sexta-feira, 29 de abril de 2022

Dia Internacional / Mundial da Dança

      Entre os muitos que a consideram como a 4ª arte, para outros é a 6ª.

    Para lá da sequenciação numérica, importa que a dança é uma das expressões da humanidade a conjugar movimentação do corpo com ritmo, num compasso motivado de tempo e espaço. Entre impulsos nervosos e musculares, expressam-se sentimentos; anima-se o espírito, através de passos e gestos, num casamento musical que chega muitas vezes à dimensão da arte.
       É neste âmbito, geral, que o Dia Internacional ou Mundial da Dança é celebrado, há quarenta anos, neste dia, numa data criada pelo Comité Internacional da Dança (CID) da UNESCO, a propósito do nascimento de Jean-Georges Noverre - um dos grandes nomes mundiais da dança nascido em 1727.
 apelando a uma configuração da dança onde também cabem as que dão a imagem cultural de um povo,      Com as suas marcas mais ou menos codificadas em géneros diversificados e recorrentemente combinados (rituais e religiosos, mundanos e populares, guerreiros e de paz, de espetáculo), há danças para cobrir uma grande diversidade de situações - das danças da chuva às da sedução, bem como às do festejo dos eventos humanos,  numa universalidade de causas a todo o tempo convocadas. Desde logo, as do espírito,  as da alma da da busca de poder(es) que, na origem, também evocam o espetáculo, a dimensão do apelo e do mistério sagrado (seja este mais natural seja ele mais associado a entidades mais abstratas). 
     Do sapateado, volteio, balanço, genuflexão, contorção de peito e de cabeça, há uma linguagem, uma gramática da dança que não é estranha à expressão da vida (mesmo quando esta se compõe, também, pelo fim de ciclos).
     Na consciência da passagem do tempo, figuram aqui algumas sonoridades e passos de dança que nos acompanha(ra)m nas últimas décadas:

Estilos de dança contemporâneos ao som de músicas deste e do passado século.

      O escritor e teórico da arte francês oitocentista Charles Baudelaire, afirmou que "A dança consegue revelar tudo o que a música esconde misteriosamente, tendo mais mérito de ser humana e palpável. A dança é poesia com braços e pernas, é a matéria, graciosa e terrível, animada, embelezada pelo movimento". Se a literatura, nas suas origens, tem a expressão poética combinada com a música, desta à dança pouco falta - que o digam as bailias ou bailadas das cantigas de amigo trovadorescas.
       Claro que interessa "Dançar conforme a música" e descobrir que / se "Bem dança a quem a fortuna canta / a quem a fortuna faz som". E se há quem acrescente "Quem pode toca, quem não pode dança" ou "Como se toca, assim se dança", é de constatar que se está perante expressões ou enunciados paremiológicos a traduzir bem esta nossa" dança da vida".

       Numa variação ao "Quem canta seus males espanta", hoje recrio o provérbio "Quem dança muitos bens alcança" - o da animação e o de uma libertação salutar que sejam. 

quarta-feira, 27 de abril de 2022

Ainda o 25 de abril

      Diz-se "Em Análise".

      Pensando bem, talvez não estivesse longe da verdade (não a histórica, por certo):

Reescrita da História ou uma sílaba para um entendimento novo da revolução? (Foto AMT)

      A sílaba faz a diferença. A revolução é a dos cravos.
      A liberdade anunciou-se depois de décadas de ditadura - sim, um regime que se impôs e representou uma forma de escravatura. Portanto, entre cravos e escravos, ficam o símbolo e a metáfora: o da flor da libertação e da revolução; a da condição das vítimas que, na perseguição e na luta por direitos, viviam presas à ideologia fascista de então.

     Uma legenda que até faz sentido, não obstante a reação da intérprete da língua gestual (que, no exercício da tradução, até parece apanhada pela surpresa da legenda).

terça-feira, 26 de abril de 2022

Gestos simples para grandes causas

       Assim se evocam e marcam os dias.

      Ontem celebrou-se o 25 de abril. O dia seguinte, o de hoje, começou com poesia à porta: Zeca Afonso, Jorge de Sena.

