quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto

     Um dia que não pode ser desconsiderado na memória da Humanidade, por mais que o tempo passe.

     Entre os livros que se leram, os filmes que se viram, as palestras a que se assistiram, as viagens que se fizeram, nada se equipara ao vivido.
     Tenho algumas memórias acerca do dia lembrado, felizmente, nada comparado com os que sofreram na pele os acontecimentos hediondos da História. Ainda assim, são memórias minhas entre a revolta e o medo de que esses tempos tenham existido e de que possam vir a repetir-se por ação consciente do Homem, desconsiderando e humilhando o seu semelhante.
    O mais próximo que estive dessa realidade foi ter viajado e ter observado sinais de uma vivência que atualmente se pode dizer museológica, mais de sessenta anos depois, em Sachesenaushen, em Auschwitz, em Birkenau. Pisar o chão que foi percorrido por judeus, e não só, conduzidos ora para trabalhos forçados (em condições de sobrevivência desumana) ora para a morte, é uma memória necessariamente distante do sofrimento real, por mais que este possa ser mostrado aos olhos de um turista. Cada passada em chão de terra e cascalho é ouvida nesse caminho que foi o de centenas de milhares forçados a um infortúnio frequentemente fatal. Faltam as sirenes, as luzes de denúncia e perseguição; os gritos dos militares e o ladrar dos cães; a chuva ou a neve ou o vento ou todos eles combinados; a verdadeira fome e sede (tanto de pão como de justiça); as fortes agressões físicas e psicológicas; o céu escuro da noite ou o cinza diurno dos folículos negros da chaminé caindo e com cheiro a carne queimada. 
       Pode ainda sentir-se o peso do momento; nunca será o do tempo da recordação.

À entrada "O trabalho liberta", em Sachsenhausen (Foto VO)

        O Campo de Concentração de Sachsenhausen, pequeno na comparação com os congéneres polacos, é um desses espaços-museu, na Alemanha. Ativo desde meados de 1936 (numa inauguração simultânea com os Jogos Olímpicos de Berlim) a abril de 1945, tem o nome Sachsenhausen, na cidade de Oranienburg, em Brandemburgo. Foi aí que se confinaram ou liquidaram em massa, primeiro, os opositores políticos ao regime de Hitler; depois, judeus, ciganos, homossexuais, Testemunhas de Jeová, além de milhares de prisioneiros de guerra.

Memorial das vítimas de Sachsenhausen (Foto VO)

        O memorial às vítimas - primeiro, às mãos dos nazis, depois, à mão dos serviços secretos soviéticos - é um belo registo escultórico dos tempos sórdidos então vividos pelos prisioneiros. Numa das várias placas espalhadas pelo campo, lê-se uma das maiores lições a tirar do que foi experienciado:

Pensamento de um prisioneiro do Campo de Concentração de Sachesenhausen (Foto VO)

"E eu sei mais uma coisa - que a Europa do futuro 
não pode existir sem comemorar todos aqueles, 
independentemente da nacionalidade, que foram mortos naquele tempo, 
com todo o desprezo e ódio; que foram torturados até à morte, 
famintos, gaseados, incinerados e estrangulados..."

          Em plena Berlim, entre as muitas evidências do que foi o centro da II Grande Guerra, um outro sinal das atrocidades infringidas pode ser contemplado:

Memorial dos Judeus, em Berlim (Foto VO)

       Em terreno inclinado, 2711 lajes de cimento compõem o "Memorial do Holocausto", construído entre 2003-2004 e inaugurado em maio de 2005, numa homenagem aos judeus vitimizados no holocausto europeu. São cerca de 20.000 metros quadrados com blocos de tamanho distinto, onde os turistas se passeiam, se cruzam numa espécie de labirinto aberto - um monumento da desgraça passada a divertir os que presentemente parecem estar a jogar às escondidas.
       Não há A Lista de SchindlerA Vida é Bela ou O Pianista que se equipare a cada passo calcorreado nestes locais de desgraça humana, hoje encarados como uma topografia de horrores, de roteiros de sinais de tragédia distante.
     Foram imensas as vítimas, muitas mais as desgraças que só alguns puderam, de algum modo, contrariar. No caso português, há o exemplo recentemente lembrado com o "Dia da Consciência".

      Está anunciado para o Porto um Museu do Holocausto, o único da Península Ibérica. Quero lá ir, certamente, quando a pandemia não for tão trágica; porém, os ares alemães e polacos serão sempre mais autênticos para um genocídio humano que o regime nazi impôs ao Mundo.

terça-feira, 26 de janeiro de 2021

Uma questão de imaginar!

        Circulam pelo Facebook imagens inspiradoras.

       Uma delas tem o título da canção de John Lennon, mais a imagem de rosto deste músico, com uma "anomalia narina". Há quem diga ser obra desse famoso desconhecido contemporâneo - Banksy -, mas nada tem sido provado nesse sentido (antes pelo contrário).

Arte de rua, lembrando a utopia (imagem colhida do Facebook: Imagine | Ha! Tea 'n' Danger (wordpress.com))

       Seja como for, é obra de parede, de arte urbana, bem ajustada aos nossos tempos: um hino a uma utopia, sempre necessária ao ser humano. Hoje, por razões óbvias, a imaginação está para um mundo sem pandemia:

 Imagine all the people
Living life in peace

...

Imagine all the people
Sharing all the world

        As palavras de Lennon, na sua voz ou na de Chris Martin, são um elixir para os dias tristes dos últimos tempos.

        Imagina o dia em que nos veremos livres da Covid-19!

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

A propósito de rubricas para aprendizagem

    O conceito anda por aí, no âmbito da avaliação pedagógica.

