quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Encontro feito poesia

        Registo para uma tarde de nevoeiro, aquecida pela amizade.

       Depois de observar o mar, o efeito criador deu frutos.


Onda do Mar de Espinho
(à hora do café)

Para a Ana e o Vítor

Um rolo
cristalino
enrosca-se
coberto de névoa
- esbatido o Sol -
e sonha ser espuma
cumprindo assim o seu destino
num beijo dourado de areia.

IA, 30 de Set. 2009


Foto VO

        O nevoeiro, por vezes, deixa ver mais do que a claridade dos dias.

     Sempre o mar, esse apetecível leito embalador de viagens, de renovação dos horizontes (tal como os da vida...), apesar de às vezes se disfarçar de nevoaça.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Formação de palavras

      Mais formação de palavras.

     Q: No caso de palavras como 'dispneia', que o dicionário refere ter entrado pelo grego e/ou pelo latim 'dyspnoea,ae', ou de 'escavação', pelo latim 'excavatìo,ónis', consideramos tratar-se de palavras simples? Ou regressamos à origem do latim?

     R: No contexto de trabalho com alunos do ensino básico e secundário, o trabalho na formação de palavras apoia-se bastante no que se considera a consciência sincrónica dos termos e dos constituintes morfológicos (afinal de contas, aquela em que eles se podem apoiar de forma mais imediata). Portanto, há que tomar as palavras como simples, considerando a indicação etimológica facultada pelo dicionário e a constatação de que terão ocorrido apenas fenómenos de evolução fonética. Interessante será também verificar, ainda, se tais palavras se constituem como base para outras ou, pelo contrário, as primeiras não apresentam rentabilidade para a consideração dos mecanismos e /ou constituintes morfológicos.
    O caso de 'escavação' é que já não é tão pacífico, pois há dicionários que tratam a palavra como podendo ter duas possibilidades de explicação quanto à sua entrada no Português: ora pela evolução fonética (o que a tomará como palavra simples) ora pela derivação a partir de 'escavar' (o que a tomará como complexa). Creio que não haverá problema de maior se, junto dos alunos, exemplificarmos este último caso a par de outros similares. A regularidade de formação de nomes a partir de verbos, pela adição do sufixo 'ção', é um dado sistemático e recorrente ('aglutinar > aglutinação', 'animar > animação', 'avaliar > avaliação', 'computar > computação', 'considerar > consideração', 'conversar > conversação', 'degustar > degustação', 'derivar > derivação', 'eletrificar > eletrificação', 'elevar > elevação', 'formar > formação', 'indicar > indicação', 'localizar > localização', 'manipular > manipulação', 'observar > observação', 'salvar > salvação', 'segmentar > segmentação', 'valorizar > valorização', entre muitos outros). Esta será a abordagem para que eles tenderão, na generalidade, pelas estratégias de observação / segmentação de afixos.

       Casos complicados, diria, para tantos outros bem mais simples.

sábado, 26 de setembro de 2009

Dia Europeu das Línguas

     A propósito do evento e relembrando 'post' anterior, recuperemos o nosso primeiro gramático, autor da conhecida Grammatica da lingoagem portuguesa (Lisboa, 1536).

     Palavras que provam como os fundamentalismos da língua (como quaisquer outros) não fazem muito sentido, pois não contribuem para o reconhecido sentido humanista (tanto o que resulta do trabalho com os livros e os clássicos como o que se associa à própria dignificação humana):

“Muy poucas são as cousas que durão
por todas ou muitas idades em hu estado
quanto mais as falas
que sempre se conformão
com os conceitos ou entenderes,
juízos e tratos dos homens.”

Fernão de Oliveira (séc. XVI)

     Se o Homem evolui...

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Composição...? Lexicalização...?

      A propósito da formação de palavras (domínio sempre complexo...).

    Q: Que resposta damos agora às situações das palavras lexicalizadas? Entram na categoria de morfossintácticas? Os professores perguntam, os manuais e algumas gramáticas novas apresentam informação contraditória.