Da poesia ao canto, afixados à porta (Foto VO)

      Prosseguiu-se, à hora de almoço, com a voz: ouvir poesia dita a um público atento, partilhando os valores da liberdade que se vivenciam e testemunham na causa pública que (n)os une. Foi o momento de Sophia, de Torga e de quem fez do verso base de expressão para um ideal lutado, conquistado e reafirmado.
     No regresso ao trabalho, na minha secretária, dois cravos vermelhos e uma pequena nota, em caligrafia cuidada, fizeram-me sorrir, libertaram-me de algumas tensões do dia; fizeram acreditar que vale a pena acreditar, apostar e correr o caminho da esperança e pelo bem que se traz à vida.
   Impõe-se agradecer a quem fez do 26 de abril continuação da celebração: ao 11º E pela presença, pela poesia e pela voz; à Joana Rocha e à Leonor Oliveira, do 11º L, pela procura, pela oferta e pelas flores verdes rubras; às professoras que fizeram recordar a liberdade de ontem como herança de hoje (a todo o tempo retomado), pelo exemplo e pelo empenho testemunhados. 
    Assim se revê e se (re)vê História e histórias que importa ter presente(s).

       Abril é para todos os dias que o Homem queira ver celebrado com as cores da liberdade.

segunda-feira, 25 de abril de 2022

Espírito novo (apesar do cinza)

     Há dias para tudo, nomeadamente para recriar versos (que já tiveram reversos).

     Com maior ou menor esperança, as palavras espelham um estado de espírito que, ora fechado, ora aberto, nem sempre traduz o que é celebrado. Valha o dia de sol claro, limpo, a convidar à festa da liberdade, da vida e, de novo, com esperança.

            ACINZENTADA MEMÓRIA

Monumento ao 25 de abril, Espinho (Foto VO)
Do cravo em pedra,
sem a rubra cor,
apagou-se o sangue,
secou o vigor?

Da revolução,
a memória fica,
lembrando a canção...,
o povo que grita...,

a arma a dar flor...
Renovado o tempo,
nascida a manhã,
no sopro do vento,

a sã liberdade
vive-se na cidade.

Em dia cinzento,
vejo um monumento:
voam as gaivotas
só no pensamento.

No duro betão,
há ondas de mar
plantadas no chão,
subidas ao ar.

Qual fénix em cinzas,
Esperança, vinhas...
Fica. A vida alindas.

     Hoje, mais do que a liberdade do dia, importa a esperança de sempre.

     Chamo-a, porque a caixa de Pandora não pode manter-se fechada.

sexta-feira, 22 de abril de 2022

Em vésperas do dia da liberdade

      Hoje foi dia para todos se mostrarem mais bonitos.

     Entre os que hesitaram e os que assumiram a ação libertadora, ficou a nota de que, após deliberação governamental e homologação presidencial, a partir de hoje, já não é obrigatório o uso de máscara nos estabelecimentos de ensino (https://dre.pt/dre/detalhe/decreto-lei/30-e-2022-182432341), segundo o decreto-lei publicado ontem em Diário da República.
    Desta forma, ficaram atestadas condições para se dispensar o uso de máscara no interior dos espaços escolares, não obstante a atenção e os cuidados que ainda interessa garantir face à persistência de algumas condições de infeção (agora consideradas reguláveis, bem diferentes das que vitimizaram muitos daqueles que sofreram o que alguém chamou de "uma gripezinha", em tempos que não o era).
    Têm sido crescentes os sinais de libertação, felizmente! O de hoje foi mais um para a ansiada retoma de uma normalidade a todo o tempo sujeita a avaliação e com a concessão geral que deve pautar comportamentos. Dois anos saturantes, limitadores, em que só os olhos revelavam emoções, passaram a dar lugar a rostos descobertos, ao reconhecimento do que Camões outrora chamou 'gesto' (doce e humilde). Que, hoje, os gestos (temporal e semanticamente distintos) sejam comedidos, para que os rostos se mantenham literalmente "desmascarados".
       Assim se recriou Banksy, a partir do que hoje se vive:

Banksy recriado (do coração desejado à máscara mal-amada)

      Deixá-la voar, essa máscara que não trouxe cor à vida - garantiu-a, é certo, salvaguardando todos de situações bem mais críticas. Que não seja ela o coração original que a menina parece querer agarrar. Bom seria que não retrocedêssemos! Saibamos reconquistar o bem perdido, sem comprometer cuidados que ainda se impõem.