    Uma familiarização rápida pode ser conseguida através deste contributo explicativo e exemplificativo do professor Carlos Pinheiro:
       
Excerto do Webinar dinamizado pelo professor Carlos Pinheiro

    Na sequência da bibliografia citada, e apoiando-me na folha de trabalho proposta pelo Professor Domingos Fernandes (projeto de Formação MAIA), destacaria os seguintes segmentos:

Excerto da folha formativa "Rubricas de Avaliação" (pág. 3) - I
(Domingos Fernandes - Projeto de Monitorização, Acompanhamento e Investigação em Avaliação Pedagógica)

Excerto da folha formativa "Rubricas de Avaliação" (pág. 6) - II
(Domingos Fernandes - Projeto de Monitorização, Acompanhamento e Investigação em Avaliação Pedagógica)

    Creio serem bem esclarecedores quanto ao trabalho que se pretende no âmbito da construção de rubricas para aprendizagem, numa abordagem eminentemente formativa da avaliação (sistemática, contínua; focada nos processos e desempenhos em contexto de ação / aprendizagem; implicada e integradora na recolha das qualidades e na atribuição de feedback de qualidade oportuna; orientada para um sentido reflexivo, refletido, crítico aquando do processo de ensino-aprendizagem), ainda que perfeitamente aplicável à sumativa (complementar à formativa; aplicável em momentos de balanço e constatação de pontos de aprendizagem; pontual e pré-determinada; focada nos produtos e resultados, com propósitos classificatórios; síntese final de um percurso de ensino-aprendizagem).
       Aplicáveis tanto à avaliação formativa quanto à sumativa, diria que as rubricas se constituem como dispositivo estratégico, matriz que equaciona, nomeadamente, as relações que a natureza formativa e sumativa da avaliação constroem no ensino-aprendizagem:

Complementaridades avaliativas

       A propósito dos conceitos de feedup, feedback e feedforward, leia-se as páginas 16-17 do artigo "Des)Encontros e (Re)Aprendizagens (à distância de um clique, com toque humano)".
      No reajustamento dos conceitos e na exploração de redes, relações entre termos, as rubricas de aprendizagem refletem a descrição do ensino-aprendizagem (por referência a um conjunto de tarefas), podem ser aplicadas a uma diversidade de tarefas (enquanto matriz aplicável a múltiplas tarefas), apoiam a aprendizagem (pela clarificação do que se espera do aluno), bem como os alunos na sua autoavaliação (fundamentada). 

       A construção de rubricas é um trabalho exigente, seja na planificação do que se pretende que os alunos aprendam seja na monitorização desse processo de aprendizagem, seja, ainda, pela avaliação constantes que implicam tanto o professor como o aluno.

domingo, 24 de janeiro de 2021

Dia de eleições presidenciais

      Hoje há a possibilidade de desconfinar, para ir votar.

      Aproveitei a saída para arejar, enquanto o sol tímido contrariava o cinzento da manhã.
    Já que não posso aproveitar o momento por muito tempo, ficando a contemplar o mar, vou levá-lo comigo:

Visita ao mar da Granja (Filme VO)

       Inspirado no dia, saíram os versinhos seguintes:

       Toca a ir votar.
       Seis para escolher,
       outro para enganar.
       Cumprido o dever,
       fui visitar o mar.

       Regressado a casa, vou fazer do domingo o "dia do Senhor". Também é preciso descansar.

      Até o S. Pedro parece querer ajudar (não choveu, conforme os últimos dias). A abstenção, temos de a contrariar.

sábado, 23 de janeiro de 2021

Evolução no significado das palavras

       Algumas perderem completamente o significado original ou etimológico...

       Rezam alguns manuais e estudos de língua que algumas palavras, desde a sua origem etimológica até à atualidade, evoluíram em termos de significado por múltiplas razões, ora numa evolução por restrição de sentido ora numa alteração por extensão semântica.
         Apresenta-se, na tabela seguinte, a exemplificação de alguns desses imensos casos:

Exemplificações para a evolução semântica de algumas palavras do Português (VO)

      Agora que estamos em época de eleições presidenciais, eis um outro termo que bem pode figurar na lista proposta: "candidato".

Excerto do programa televisivo "Cuidado com a Língua" (RTP-1)

          É questão de perguntar qual dos sete candidatos pode ser descrito etimologicamente, na base da caracterização proposta.

          ... (isto para não dizer que algumas vão mesmo no sentido oposto).

quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

Dia de muitas perguntas...

     ... e eu a precisar de respostas!

    Eu a entrar na sala, a vê-los sentados e a procurarem o meu olhar; a senti-los em ânsia... à espera do melhor momento. E, mal puderam,...
     - Não vai haver mais aulas?
     - Vamos todos para casa?
     - E o teste vai ser presencial?
     - Agora, o que fazemos? Quando é que recomeçamos?
     - Sempre é verdade?
     - Afinal, fecha ou não fecha? 

     Com tanta interrogação, respondia eu com reforço positivo: 
     - Boa pergunta, sim senhor!
     - Respondo-te já, pode ser?
     - Muito bem! Aguarda.
     - Duas perguntas?!... Estás curioso(a)? Também eu!
    - Ah se eu soubesse o que é a verdade! À Caeiro, diria que a verdade é o sol, mas também há a mentira, que é a noite.
     - Essa vai ser respondida à Ricardo Reis.

     Quando começavam a rir, agradeci-lhes o melhor dos sorrisos que me deram, apesar da máscara.
    Dei-lhes, então, a resposta, dizendo que o ia fazer de forma poética, citando as palavras de Ricardo Reis:

Uns, com os olhos postos no passado,
Veem o que não veem; outros, fitos
Os mesmos olhos no futuro, veem
O que não pode ver-se.

Porque tão longe ir pôr o que está perto —

A segurança nossa? Este é o dia,

Esta é a hora, este o momento, isto

É quem somos, e é tudo.

Perene flui a interminável hora

Que nos confessa nulos. No mesmo hausto

Em que vivemos, morreremos. Colhe

O dia, porque és ele.