    R: O processo de simplificação da TLEBS configurado no Dicionário Terminológico (DT) acabou por não evidenciar mecanismos complexos e com um alto grau de especificidade no domínio da formação de palavras, muitos dos quais ultrapassam, nomeadamente, o domínio morfológico (como é o caso da lexicalização e o das palavras lexicalizadas). No fundo, há razões semânticas e/ou morfossintácticas para a explicação destes mecanismos, correspondendo a um grau de irregularidade e de complexificação de análise que ultrapassa claramente o público-alvo dos ensinos básico e secundário. Registo, entretanto, que nem todas as palavras lexicalizadas são compostas (ex.: 'corredor' e 'construção' são derivadas); as que o são (ora por deriva semântica ora por alteração morfológica) não podem entrar nas chamadas palavras compostas morfossintácticas. Estas últimas exemplificam situações marcadas por sistematicidade, enquanto a lexicalização actua de forma algo aleatória e /ou pontual.     
     Há quem prefira tratar estes casos como exemplos já de análise no âmbito da lexicologia e dos processos irregulares de formação de palavras; não deixa de ser funcional recuperar a figura das palavras lexicalizadas e a da lexicalização, para enquadrar a explicação de casos atípicos num processo de formação.
   
     Não sendo assim, ficarão por explicar casos clássicos como o 'fidalgo', 'vinagre', 'chapéu de chuva', entre outros.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Chegou a vez do (des)acordo

     Numa questão em que ninguém pediu opinião a ninguém, há quem o faça à minha pessoa (logo eu, que vou ter de aplicar o que nem sequer tenho de opinar).
     
    Q: O que o senhor pensa a respeito do Acordo Ortográfico? Sou brasileira e senti-me um pouco à vontade com o mesmo.

    R: Antes de avançar com a resposta, recupero uma foto tirada aquando de um passeio por terras de "Biana" (diga-se, Viana do Castelo):


     Uma pedra da memória para uma escrita que, hoje, passado mais de um século, ainda mantém realizações gráficas familiares: aquelas que jovens alunos e escreventes menos atentos às convenções ortográficas produzem, iludidos por alguma interferência fónica.
       Desde a data do registo da placa da "bica" (1885), muita água correu por baixo da ponte (numa imagem que não deixa de convocar o fluir do tempo e que faz lembrar o pré-socrático Heráclito, mais a ideia de que não nos banhamos duas vezes na mesma água). Daí até ao presente, vários foram os passos tomados para se estabilizar uma ortografia que foi problematizando o cariz etimológico dominante. Em 1910, com a implantação da República, uma Comissão estabeleceu uma ortografia simplicada e uniforme para as publicações oficiais e educativas; em 1911, houve uma primeira Reforma Ortográfica não extensiva ao Brasil; em 1931 foi aprovado o primeiro Acordo Ortográfico entre o Brasil e Portugal (todavia, não foi posto em prática); em 1943, é redigido o Formulário Ortográfico, na primeira Convenção Ortográfica entre Brasil e Portugal; dois anos depois, um novo Acordo Ortográfico tornou-se lei em Portugal, mas não no Brasil (que continuou a regular-se pela ortografia do Vocabulário de 1943); em 1990, surgiu uma "Nota Explicativa do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa", com as Academias de Ciências de Lisboa e a Brasileira de Letras a elaborarem a base do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (o documento entraria em vigor, de acordo com o seu artigo 3º, no dia "1 de Janeiro de 1994, após ratificação por todos os Estados junto do Governo português", mas dois anos depois só Portugal, Brasil e Cabo Verde o haviam feito); em 2008, após indicação de que apenas três membros da CPLP validariam o Acordo Ortográfico de 1990, este foi aprovado por Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Brasil e Portugal. A sua implementação no Brasil não é, porém, acompanhada em definitivo por Portugal, país que assumiu um período de moratória para a sua aplicação generalizada.
     Muitos dos argumentos aduzidos, em Portugal, para a defesa do acordo, revelaram-se inconsistentes, tendo-se chegado mesmo a redigir um manifesto de defesa da Língua Portuguesa e contra o acordo. Neste último caso, entrou-se na linha argumentativa de algum fundamentalismo, muitas vezes insensível ao que têm sido as variedades da língua e a projecção do Português no mundo.
     Num país cujos indicadores de iliteracia persistem em revelar alguns sinais preocupantes quanto ao domínio da escrita, considero que o acordo não deixará de trazer alguma instabilidade que, presentemente, se sente relativamente a alterações que já vêm de 1945 (mas que muitos escreventes, até instruídos, ignoram); numa língua viva, ainda em constante evolução, a questão do acordo será sempre aberta, a discutir num período mais ou menos alargado do tempo de uso dessa língua; um documento como o do acordo pouco mais é do que uma orientação para a acção que a realidade concreta e prática poderá ou não cumprir, a não ser que haja uma política de acompanhamento e uma acção convergentes para a valorização da língua, no reconhecimento das suas diferenças.
      Não sendo fundamentalista na posição a assumir, creio que esta é uma de um conjunto de questões que não deve ficar circunscrito à decisão política ou governamental (em contexto de defesa dos referendos, aqui está a possibilidade de um, acerca de um assunto sobre o qual os utilizadores se deveriam pronunciar); uma maior divulgação e uma consistência de argumentação face aos prós e contra do acordo permitiriam a construção de opiniões mais sólidas, menos emotivas e ou nacionalistas; a integração do acordo num programa de ensino, valorização e reconhecimento nacional e internacional da língua viabilizaria uma perspectiva de estabilidade e um sentido de acção mais fundamentado, menos propenso ao clima de insegurança vivido pelos falantes / escreventes (que convivem com uma multiplicidade de alterações cujo significado se revela crítico). Respeitados estes requisitos, talvez encarasse de forma mais confortável e menos condicionada um documento que procura normativizar algo sobre a língua.