      Possa ser este o passo, o gesto que nos traga alguma sanidade, com liberdade aliada a responsabilidade. Assim o rosto se mostre livre.

domingo, 17 de abril de 2022

Um grande ovo de Páscoa cracoviano

       Sucedem-se as Páscoas, ano após ano, e os ovos.

      Entre as várias explicações para o ovo e para o coelhinho da Páscoa (que não "foi com o Pai Natal, no comboio ao circo"), a multiplicidade dá para todos os gostos - os mais religiosos, tradicionais, simbólicos, culturais, regionais e até os mais fantasiosos.
       Encontrei uns bem artísticos em Cracóvia, no conhecido Mercado de Páscoa, realizado anualmente na praça central da Cidade Velha, Rynek Główny (praça principal de Kraków). Em cerca de dez dias, as festividades da Semana Santa concretizam-se na exposição de ovos gigantes decorados e na confeção das tradicionais "palms" artesanais de flores e plantas secas, para serem abençoadas no Domingo de Ramos - informações colhidas e vividas em memórias de viagens bem passadas. O colorido da praça é festivo. Os ovos, dispostos em vários pontos da praça, são atração visual assegurada, numa composição e num enfeite de versatilidade cromática notáveis.

Um ovo cracoviano à altura de um ser humano (Foto VO)

      A presença do ovo, desde a Antiguidade persa, traz consigo a perceção do símbolo do renascimento. De regiões como a Ucrânia (muito antes da chegada do cristianismo) ou a China, vem a leitura do alimento e da origem da vida - e, por extensão, da criação do mundo - até à comemoração do fim do inverno. Daí o entendimento do "Páscoa" como "passagem".
       Dos ovos de galinha (cozidos) pintados à mão (que persistem) aos de chocolate (mais recentes e comerciais), muitos séculos aprimoraram o que pôde ter sido a celebração de uma passagem mais familiar e doméstica até se chegar aos requintes da doçaria e pastelaria francesas, sem esquecer que Eduardo I de Inglaterra banhava ovos em ouro para presentear os seus súbditos favoritos - uma espécie de inspiração para o que Peter Carl Fabergé viria a produzir com os valiosíssimos Ovos Fabergé.
      Numa perspetiva mais literária, sustentada no que o escrito e um trabalho humanista permite ver, dir-se-ia que a origem panteísta dos credos é aquela que se funda e remete para um passado quando podiam ser vistos, nos campos, em época primaveril, muitos coelhos e lebres. Um mito popular referenciado pelo alemão Georg Franck von Franckenau, no século XVII (cerca de 1670), na obra Disputatione Ordinaria Disquirens de Ovis Paschalibus, ganha dimensão criativa e literária ao ser traduzido, na escrita, pela figura de uma Lebre de Páscoa, a trazer prendas para os mais novos que melhor se comportaram. Da Alemanha para o Reino Unido e daqui para os Estados Unidos, dissemina-se um universo entendível à libertação das agruras do inverno, à passagem e aos ritos primaveris, numa acomodação ética e moral conjugada com a ressurreição da natureza. A isto mesmo o cristianismo se havia já ajustado, numa visão libertadora e configuradora de outras passagens (histórico-filosóficas, éticas e religiosas).

       E com mais esta curiosidade, passemos a um novo ciclo: o da primavera que chegou e prepara a vinda do verão. Pelo menos, com a mudança da hora, os dias parecem mais alegres e luminosos (ou luminosos e alegres). Por ora, uma boa Páscoa para todos.

sábado, 16 de abril de 2022

Outras cores no olhar

      A bem do que não se diz.

   Quando me disseram que o mar e o céu eram azuis acreditei. Acrescentavam, ainda, que era azul ora marinho oa celeste. Gostei da cor e do que ela inspira(va): tranquilidade, serenidade, harmonia, espiritualidade. 
     A vida, contudo, lembra-nos que o verso tem o seu reverso. E, nessa medida, o azul também se deu a ver na monotonia, depressão, frieza. Ficou tão próximo do mal, da doença, do fim e da morte que fui à procura de uma paleta e do que esta tinha para me dar em alternativa.
     Busquei, então, novas cores. Descobri-as no olhar e nos matizes que pude contemplar:

Um universo de ouro e prata onde mar e céu ficaram sem azul (Foto VO)