28-8-1933

Odes de Ricardo Reis . Fernando Pessoa. (Notas de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) 

Lisboa: Ática, 1946 (imp.1994). 

 - 154

"Colhe / o dia, porque és ele"

      Perguntei-lhes, então, se tinham percebido a resposta. Um disse logo que sim: que não nos devíamos preocupar demasiado com o passado ou com o futuro (um porque já passou, outro porque está por vir). Nada como viver o presente, o que está perto, passo a passo, para não o perdermos.
     Conclusão: para que fazem eles perguntas, se já sabem a resposta. É esta uma estratégia de sobrevivência de todos nós, para não nos deixarmos levar por recordações, memórias nem por ansiedades.

        Nestes tempos, Ricardo Reis, como te percebo (percebemos)!

quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

Atitudes e valores... com conta, peso e medida!

      Quando de avaliação pedagógica se trata, a discussão é grande, porque os tempos (e os conceitos) são outros.

      Vem esta reflexão a propósito da circulação por aí (Facebook, grupos de apoio, grupos de discussão, outros de formação...) do que são os critérios de avaliação e a construção de rubricas de aprendizagem, à luz das mais recentes conceções de avaliação pedagógica.
    Na continuidade da tradição, vão aparecendo, inclusivamente, rubricas específicas para avaliar apenas as atitudes. Caso para dizer, lá se vão os novos (?) contributos, em detrimento de rotinas e de tudo o que o passado ditou e contestou: a manutenção da separação de atitudes / valores / comportamentos relativamente ao conhecimento / saber / domínio cognitivo. Pior ainda quando se quer reverter tudo em termos de quantificação, de número, de nota, de classificação, com ponderação, nomeadamente, para ambos e de forma bem distintiva (entre os 10-50% dos primeiros e os 90-50% do segundo, há de tudo um pouco e para todos os gostos). Há mesmo quem diga que a novidade não vai durar muito e que o tempo provará que isto de juntar atitudes e conhecimentos é "misturar competências". (Enfim!). 
     Substituiria 'misturar' por 'integrar': falar de competências é precisamente considerar conhecimentos, aptidões, ou procedimentos, e atitudes / valores em integração, a que não falta a avaliação contextualizada desta composição integrada.
     Disso mesmo trata o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória - PASEO (homologado pelo Despacho 6478 / 2017, de 26 de junho), quando configura um entrançado para a noção de 'competência':

Slide exibido na Oficina de formação "Projeto de Flexibilidade Curricular: nas dinâmicas da escola e da sala de aula"
(formadores: Maria Gabriela Rodrigues e Vítor Oliveira)

       E lá estão as atitudes/os valores incorporados, num entrecruzamento que define as 'competências' orientadas para a 'ação'. No enquadramento da flexibilidade curricular (Dec.-lei 54 / 2018 - alterado pela Lei 116/2019 - e o Dec.-Lei 55 /2018), não faz, portanto, qualquer sentido isolar um dos elementos da composição.
       Relativamente ao facto de, no seu projeto educativo, uma escola inserir o desenvolvimento e a avaliação de atitudes (que se constituem como dimensão fundamental do desenvolvimento integral da personalidade dos jovens), é possível afirmar que a instituição escolar sempre as considerou, na valorização de umas e na desvalorização de outras, ao definir regras de conduta; propor dinâmicas de grupo; orientar interações de modo formal e estruturado; enquadrar atividades extraletivas; dinamizar atividades ou projetos centrados na área de cidadania e desenvolvimento. Numa dimensão eminentemente formativa, a observação e a avaliação contínuas facultam a informação atualizada, a recolha de dados e a eficácia de decisões tomadas a partir de grelhas de observação, entrevistas, questionários, listas de verificação, entre outros instrumentos. Relevante é o facto de os alunos demonstrarem boas atitudes e/ou as aprenderem, para que contribuam para uma imagem integral positiva em contexto de ação escolar e educativa.
       A este propósito, quando se afirma que toda esta questão é nova (na sequência dos decretos 54 ou 55, já com três anos de aplicação), tendo de ser melhor pensada e com calma, apetece-me lembrar uma brochura intitulada Reorganização Curricular do Ensino Básico - Avaliação das Aprendizagens: Das concepções às práticas (Ministério da Educação - Departamento da Educação Básica, Março 2002, pp. 11-13), na qual já se podia ler, e cito:

"4. A absoluta necessidade de repensar práticas uniformes e pobres de avaliação que não estão de acordo com a actual formulação do currículo nacional. A perspectiva do currículo nacional associa a competência a um "saber em uso" que se desenvolve em relação com a vivência de experiências de aprendizagem significativas e adequadas e que, ao mesmo tempo, integra conhecimentos, capacidades, atitudes e valores. Neste sentido, a competência não se identifica com um "comportamento" que se treina e manifesta num momento preciso e num tipo específico e pré-determinado de situações, que supostamente estaria ou não "adquirido". Esta perspectiva implica que a avaliação do desenvolvimento de competências tem que basear-se na observação do que aluno faz (e da sua evolução) em diferentes momentos e em diversos contextos, assim como em situações que, pela sua própria natureza, apelem ao recurso integrado a conhecimentos, capacidades e atitudes."