     Acordo: entre a convenção e a homografia com o processo de acordar para um registo de consensos que está longe de ser obtido.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Uma questão de género

     Porque a tradição já não é o que era (pois já não é suficiente).

      Q: Qual é a sua opinião sobre esta definição de género - "Categoria morfossintáctica que permite a distinção entre masculino e feminino. Esta categoria aplica-se aos nomes (à excepção de algumas situações específicas), aos adjectivos (salvo os que são uniformes) e ainda a alguns pronomes. No caso de se tratar de um animal ou de uma pessoa, a distinção de género coincide com a distinção de sexo"?

      R: Trata-se de uma definição que conjuga alguns pontos comuns a muitas outras tentativas de definição (entre as de cariz mais morfológico, as de âmbito sintáctico e até as de natureza filosófica).
       Não se pode confundir o que são situações típicas (o contraste morfológico '-o/-a' pode ser assumido como típico na língua portuguesa) com realizações que as ultrapassam. Registe-se que há um reduzido número de casos que exemplificam o contraste atrás mencionado (para não falar ainda dos que assentam no de morfema Ø / -a); há inúmeras ocorrências que não o cumprem, recorrendo-se, por exemplo, ao mecanismo morfológico da composição de palavras (ex.: elefante-macho / elefante-fêmea). Não é também por acaso que já Lindley Cintra e Celso Cunha, na Nova Gramática do Português Contemporâneo, privilegiavam o critério sintáctico como o mais estabilizador (recorrendo ao determinante que antecede o nome, por exemplo). Mais: o contraste de género nem sempre se faz por meios morfológicos ou sintácticos. Há contrastes que são de âmbito lexical (ex.: bode / ovelha; pai / mãe) ou, inclusive, de natureza fonológica (ex.: avô / avó). Acho que há aqui vários contra-exemplos para se admitir que a tradicional distinção entre 'género gramatical / género natural' é uma falsa questão em termos linguísticos, não ajudando a agrupar as palavras no contraste de género. Cria apenas confusões e afasta do que possa ser uma sistematização estritamente linguística.    
     Em termos linguísticos, proporciona-me um conjunto de perguntas:
     i) E os determinantes / quantificadores? Também não fazem contraste de género (meu livro / minha caneta, teu casaco / tua saia; um caminho / uma estrada, quantos bolos / quantas bebidas)?    
     ii) Qual o contributo filosófico para a definição linguística do género? (se, nos animais, cobra é do sexo feminino, como será o masculino? Tubarão é do sexo masculino? Como será quando for feminino? E o contraste lagarta-lagarto é uma questão de género associado a sexo ou será que estamos a referir um tipo de animal diferenciado? No caso das pessoas, profeta é feminino? Polícia é feminino? E canalha? Feminino? Como será a versão masculina?)

