium" (embora ajudasse): a leitura de vocabulário frequente permite ver bem as sílabas de "PRIvilégio" (desde logo a primeira de todas); a família de palavras assinala recorrências evidentes em "PRIvilegiar", "PRIvilegiado", "PRIvilegiadamente", "desPRIvilegiado" (pela consciência repetitiva da base); a consulta de um dicionário, hoje, está à mão de qualquer telemóvel ou computador pessoal (com palavras bem grafadas).
      Tão bom seria ver / ler palavras, em primeiro plano, para uma comunicação feliz!

     Talvez por causa do mau exemplo, prefira o favorecimento ao outro termo que, em vez de 'pre', deveria ter 'pri' na sílaba inicial.

sexta-feira, 24 de novembro de 2023

Dia Nacional da Cultura Científica

         Poucos minutos, mas para minha memória futura.

       Uma turma de 10º ano, uma lição de Físico-Química A e o motivo do Diretor na sala de aula: um cartaz assinado que havia motivado dois dedos de conversa sobre Rómulo de Carvalho e o Dia Nacional da Cultura Científica, mais uns poemas que importava partilhar. O convite "Queres vir à aula, amanhã?" foi imediatamente aceite.

Saberes que cruzam letras, planetas, forças e número em abraço

        Há 117 anos, nascia aquele que viria a ser professor de físico-química do ensino secundário no Liceu Pedro Nunes, Liceu D. João III (Coimbra) e no Liceu Camões; pedagogo, investigador da história da ciência em Portugal... e poeta, sob o pseudónimo de António Gedeão. Há 25 anos celebra-se o "Dia", inspirado neste professor e divulgador de ciência. Também escritor literário. Razões mais do que suficientes para o homenagear. "Pedra Filosofal", "Lição da Água", "Lágrima de Preta" são das mais reconhecidas produções poéticas.
         Li "Impressão digital".
      A propósito dos "olhos", lembrei Camões e "Se Helena apartar / do campo seus olhos / nascerão abrolhos" - os efeitos do olhar de Helena na natureza são transformadores (sejam olhos verdes da "cor do limão" sejam de outra cor, mas "olhos do meu coração"). Os olhos de Gedeão são outros. Mais próximos dos contemporâneos, por certo, com abordagem e orientação temática bem distintas, sublinhando e definindo o que nos singulariza, o que nos faz ser diferentes, tal como uma "impressão digital".
      O tema da relativização do que se vê, da perceção das coisas, do copo meio cheio / meio vazio, da visão otimista em confronto com a pessimista são lições para a vida, para o crescimento do entendimento do universo. É / são saber(es) que o texto / poema dá, vindo(s) de alguém que se fez Homem da Ciência e das Letras, mostrando que a fronteira entre conhecimentos não faz sentido.
António Gedeão, no Parque dos Poetas (Oeiras)
     Ficou o convite para se deslocarem a Oeiras, ao Parque dos Poetas, e verificarem como uma estátua em honra do poeta António Gedeão não desdiz o físico Rómulo de Carvalho, mais os seus tubos de ensaio. Com física ou química, há lugar para a poesia, nas palavras que se atraem, noutras que se afastam - forças que a física designa de atração e de repulsa. Também há flores e escolhos (que rimam com os camonianos abrolhos); pedras pisadas, gnomos e fadas; moinhos e gigantes.

        Um dia que se marcou pela diferença, nas ciências que se complementam, por cruzarem saberes e darem outro sabor - um halo diferente na vida. Obrigado, AMT.

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

A propósito de escândalos (no plural)

     Não bastava um, tinha de aparecer outro.

    É o que dá não distinguir verbos principais de verbos auxiliares. No caso de 'haver', é a diferença, respetivamente, entre a forma exclusiva do singular e a que admite o contraste de número com plural.
     Por isso, quando o verbo é principal, como em...

Escândalo atrás de escândalo (com agradecimento à CF)

     ..., não há plural. Há um, há dois, há mil. No caso, havia (dois telemóveis que sejam).
     Entre o escândalo noticiado e a forma verbal escandalosa, não há telemóveis que escapem. Numa semana em que, numa só reunião de trabalho, os discursos oficiais permitiram ler e ouvir "*Alguns de vós não esteve presente" (credo!) e "*Ainda que não tenhemos dados..." (salvo seja!), já espero tudo, no mal em que a língua anda.

      Atrocidades à visão e à audição, para o comum dos mortais.

quarta-feira, 22 de novembro de 2023

Pano-Pão-Planeta

      São três "Ps" para a vida.

    Na padaria e pastelaria 'Pão Pepim', em Espinho, foi experimentada uma receita de pão para a Semana Europeia dos Resíduos (18 a 26 de novembro).
     No decurso da semana, um pequeno gesto contribui para uma grande causa: um saco de pano faz a diferença.

Campanha da Pão Pepim e do Agrupamento de Escolas Dr. Manuel Laranjeira (foto VO)

      Hoje, depois de tomar um cafezinho, à hora do pagamento, os olhos pousam num "RollUp". Da grande mensagem ao pequeno pormenor, vê-se quem participa na causa.
    Lida a mensagem, levado o saco de pano, comprado o pão, fica o dever cumprido pela sustentabilidade do planeta.

