Desta vez, fico-me pelo Livro do Desassossego (que já teve versão fílmica).
Trabalhados alguns fragmentos, fica a sensação de um Bernardo Soares que ecoa o ortónimo, bem como os heterónimos, num registo prosaico feito da poesia e do pensamento plasmados em alguns versos familiares aos olhos dos leitores pessoanos.
Na proximidade com o criador, Bernardo Soares é um semi-heterónimo (no seio de outros dois) que muito contribuiu para a dimensão reflexiva da obra completa do criador poético; um prosador que observa e transfigura a cidade, os ambientes, o quotidiano à semelhança de Cesário; que trabalha e reflete sobre a língua (pois gosta de "palavrar"); que explora o sonho como libertação do sono da vida (ou da "salada coletiva da vida").
É na dualidade de um Pessoa-Soares ou de um Fernando-Bernardo que o ser-sombra se compõe, como se pode depreender do documentário seguinte (a abordar um livro, que é simultaneamente vida, de desassossego):
É na dualidade de um Pessoa-Soares ou de um Fernando-Bernardo que o ser-sombra se compõe, como se pode depreender do documentário seguinte (a abordar um livro, que é simultaneamente vida, de desassossego):
Documentário com montagem a partir da série televisiva "Grandes Livros" (RTP-1)
Mais do que um Vicente Guedes (aristocrata falido que ganha a vida como empregado de escritório) ou o Barão de Teive (com morte anunciada, e que decide escrever antes de se matar), Bernardo Soares é o pensador moderno na reflexão sobre o abismo da alma humana, reportando uma vivência de angústia, numa sociedade feita de desalento e numa época tão crítica quanto criativa. Nesta, a alma do escritor é "uma orquestra oculta", sem saber "que instrumentos tange e range, cordas e harpas, tímbales e tambores"; só se conhece como sinfonia e vê a infância como saudade da emoção desse momento de "grande certeza sinfónica".
Sem sentimento político ou social, Bernardo Soares assume-se pelo alto sentido patriótico: a sua pátria é a língua portuguesa.
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