    Enfim: questão algo complexa para ser apresentada como a definição a propõe.    

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Actos ilocutórios e textos

      O cuidado que os actos requerem...

     Q: Os actos ilocutórios são um exclusivo da oralidade ou podemos também abordá-los na escrita (quando esta não reproduz o oral, naturalmente)? Concretizando, é correcto pedir para identificar o acto presente numa frase, em documentos como declaração, regulamento...? Encontrei esta situação num manual e levantou-me algumas questões, sobretudo no primeiro caso em que terá na base o compromisso dos outorgantes...

Pormenor da capa do álbum 'Division Bell', dos Pink Floyd (1994)
    R: Os actos de fala apontam para uma área de análise que deve ser abordada nos textos que evidenciam condições de produção analisáveis, preferencialmente, em função das coordenadas de interacção (independentemente do suporte ou meio oral / escrito utilizado), sejam elas encaradas de forma imediata ou mediada. No caso de géneros textuais e discursivos como os citados, é possível fazer uma representação dominante ou global dos actos nos termos exemplificados (caso dos compromissivos, nos contratos, pelo que se dá a ler do comportamento esperado do outorgantes - a partir do próprio contexto de assinatura e aceitação dos termos ou cláusulas; caso dos directivos, nos regulamentos, pelo que os enunciados apresentam de uma força ilocutória combinada com o conteúdo de enunciados orientados para a regulação ou acção sobre os destinatários).
      Não se trata de generalizar a presença desses actos em todos os enunciados desses textos; mas, convocando as condições de interacção, a representação e a análise dos enunciados, bem como a intencionalidade comunicativa visada, é perfeitamente possível tal abordagem, por se estar a considerar discursos pragmaticamente marcados por coordenadas de produção-recepção e/ou interacção intencionalmente planeada para a regulação de comportamentos sociais, transaccionais. Tais enunciados acabam por contribuir para um sentido global do texto, também o marcando e caracterizando linguisticamente em termos de macro-acto de linguagem.

     ... e que os textos acabam sempre por reflectir, quando não acabam por recriar.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Quando a gripe ataca a língua...

    Em contexto de ameaça da Gripe A, nem a própria língua está livre de ataques virulentos, denunciadores dos descuidos e das interferências que uma oralidade desregulada pode criar na própria escrita.

     Ao folhear uma revista de publicação semanal, chamado à atenção pelas "5 medidas para evitar a gripe A na escola", deparo com a terceira das cinco:


Digitalizado a partir de uma revista semanal, publicada para o período 14-20/09/2009, pág. 71

      Esta frequente confusão entre o verbo auxiliar 'ter' e 'estar' é apenas uma gota de água, a ponta de um icebergue, em grande parte submerso e a reclamar o trabalho da oralidade (entre a análise do que seja a sua realização mais informal, económica, despreocupada na sua realização imediata, não planificada, e a que explora produções mais atentas à correcção da língua, numa clara aproximação ao que sejam cuidados que não andam muito longe do que se pretenda para a escrita). Assim acontecesse e os reducionismos fonéticos e/ou silábicos nas palavras (por mais socialmente reconhecidos que sejam nas formas de um verbo 'tar', que não existe, ou na confusão com um verbo 'ter', que não se adequa ao enunciado) seriam evitados num discurso oral mais regulado; talvez desse modo também o escrito beneficiasse de uma maior reflexão e correcção.