      Leva-se o pano, compra-se o pão; alimenta-se o Homem, poupa-se (n)o planeta.

terça-feira, 14 de novembro de 2023

Conjugações pronominais (e outras coisas mais)... no seu pior.

        Pasmo com alguns documentos oficiais (pois quanto aos que não o são...)

     De erros e pontapés na gramática estão os media cheios, bem como alguns falantes da língua, mesmo o intitulado 'Bom Português', que, por vezes, deixa muito a desejar.
       Com documentos oficiais, a questão torna-se bem mais grave, assumo. Assim o penso sempre que me cruzo com pérolas (asneiras) deste tipo:

Da língua mal dirigida na educação, ainda por cima quando vem da Direção-Geral!

    E tenho eu que ler isto, quando ensinava que, na conjugação / construção pronominal, os verbos terminados em 's' perdiam esta consoante em contexto de sequência de pronome pessoal átono:

       Encontramos + nos > ENCONTRAMO-NOS
       Fizemos + o (trabalho) > FIZEMO-LO
       Deténs + o (juízo necessário) > DETÉM-LO
       Lavais + vos > LAVAI-VOS
       Convidamos + vos > CONVIDAMO-VOS

     E quando dizia que uma vírgula não separa o complemento do seu verbo, no predicado. Se ainda fosse com duas (uma depois de " a participar e a divulgar" mais aquela colocada antes de "o desafio"), tudo estaria bem, com o encaixe da sequência "..., junto de todos... Escola Não Agrupada,..." entre vírgulas (uma antes e outra depois, para haver encaixe e não ter uma vírgula a separar o núcleo verbal dos seus complementos). 
     E, como não há duas sem três, que dizer daquele apontamento final "Toda a informação e regulamento disponível"!!! A informação (disponível) e o regulamento (disponível) não estarão para uma coordenação nominal com concordância no plural ("Toda a informação e regulamento disponíveis...")?!

     Vai mal a língua ou o conhecimento dela (que tende para o desconhecimento). Como irá a educação que dela e nela se dá?!

quinta-feira, 2 de novembro de 2023

Gaivotas em terra

      Ei-las todas alinhadas ao sabor do vento (que não muda nem para).

    Assim as encontrei, ao sair de casa, plantadas na relva que ladeia o "mamarracho" cá do sítio.

Gaivotas em terra... de Espinho (Foto VO)

     Lá diz o povo: "Gaivotas em terra, tempestade no mar". Sim, este anda muito agitado, altivo, tal como o mundo. Até as aves marinhas procuram repouso à espera de melhores dias. Acrescente-se, contudo, que as expressões idiomáticas e os provérbios são frequentemente redutores e culturalmente relativos. Isto é evidente quando na terra a acalmia é só para alguns e a agitação também não é para todos.
    Não é ocasião para lembrar que "uma gaivota voava, voava" (lá chegará!). É momento para deixar a tempestade amainar. Há tempos assim. Deixá-los passar. Hão de mudar.
     Gostava de ser uma destas gaivotas, em sossego. Ter tempo para reler Gaivotas em Terra, obra que David Mourão-Ferreira produziu na estreia da sua ficção narrativa (1959) e com a qual foi galardoado com o Prémio Ricardo Malheiros, da Academia das Ciências de Lisboa. Há nela uma novela intitulada "E aos costumes disse nada" (adaptada, em 1982, ao cinema como "Sem Sombra de Pecado", por José Fonseca e Costa), com um toque de escrita a lembrar prosa queirosiana, um retrato de época e de um país com muitas "tempestades":

       "E os tempos iam maus: quase toda a Europa estava em guerra, quase todo o mundo estava em guerra. Dos meus camaradas do COM, a maior parte tinha sido destacada para os Açores: alguns outros para lôbregas unidades fronteiriças. Eu - talvez graças a influências do meu pai - fora dos raros privilegiados a ficar numa guarnição de Lisboa." 
in "E aos costumes disse nada", de Gaivotas em Terra, Presença, [1959] 1998

     Neste segmento narrativo convergem várias metáforas: as da família, do quartel, da cidade, da guerra (e da sua linguagem), da terra a conviver com o grotesco, com a máscara, com uma formalidade aparente; a contrastar com a antítese e a duplicidade de comportamentos. Transparece uma sociedade que pouco tem de liberdade, na teia do "ser" e do "parecer", à espera de uma outra "tempestade", mais libertadora e geradora de condições de vida mais dignas.
     Pensamentos e reflexões feitos de uma atualidade que cansa (porque há quem teime em não aprender ou se renda ao que não é dever nem poder).
       
      Não sei se estas são as gaivotas que voam, que aspiram ao alto, à mudança; parece-me que não trazem "o céu de Lisboa". Andam mais perto, ameaçadoras. Talvez em qualquer lugar, a qualquer instante, espalhando excrementos corrosivos que importa limpar de imediato (como a "cegueira", as invejas e outros males do mundo). Com Zeca Afonso, o digo: "não há só gaivotas em terra quando um Homem se põe a pensar".