       Encontrei uma bola de luz bem intensa na claridade, um mar brilhante feito de prata e um céu que se firmou de amarelo, laranja e ouro. Na variedade colorida, reparei no que é marinho e celeste sem azul. No momento, nesse instante apreciável dado a ver, tive um mar nos tons da sabedoria divina, enquanto o ouro do amor divino se mostrava para lá, logo acima do horizonte. Um céu de fogo e um oceano de água - dois exatos opostos - complementam-se no quadro natural da vida, evocando sabedoria e amor.
       Pode ter sido este um momento, já familiar a outros também vividos. Fica, por isso, a nota de que há instantes em que os opostos têm sempre a possibilidade de se emparelhar, de se enquadrar - tal como a prata, na representação da lua e do princípio feminino (lunar, passivo e branco), se ajusta ao ouro (por sua vez solar, ativo e amarelo), do princípio masculino. Eis, em suma, a riqueza da diversidade complementar.

     A bem do que se viu e do que possa ser a possibilidade da esperança; o princípio da aproximação, do complemento e da conciliação dos opostos (porque há guerras que não trazem felicidade a ninguém, eventualmente só para aqueles que momentânea e egoisticamente se comprazem em lançar mísseis - sejam reais sejam metafóricos - para destruir o semelhante).

sexta-feira, 15 de abril de 2022

Fechar do pano, aplauso eterno

      Nunca se espera o que nos está destinado.

     Acordar com a notícia da morte de Eunice Muñoz é sentir que mais uma referência da nossa cultura da palavra e do teatro parte.
     A versatilidade e a qualidade de papéis por ela representados granjearam-lhe o es-tatuto de "Senhora do Teatro Nacional"; fi-gura de proa reconhe-cida no talento, no trabalho e na gene-rosidade. Se aos dois primeiros se associa o profissionalismo, no último espelha-se o humanismo de que aquele(s) também precisa(m). Por isso, se tornou exemplo de sucesso e de excelên-cia, por ser completa na representação e no ser - duas dimensões que soube preencher de e com verdade. Acrescentaria com dignidade - para si e para os outros, que soube acompanhar no palco e na vida. Foram 93 anos de vida e 80 de carreira; cerca de duas centenas de peças, com presenças no cinema e na televisão; quase cem produções fílmicas, telenovelas e programas de comédia. Muita obra para uma enorme artista e não menor mulher. Afabilidade e sorriso marcaram-na; por isso, conquistou também o público que a aplaudiu na qualidade da representação dos pequenos e grandes papéis.
    Terminou como atriz no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa, em 28 de novembro de 2021, representando "A margem do tempo" (de Franz Xaver Kroetz), no mesmo local onde se estreou em 1941 com a peça "Vendaval" (de Virgínia Vitorino), com a Companhia Rey Colaço/Robles Monteiro. Mesmo quando a voz denunciava debilidade na projeção, a intensidade emotiva estava lá; a força da palavra persistia, resiliente.
     Vi-a por duas vezes ao vivo: Dúvida (2007), no Teatro Maria Matos, e O Ano do Pensamento Mágico (2009), no Teatro Nacional de São João. Na primeira, contou com a contracena fabulosa de Diogo Infante; na última, era uma mulher só num imenso palco e com um longo texto monologado. Em ambas as representações, fui pelo nome "Eunice Muñoz" e nessa concessão própria de quem quer dar uma oportunidade às personagens criadas; de ambas saí com a sensação de andar nas nuvens, como se o lugar da vida fosse o céu que acolhe nuvens e estrelas.

       Na enunciada eternidade do seu papel na vida e no teatro, Eunice Muñoz é identificada na e pela arte que viveu. Uma figura da cultura portuguesa, e que muitos souberam ver como valor sem fronteiras. Aplauso de pé. 

quinta-feira, 14 de abril de 2022

A propósito de "Trilhar o Futuro"

       "Trilhar o Futuro - 2022": na senda do que nos une.

    Assim foi composto um texto, na sequência de um conjunto de atividades dinamizado no Agrupamento de Escolas Dr. Manuel Laranjeira, entre os dias 7 e 8 de abril:

Texto próprio, a título coletivo, para todos os que nele se revejam

       Publicado no Defesa de Espinho, no dia 14 do corrente, ficam a opinião e o agradecimento a todos os que, mais direta ou indiretamente, contribuíram para a iniciativa.

        E assim se fez, mais uma vez, escola num agrupamento.