     Quisera eu saber que medidas seguir na gripe e fiquei-me aquém das intenções; a leitura, ficou a meio... onde não está a virtude.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Uma noite feita de Pessoa(s)

     Um convite, um (re)encontro, um espectáculo...

     Assim diria, resumidamente, de uma noite em que se divulgou publicamente um projecto que primou pela qualidade.


     Um espectáculo, no duplo sentido, anunciado como "apenas mais um olhar sobre o processo de escrita e sobre o jogo dos heterónimos mais conhecidos do grande público: Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis."
    Espectadores atentos assistiram a uma curta-metragem feita do valor dos grandes (pelo tema e pelos motivos, pelos actores, pelos que sabem levar a bom termo projectos de trabalho e sinais de uma escola que sabe reconhecer os seus e que, dessa forma, acaba reconhecida por todos).

     Palmas... de pé.
    E pelo que vi, nada melhor que as palavras desse Pessoa, na pessoa do poeta: "Revivo, existo, conheço; / E, ainda que seja ilusão / O exterior em que me esqueço, / Nada mais quero nem peço: / Entrego-lhe o coração." (in "Fresta", Ficções do Interlúdio).

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Quando o tempo refaz alguma das coisas que se perderam

    Nem tudo é remediável; alguma coisa se refaz... com o tempo.

    A propósito da trasladação dos restos mortais de um poeta, voltado à sua pátria. Um dos que estudou Camões e tantos outros marcos da nossa literatura... Ele mesmo a marcou e nela se afirmou como um dos maiores.



ETERNIDADE

Vens a mim
pequeno como um deus,
frágil como a terra,
morto como o amor,
falso como a luz,
e eu recebo-te
para a invenção da minha grandeza,
para rodeio da minha esperança
e pálpebras de astros nus.

Nasceste agora mesmo. Vem comigo.

                                                         22/09/1941
      in Obras de Jorge de Sena - Antologia Poética,
                                            Porto, Edições ASA

Estátua de Jorge de Sena,
da autoria do Mestre Francisco Simões,
no Parque dos Poetas (Oeiras)

    Que o regresso seja a aproximação de Portugal a um dos seus maiores (alguém que sempre se quis e se fez um cidadão do mundo), na pacificação da alma e no reconhecimento público nacional (e merecido) há muito esperado.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Parassíntese: velha questão?

     Retomada a formação de palavras, por uma questão que já vai sendo clássica.

  Q: Entendendo que a parassíntese é um processo de formação de palavras obtido pelo uso simultâneo de um prefixo (constituinte morfológico colocado à esquerda de uma base derivante) e de um sufixo (constituinte morfológico colocado à direita de uma base derivante), acha que 'deslocalizar' é um bom exemplo a dar?

  R: Naturalmente que não. A palavra 'deslocalizar' obedece a uma sequência de etapas de formação diferenciadas: a partir de 'local' forma-se 'localizar' e, depois, 'deslocalizar'. Ou seja, por muito que na palavra derivada subsistam um prefixo e um sufixo, estes dois constituintes morfológicos não são simultaneamente integrados no processo de derivação. Prova disso é o facto de haver apenas a palavra sufixada ('localizar'). 'Deslocalizar' é um exemplo de derivação por prefixação e sufixação.
    Na parassíntese, prefixo e sufixo funcionam como se de um operador morfológico apenas se tratasse, isto é, dois constituintes que não são autónomos, apesar de separados pela base (funcionam como correlatos morfológicos) - daí a natureza simultânea do processo de formação. É o caso de palavras como 'endoidecer', 'aterrorizar', 'esbracejar' (verbos derivados a partir de nomes pela adjunção simultânea do prefixo e do sufixo, sem que possa existir a forma apenas sufixada ou apenas prefixada).
    Pela especificidade deste processo, há linguistas que preferem atribuir-lhe a designação de 'circunfixação' (caso da Professora Graça Maria Rio-Torto, conforme se pode ler na obra Morfologia Derivacional - Teoria e Aplicação ao Português).