     Este é o quarto ponto (precisamente de uma sequência de quatro: 1 - ênfase no carácter formativo da avaliação; 2 - afirmação da lógica de ciclo; 3- importância da autoavaliação regulada; 4 - repensar práticas, integrando conhecimentos, capacidades e atitudes) estruturante para o enquadramento normativo do Despacho nº 30 /2001 (avaliação do ensino básico). Sublinho: 2001 e "recurso integrado a conhecimentos, capacidades e atitudes". Passados vinte anos, o texto e o propósito não são muito diferentes, orientando-se, agora, para um paradigma de competências, que volta a sublinhar a integração das atitudes / valores / comportamentos a par de conhecimentos e de procedimentos. Ainda assim, muita gente sente ser ainda uma novidade, para pensar e considerar com calma.
      Inquietante, ainda, é voltar à constatação de que, não obstante o princípio orientador da integração e do entrecruzamento do PASEO, há quem esteja a trabalhar nos moldes da separação e mesmo focado na quantificação, no peso e na classificação. Volta-se ao primado da avaliação positivista, da avaliação como medida, como nota, como orientação primordial e absoluta. E a tudo isto se parece reduzir a avaliação: a classificação. Aliás, muita discussão centra-se e reduz-se a esta racionalidade pretensamente objetiva, numérica e de aplicação igual a todos, nomeadamente com o peso que tem de ser atribuído (se 10, se 20, se 30 ou até 50% da nota final). Perde-se o sentido formativo, a observação sistemática, a realidade contingencial e contextual, o processo de aprendizagem.
    Assim, ler o PASEO é apontar para uma orientação distinta: a da avaliação pedagógica, no predomínio e na sistematicidade da avaliação formativa, focada nas aprendizagens e na interação social necessária à formulação de um feedback oportuno e de qualidade, na integração dos conhecimentos, procedimentos e atitudes e valores, com avaliação recorrente das etapas dos processos e não tanto dos produtos.
       Ainda na sequência deste raciocínio, e para que não o acusem de ser teórico, vão as palavras de um professor que, muito certeiramente, põe o dedo na "ferida". Cito:

Segmento de uma comunicação sobre avaliação pedagógica (Luís Timóteo Ferreira)

      Assim o afirma Luís Timóteo Ferreira, num artigo que pode ser consultado a partir do título “Refletir sobre a prática: o problema da avaliação nos 2º e 3 ciclos”. conferência proferida no Sindicato dos Professores da Madeira (SPM), no âmbito do Encontro Autonomia e Flexibilidade Curricular – Virtudes e Fragilidades (Funchal, 23-24 de novembro de 2018). Subscrevo a posição, alargando-a ao nível de ensino secundário.
       Situo a questão das atitudes e dos valores no nível das transversalidades da ação escolar e educativa. Nelas encontram-se configurados princípios relacionados com a cidadania, bem como o trabalho (nomeadamente, iniciativa, responsabilidade, integridade, autonomia), a comunicação (trato e adequação), mais a utilização das tecnologias de comunicação e informação (respeito, tratamento, sentido crítico). Todos eles se relacionam, por implicação ou demonstração consecutiva, com conhecimentos e procedimentos - pelo que a integração é inevitável.
        Na correlação das atitudes com emoções, cognições e comportamentos (conforme a apresenta Gonzalo Maicas, em "Actitudes" in Sociologia y psicologia social de la educación, Madrid, Ediciones Anaya, 1986, pp. 152-179), trata-se de mais um contributo para a discussão genérica do pensamento pedagógico reformador do século XX e da Escola Nova, não obstante as diferenças das várias correntes pedagógicas entretanto surgidas: a articulação e interdependência das capacidades intelectuais, emocionais, sociais e manuais, nessa visão do desenvolvimento integral e da autonomia da criança. Processos cognitivos e afetivos entrecruzam-se em influência mútua - linha de investigação que se funda desde os contributos de Vygotsky (1998) nos anos 20 do século XX. Uma das ideias fundamentais deste psicólogo russo, plasmada no conceito de zona de desenvolvimento proximal, é a de que relações concretas entre pessoas estão associadas ao desenvolvimento das funções superiores, tornando‑se, portanto, fundamentais as atitudes de ajuda e apoio exercidas pelo professor. Recentes investigações no campo das neurociências têm vindo a sublinhar como emoções, sentimentos e consciência não são estranhos nem separados; sentimentos e emoções assumem um forte impacto na mente, podendo dizer‑se que constituem as raízes da consciência - assim o lembra António Damásio, 2000, como o seu O Erro de Descartes. Nesta medida, avaliar aprendizagens implica considerar tanto aspetos intelectuais / cognitivos como emotivos e atitudinais, enquanto duas faces de um mesmo processo: o da(s) aprendizagem(ns).
    Numa folha de trabalho intitulada "Diversificação dos Processos de Recolha de Informação (Fundamentos)", da autoria do Professor Domingos Fernandes e contemplada numa formação de professores relacionada com o Projeto MAIA (Monitorização, Acompanhamento e Investigação em Avaliação Pedagógica), lê-se o seguinte:

     "... as atitudes, os comportamentos em geral, as capacidades e os conhecimentos escolares devem ser considerados aprendizagens inse-paráveis e, como tal, avaliados de forma tão integrada quanto possível.
(destaques da minha responsabilidade)

       A bem da integração, vejo a avaliação das atitudes e valores em relação intrínseca com os conhecimentos e procedimentos que, por um lado, definem a noção de competência e, por outro, revelam a dimensão integral do aluno no(s) processo(s) da(s) aprendizagem(ns). Contemplando, em rubricas de aprendizagem, critérios atitudinais no seio de outros mais focados na dimensão cognitiva, a visão integrada da avaliação constrói-se (sem necessariamente ter de fazer "grelhas" - mais umas quantas - para isso).

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Da imprescindibilidade de um dicionário

        Sou do tempo em que se pedia um, em suporte livro, para cada sala de aula.

    Hoje, basta um computador ou telemóvel para facilmente se ter acesso ao dito material imprescindível para qualquer aula (de língua ou não).
     Direi que, quando falo de ósculos ou amplexos, os alunos julgam que os estou a insultar. E estou a ser tão afetivo! Só não o sou quando sistematicamente usam o verbo 'meter' onde não devem ou dizem para eu esperar 'um bocado'. Nem tanto ao mar nem tanto à terra.