  A propósito da parassíntese, houve já uma questão formulada, para a qual se remete, complementarmente, o presente esclarecimento.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Colher da amizade

     Uma colher de café... para mexer a vida.

    Versos saídos de um acto de generosidade, na oferta de uma colher de café.

Tenho uma colher
feita de um metal nobre,
bom condutor do calor da amizade…;
composta por ligas que o afecto soldou,
solidou, ductilizando benquerenças…

Lembra-me o café que me anima
(desde essa nota de luz que raia o dia
ao escuro que deixa ver Sírio e Canoto);
o cheiro desse arábico vinho que embevece;
o sabor dessa semente que da união faz força;
a cor quente da terra, rendida a um céu,
que, da satisfação, só pode ser o sétimo.

Tem um grão;
parece um coração;
reluz ao brilho de animados encontros
              preenchidos por manjares e cantos,
              coloridos de riso,
              esguichados por chuva das estrelas
                   aromados por deleites naturais
                   feitos de paisagens e de tempos,
                   pintados de cansaços tão alegres.

Tira? Não.
Leva? Nada.
Mexe? Comigo e com os que nela lembro.

Tenho uma colher
para adoçar com, alguma felicidade, esta vida.

Gondomar, 8 de Setembro 2009

    Não sei o que o tempo dirá ou fará, mas, enquanto tiver esta colher, farei dela a lembrança do toque na chávena, do paladar doce e anunciado das bebidas que aquecem e animam os afetos.

    Para lembrar bons momentos... feitos dos que a memória recuperará de alguma distância.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Acabadas as férias... memórias de um "Hotel"

      Porque uma amiga partilha do seu precioso tempo comigo e com outros amigos...

     Aqui está uma versão "light" (acústica e de concerto ao vivo), mas com a espectacularidade das coisas simples, para uma bela canção da década de 70 do século passado (1977) - vencedora dos Grammy e cantada pelos Eagles (E que águias!!).

Versão ao vivo, acústica de "The Hotel California"

       Um "hotel" dos tempos da adolescência, sempre (e agradavelmente) recordado no presente.

On a dark desert highway, cool wind in my hair
Warm smell of colitas, rising up through the air
Up ahead in the distance, I saw a shimmering light
My head grew heavy and my sight grew dim
I had to stop for the night
There she stood in the doorway;
I heard the mission bell
And I was thinking to myself
"This could be heaven or this could be hell".
Then she lit up a candle and she showed me the way
There were voices down the corridor,
I thought I heard them say...

Welcome to the hotel california
Such a lovely place
Such a lovely face
Plenty of room at the hotel california
Any time of year, you can find it here

Her mind is tiffany-twisted, she got the mercedes bends
She got a lot of pretty, pretty boys, that she calls friends
How they dance in the courtyard, sweet summer sweat.
Some dance to remember, some dance to forget.
So I called up the captain
"Please bring me my wine".
He said "We haven't had that spirit here since nineteen sixty nine".
And still those voices are calling from far away.
Wake you up in the middle of the night
Just to hear them say...

Welcome to the hotel california
Such a lovely place
Such a lovely face
They livin' it up at the hotel california
What a nice surprise, bring your alibis.

Mirrors on the ceiling
The pink champagne on ice
And she said "We are all just prisoners here, of our own device.
And in the master's chambers
They gathered for the feast
They stab it with their steely knives
But they just can't kill the beast".

Last thing I remember
I was running for the door
I had to find the passage back
To the place I was before
"Relax", said the night man
"We are programmed to receive.
You can checkout any time you like,
But you can never leave!"


      Com os agradecimentos à amiga, pelo reencontro musical... e pelos postais "emailicos", feitos de palavras, sons, imagens e amizade.