Pintura do poeta Bocage 
no Palacete do Conde de Carcavelos (Braga)
    «Conta-se que Bocage, ao chegar a casa, um certo dia, ouviu um barulho estranho vindo do quintal. Chegando lá, constatou que um ladrão tentava levar os seus patos de criação. 
 Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o a tentar pular o muro com os seus amados patos, disse-lhe:
-Oh, bucéfalo anácrono! Não te interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo... mas, se é para zombares da minha elevada prosopopeia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com a minha bengala fosfórica bem no alto da tua sinagoga, e o farei com tal ímpeto que te reduzirei à quinquagésima potência que o vulgo denomina nada!
    E o ladrão, confuso, diz:
    - Doutor, afinal levo ou deixo os patos?»

      Sinto-me qual ladrão sem saber o que fazer. Não quero roubar ninguém, mas vou tratar de ir à procura de algumas palavras tão eruditas, tão arcaicas e (neo)clássicas.

      Neo..., sim, seja pelo tempo representado em que foram supostamente ditas (na segunda metade do século XVIII) seja por aquele em que podem vir a ser recuperadas. Amplexos!

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Má publicidade! E o defeito não está na cidade.

     É o que dá quando a escrita não acompanha a "qualidade do serviço".

    Em conhecido e popular programa televisivo, é costume os concorrentes ofertarem o apresentador com produtos de marca local. Foi a vez de Espinho aparecer no écran. A prenda de um calendário de parede, dedicado a Fernando Mendes, não deixa parecer "prenda armadilhada", linguisticamente falando:
     
Lembranças com defeito na expressão do tempo (para não falar de outros mais)

   Quando o Salão Vieira já conta com 32 anos, era bom que se escrevesse "há 32 anos", com 'h'. Já passaram mais de três décadas; logo, o tempo passado, a duração e a existência são grafados com ' X tempo'.
    Podia comentar a imagem pelo clube de que não sou adepto; podia opinar sobre um programa de televisão que não aprecio (e dura... qual pilha Duracell); porém, saltou-me aos olhos um tempo que não foi corretamente expresso na grafia.

     Devia haver maior cuidado com as prendas que se dão, quando traduzem o tempo na sua duração.

domingo, 17 de janeiro de 2021

Dúvidas na planificação da gramática

       Tanta coisa há a resolver que, às vezes, escapa a todos o essencial.

     Perguntavam-me há dias algo sobre a planificação de conteúdos gramaticais nas "Aprendizagens Essenciais" do Português, no nível secundário:

      Q: Olá, Vítor! O complemento do advérbio faz parte das Aprendizagens Essenciais (AE)? E o valor temporal? Agradecia que me esclarecesses, por favor, pois achava que não.

    R: Olá. A leitura das Aprendizagens Essenciais, quanto ao domínio da gramática, no ensino do Português do nível secundário, propõe algumas especificidades para cada um dos anos de escolaridade (10º, 11º e 12º anos). Fazendo uma abordagem comparativa dos conteúdos propostos, é possível verificar o conjunto de dados seguinte:

Leitura comparativa do domínio gramatical nas Aprendizagens Essenciais de Português (Secundário)

      Este é o "programa" gramatical referenciado para os três anos de escolaridade do secundário (10º à esquerda; 11º ao meio; 12º à direita).
      Ora, quando no ano terminal deste nível de ensino se lê "Realizar análise sintática com explicitação de funções sintáticas internas à frase, ao grupo verbal, ao grupo nominal, ao grupo adjetival e ao grupo adverbial", uma função sintática interna ao grupo adverbial é precisamente a do complemento do advérbio. Pode mesmo indicar-se que há uma progressão, complexificação neste ponto do domínio, pois, no 11º ano, interessa "Sistematizar o conhecimento dos diferentes constituintes da frase (grupo verbal, grupo nominal, grupo adjetival, grupo preposicional, grupo adverbial) e das funções sintáticas internas à frase" (ao nível superior da frase, portanto), enquanto no 12º o foco se situa ao nível interno dos grupos, para além do da frase. De referir, ainda, que já no 10º ano se prevê o trabalho do complemento do nome e do adjetivo (isto é, funções sintáticas internas ao grupo nominal e adjetival, respetivamente).
        Quanto ao valor temporal (depois da abordagem dos valores modais, no 10º ano, e dos aspetuais no 12º), não se poderá dizer que desapareceu do "programa" (se confrontarmos com o que acontecia nas Metas de Aprendizagem). Trata-se de um conteúdo gramatical que acabará por, implicadamente, ter de ser abordado a propósito dos processos de coesão textual contemplados no 11º e 12º anos (nomeadamente, quando se tem de utilizar / abordar / explicitar a correlação de tempos na construção de enunciados e a localização das situações nestes referidas).
        Uma leitura comparativa mais completa das Aprendizagens Essenciais, iniciadas há dois anos no 10º ano de escolaridade e alargadas ao 12º no presente ano letivo, pode ser encontrada aqui, de acordo com os domínios de aprendizagem considerados no ensino secundário.

       Hoje em dia, a preocupação é capacitar os professores de competências digitais (até se responde a um inquérito que visa diagnosticar os níveis de competência docente nesse domínio). Anuncia-se formação futura para tal, como prioritária; esquece-se que pouco disso vale, quando a formação didática e específica é tida como algo mais do que adquirido, do tipo "o ar que respiramos".

sábado, 16 de janeiro de 2021

O poder da polissemia e da argumentação

       Nunca a polissemia foi tão argumentativa na mensagem institucional.

       Em tempos com números tão assustadores (nos infetados e nas mortes), há palavras que marcam a sua polissemia, na conjugação com a força impactante da imagem:

A disjunção (ou) não pode ser escolha - tem de ser apelo à vida.

     Proveniente do latim (patiens, -entis), o termo 'paciente' admite realização tanto nominal como adjetival. Seja para significar o que se conforma ou resigna, o que tem paciência, o que tranquila e serenamente aguarda, o que persiste, seja para designar o que padece ou se submete a tratamento médico, bom seria que não significasse aquele que vai sofrer a (pena de) morte.
       Há na publicação institucional uma disjunção ('ou') que não pode dar lugar a escolha ou hipótese. Argumentativamente só pode resultar no convencimento, na persuasão, no apelo à vida.

      Por ora,  a realidade é dura. Fica a esperança de que os tempos venham a ser outros, mais tranquilos, mais serenos, sem a doença nem a morte. A impaciência e o receio andam por aí, mas o valor da vida tem de prevalecer. Fique(m) em casa.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

A melhor resposta

        Na sequência, não de uma pergunta, mas de um comentário torpe, ignóbil.

     Depois de um candidato a presidente da República ter comentado sobre os "lábios muito vermelhos" (de forma insultuosa e insidiosa) de uma também candidata à presidência, a melhor resposta foi dada por um jovem:

Uma imagem que vale por si só contra a falta de tudo de um candidato a presidente da República

      Pintando os lábios de um vermelho bem vivo, assumiu solidariedade para com as mulheres que se sentiram, e bem, ultrajadas pelo comentário indecoroso, falocrata, absurdo; afirmou a inclusão, mostrando que esses mesmos lábios não separam homem de mulher, independentemente da cor (por vermelho que seja); revelou que é bem melhor um homem de lábios pintados de vermelho do que humanos que mais parecem ovelhas negras runhosas.
       Melhor (a bem das ovelhas, tão mais preferíveis e inofensivas face a tais humanos, tão sórdidos e vis): uma resposta à altura de quem é grande, quando tem de se confrontar com a pequenez de espírito, de educação e de humanidade. 
       Encaremos a questão no seu absurdo: houve, há sempre alguém que tem gostado de ouvir burros ou asnos a (a)zurrar, ornear, ornejar, rebusnar... tudo palavras lindas aos ouvidos dos prosélitos.

       Há limites, mesmo para quem, como eu, sou mais azul! Viva o vermelho! (Cada vez mais se vive o sentido de se votar pela democracia, contra discursos e comentários próprios de visões de índole facciosa, cínica e autocrática).
         

quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

Depois do confinamento, o confinamento.

      Passa o tempo. O que muda?

      Mudaram os dias, as semanas, os meses e o ano. Mudou o clima. Como diria Camões, "Todo o mundo é composto de mudança".
      Passado o confinamento geral anterior, vem aí o confinamento, de novo. Dizem que é geral, mas até o sentido do 'geral' mudou. O certo é que também mudou (para muitos mais) o número de infetados, de internados, de mortos. Parece é que não mudou o comportamento inconsciente de algumas pessoas, das que promovem e insistem em celebrações, festas, ajuntamentos e proximidades impensáveis.
    Até ao final do mês (por ora), voltamos a um mesmo que não é bem o mesmo; permanecem a preocupação, o distanciamento, o isolamento, o receio, a angústia. 
      Apetece já a mudança, que não pode acontecer.
      Por isso...

Estratégias de sobrevivência 

       Digamos que a perspetiva é já outra. Vamos em frente, com a esperança de que é possível fazer melhor, para todos nós.

      Aproveita, Snoopy, enquanto não te mandam para dentro da casota!

quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Sem semelhança; com propósito.

       Quando e onde menos espero, está o erro a olhar para mim!

       Há que seguir alguns cuidados, nomeadamente nos tempos que correm (tão exigentes para a nossa segurança). Outros farão parte do dia-a-dia comum, ainda que haja a necessidade de os lembrar, nalgumas circunstâncias. 
       Quando num local público encontras um destes avisos (escusado, diria, pelo que nele se lembra), apetece corrigi-lo, de imediato, pela forma como está escrito:

Um aviso a seguir, exceto nos erros que apresenta (Foto VO)

      Já não bastava a falta de um acento em "PAPÉIS" e de uma vírgula depois de "SANITA", vem-me aquele 'afim' a todo o despropósito.
       A intenção (ou o propósito, a finalidade) traduz-se com a expressão "A FIM DE", sinónima de 'para (que)', 'com o objetivo / intuito / propósito de' ou 'com a finalidade / intenção de'.
    Confundir 'afim' (sinónimo de 'semelhante', 'igual') com 'a fim de', para lá da aproximação homofónica dos termos, resulta de um desconhecimento assente na falta de leitura, na redução lexical e no recurso a um vocabulário que, não caído em desuso, já não tem reconhecimento gráfico capaz de distinguir realidades de significado bem diferenciadas.
       Assim, uma coisa é dizer que 'X é afim de Y' (com X e Y a serem iguais ou semelhantes); outra bem distinta é 'X estar a fim de Y' (com X a querer / desejar fazer Y).

    Espero, portanto, que, depois do aviso, não entupam a sanita, a fim de não dar trabalho desnecessário à gerência; mas, a fim de escrever bem, é preciso não confundir palavras / expressões bem distintas.
 

terça-feira, 12 de janeiro de 2021

Cores quentes

     Quando o frio é mais que muito!

     E nem se pode dizer que seja inverno rigoroso, a julgar pelo que acontece na vizinha Espanha. Lembro-me das filas de trânsito, há dois anos, nas seis faixas da autoestrada à entrada de Madrid. Hoje noticiava-se que a capital espanhola tinha apenas uma para transitar, já que as restantes estavam cobertas de neve, com uma altura de três metros.
   Dizem que são efeitos do frio polar chamado "Filomena". Há que ligar aquecedores e ares condicionados para que tudo fique bem mais quentinho. Já não me lembrava de fazer isto há coisa de três invernos.
      Hoje, apesar da estação, as cores do pôr do sol eram quentes, de tão luminoso este se mostrava:

Pôr do sol em cor quente quando o tempo é de frio (Foto VO)

      Quentes, só as cores, porque a aragem fria, surgida a partir das cinco da tarde, fazia-se sentir cortante na pele.

      Até as máscaras, por causa do Covid-19, se tornam agradáveis, para proteger da inalação do ar frio. Vai-te embora, Filomena!

domingo, 10 de janeiro de 2021

Outra vez! Não!

      Prestes a terminar o domingo, lá vem o trauma.

     Por antecipação, começa o stress.
     Pior ainda quando se encontra uma mensagem destas:

A vontade do mundo ao contrário

    O melhor da imagem é mesmo o gato!
    O pensamento é arrepiante, no conteúdo e na forma (segunda-feira sem hífen e ninguém sem acento). Valha-me Deus!

     Por que razão a segunda-feira está tão distante da sexta?! Ai, era bom começar a semana à sexta!

sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

Rubricas de (avaliação para) aprendizagem : domínio da oralidade (produção oral formal)

       Fica a sugestão de um trabalho para a avaliação da oralidade (produção oral).

     Vem este apontamento a propósito da preparação de uma atividade de oralidade (produção oral formal), na disciplina de Português (nível secundário), planificada segundo a matriz de uma rubrica de aprendizagem. Contempla esta última: (i) indicação da tarefa; (ii) condições de operacionalização; (iii) critérios de sucesso a considerar; (iv) associação dos critérios a descritores e níveis de desempenho; (v) práticas de auto e heteroavaliação. 
      Perante o propósito de levar uma turma de 12º ano a produzir um discurso autónomo, completo, planificado e estruturado para um público (ainda que familiar), orienta-se a tarefa para um projeto de trabalho assente em pensamentos do semi-heterónimo pessoano e, na base do Livro do Desassossego, na formulação de um posicionamento concordante ou discordante sobre um pensamento / uma frase de Bernardo Soares. Em vez de se indicar mais um livro, para além das obras já propostas no programa, propõe-se que cada aluno se posicione face a um pensamento selecionado, relacionando-o com a vida, a leitura, a arte, os conhecimentos do mundo, entre outros. 
     Ainda que no cruzamento de vários domínios (nomeadamente, a leitura e educação literária e, eventualmente, a escrita), sai destacado o da oralidade, cujo processo de recolha de informação estará centrado na própria produção oral (a ser observada por professores e alunos).

     Planificação de uma rubrica de avaliação para aprendizagem na oralidade

     Explicitada a tarefa (pela sua instrução), os passos e as condições da sua operacionalização, encaminha-se a turma para a definição dos critérios específicos da atividade, enquadrados pelos que dizem respeito às Aprendizagens Essenciais do Perfil à Saída da Escolaridade Obrigatória (PASEO).

Critérios e níveis de desempenho associados ao domínio da oralidade (formal), 
a partir das Aprendizagens Essenciais do PASEO

       Dado estarem já considerados níveis globais de desempenho (N1 a N4), segundo decisão do agrupamento escolar, aplicam-se estes últimos aos critérios específicos associados à tarefa, configurados em descritores que permitem ora preparar desempenhos mediante o explicitado (no âmbito das expectativas) ora proceder à avaliação do processo segundo esses mesmos (no âmbito da consecução), sem fechar um cenário de negociação / reformulação de algum aspeto, à medida que a atividade decorre.

Critérios específicos para a rubrica construída 
(com descritores e níveis de desempenho)

     Planificada e estabilizada a rubrica (instrução, procedimentos no processo, critérios e níveis de desempenho), podem os alunos orientar-se progressivamente na concretização das etapas que conduzirão à produção / expressão oral frente à turma.
      Na consciência e na transparência da avaliação a fazer, podem os discentes, a todo o momento, ser confrontados com o caminho feito e o planificado, mais os critérios considerados. Com ou sem ajustamento destes últimos, a mensagem de que a produção oral será avaliada em função deles é sempre a oportunidade de exemplificar o que deve ou não fazer-se nesse momento. Será também a ocasião para a negociação de alguma reformulação e, mesmo, a preparação do que virá a ser a auto e heteroavaliação, funda(menta)da nos critérios / descritores / níveis de desempenho definidos.
      A rubrica aqui desenhada tende, naturalmente, para uma conceção de avaliação pedagógica orientada para a aprendizagem, pelo que ela tem de explicitação da tarefa e do que esta implica, em termos de conhecimentos, procedimentos e atitudes / valores previstos ou planificados. A etapa final, na súmula do processo levado a cabo e do produto apresentado, constituirá um momento de registo mais focado em indicadores precisos, dados decorrentes dos critérios, a que não escapa também a consideração de atitudes e valores - desde logo os que decorrem do cumprimento ou não da tarefa (com os passos intermédios e/ou finais); da atenção e da persistência no tratamento informativo; da adequação ou não do discurso; da disponibilidade e da colaboração para com o auditório; da autonomia maior ou menor face ao processo produzido e/ou face a outros suportes; do respeito pelo tempo destinado ao trabalho e/ou pelo auditório para o qual se discursa. A integração é natural na avaliação pedagógica, em suma.

       E sublinho o sentido da palavra 'avaliação'. Quanto à classificação final, o assunto é já outro - mais focado no produto, nos indicadores colhidos no momento da execução / produção oral, numa quantificação, nota que não deverá deixar de contemplar as diferentes etapas associadas à tarefa.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

Dia de Reis no século passado e no presente

     Depois do Natal e da passagem de ano, chega a vez do Dia de Reis.

    Já lá vai o tempo em que a festividade dos reis ficava abrangida pela pausa letiva (e ninguém ficou traumatizado ou aprendeu menos por isso). Hoje, é na vizinha Espanha que se dá importância aos ditos, com a troca de prendas natalícias precisamente na passagem da véspera para o dia de hoje. Faz sentido, atendendo ao facto de os três reis magos - Belchior, Gaspar e Baltazar - também terem levado, ofertado ao menino ouro, incenso e mirra.
     Há mais de um século, outros reis ofereceram ao menino "Futuro" a Democracia, o Socialismo e até mesmo o Niilismo. Trata-se de uma ilustração de Rafael Bordalo Pinheiro, publicada no jornal A Paródia, à data de 7 de janeiro de 1904.

Os Reis (e os presentes), ilustração de Rafael Bordalo Pinheiro (1904)

   Numa alusão aos Reis Magos, Bordalo Pinheiro recriou o episódio do Novo Testamento, num paralelismo com os monarcas da Europa do início do século passado. Montando camelos, vão adorar o "Futuro". Levam-lhe 'ismos' de cariz muito ideológico: o rei de Inglaterra (Eduardo VII) leva o socialismo e a democracia; o czar da Rússia (Nicolau II), o neocristianismo e o niilismo; Francisco José da Áustria, o socialismo; o Kaiser Guilherme II da Alemanha, a social-democracia; o rei de Itália (Vítor Manuel III), o anarquismo e o socialismo; Afonso XIII de Espanha, o cantonalismo e o iberismo; o rei sueco, o separatismo. 
   Um não é soberano: o presidente francês (Loubet).  Oferece o cosmopolitismo e o socialismo. Digamos que, na procissão, este era um a fazer alguma diferença.
     Hoje, a diferença talvez residisse numa dádiva mais comestível:

Os três reis magos e o outro, que não é mag(r)o - tradução e adaptação VO

     Há reis que sabem aproveitar a oportunidade! 

    Não sei se o Futuro ficou bem servido com estes reis (mais um presidente). Hoje diria que o monarca maior seria aquele que presenteasse a atualidade com mais humanismo, sentido de justiça e saúde.

sábado, 2 de janeiro de 2021

Das primeiras do ano

     Começa o ano com o frio polar da manhã e da noite.

     O sol brilha, aquece o que pode ao final da manhã e início da tarde. 
   A Natureza agradece, depois da chuva dos dias anteriores, nela germinando já algumas pequenas, viçosas e coloridas flores entre o verde refrescado que cobre o chão.
     Também a árvore despida do lugar se dá a ver mais radiosa na sua ramificação:

A árvore do lugar que dizem ser de vale bom (Foto VO)

       Não é pinheiro, mas lembra ainda o Natal, decorada que está de brancas nuvens, azulado céu, fluido rio, frondoso arvoredo na outra margem, mais a luminosa estrela a irradiar a energia e o calor desejados.
     Chegará a sombria frialdade, temporizada nas passadas contadas ao segundo nesse caminho de regresso, contrário a uma seta que, no chão, dá rumo e sentido(s) para a foz e para o mar.

       Nesta margem, a árvore ficará mais escura e transida num entardecer que rapidamente arrefece.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

"Não há guitarras nem cantar de amigo..."

      Não começa da melhor forma o ano, para a música portuguesa (e do mundo).

    Anunciada a morte de Carlos do Carmo, não se pode dizer que seja uma surpresa, dada toda a preparação da despedida artística em novembro passado, em concertos no Porto e em Lisboa. Feito o agradecimento público a quem o acompanhou como cantor, chegava o tempo de um afastamento e uma preparação para a hora que hoje se cumpriu. 58 anos de carreira sóbria, rigorosa e consolidada; 81 de idade são sinais de um percurso humano cuja previsibilidade pode ser confirmada, mas nunca desejada.
    Dizem que foi o renovador do fado. Fosse este último interpretado mais ou menos como canção, teve sempre a sonoridade rítmica, vocal e instrumental típica que identificou Carlos do Carmo como fadista de renome. Também com a sua ação persistente, em muito contribuiu para que o fado conquistasse a categoria de Património Cultural e Imaterial da Humanidade pela UNESCO (numa declaração aprovada em novembro de 2011, no VI Comité Intergovernamental, em Bali, na Indonésia).
    Aqui fica um registo do que foram as minhas primeiras memórias para esse grande intérprete nacional (e não só). Foi a experiência de um Festival da Canção Português, todo cantado por Carlos do Carmo. Algumas das cantigas concorrentes, não tendo vencido, acabaram por se tornar músicas para todo o tempo, em várias versões (o caso de "No Teu Poema", "Estrela da Tarde"). A vencedora, "Uma Flor de Verde Pinho", contava com a participação de Manuel Alegre (autor da letra) e José Niza (composição musical), versando já sentidos, símbolos e referências da cultura, história e literatura portuguesas (com as "flores de verde pino", de D. Dinis; os amores de Pedro e Inês; o "fogo amor" camoniano; o mar da diáspora nacional):

Versão de "Uma Flor de Verde Pinho" (no Festival RTP da Canção)

UMA FLOR DE VERDE PINHO

Eu podia chamar-te pátria minha 
Dar-te o mais lindo nome português 
Podia dar-te um nome de rainha 
Que este amor é de Pedro por Inês. 

Mas não há forma não há verso não há leito 
Para este fogo amor para este rio. 
Como dizer um coração fora do peito? 
Meu amor transbordou. E eu sem navio. 

Gostar de ti é um poema que não digo 
Que não há taça amor para este vinho 
Não há guitarras nem cantar de amigo 
Não há flor, não há flor de verde pinho. 

Não há barco nem trigo, não há trevo 
Não há palavras para dizer esta canção. 
Gostar de ti é um poema que não escrevo. 
Que há um rio sem leito. E eu sem coração.

       Assim se representou Portugal na Eurovisão, em Haia (Holanda), em 1976:

      Versão de "Uma Flor de Verde Pinho" (no Festival da Eurovisão, em Haia)

     Recentemente galardoado com o Grammy Latino de Carreira (2014), a Rádio Comercial prestou-lhe uma merecidíssima homenagem, convocando várias vozes nacionais de diferentes gerações para cantar um dos seus fados mais populares, dedicado à cidade que o viu nascer e morrer: "Lisboa, menina e moça".

      Homenagem a Carlos do Carmo (numa feliz iniciativa da Rádio Comercial)

     À hora da morte, sublinhados os valores profissionais e humanos, fica o sentido de uma grande perda coletiva perante um caminho artístico e humano bem cumpridos e largamente reconhecidos.