terça-feira, 13 de junho de 2017

Sem santo nem poeta

     Quando me preparava para escrever sobre Santo António ou a data de nascimento de Pessoa, fiquei sem santidade (como se alguma vez a tivesse) e perdi a poesia.

      Não há milagre ou santo nem poesia ou poeta que resistam. É tão mau que nem ao Diabo (vá de retro, Satanás!) lembra. Tudo num só dia. É obra (ingrata)!
       Para começar, logo pela manhãzinha, não há luz ao fundo do túnel para quem escreve as legendas na RTP:

As legendas da RTP no seu pior (I)

     Coitadas das timas (nome), que deixaram de o ser (até porque nem na notícia o foram) por passarem a forma verbal (vitimas). Lá se foi a palavra esdrúxula, porque a quiseram tornar grave. É grave... muito grave!
       E por falar em esdrúxulas (ou proparoxítonas), três minutos depois, mais duas pérolas:

As legendas da RTP no seu pior (II)

       Não é bom falar de vidas, é certo; porém, confundi-las com a forma do verbo dividir no presente do conjuntivo (segunda pessoa do singular: dividas)...! Quer-se o nome; não o verbo. Para terminar, e ainda no mesmo rodapé, último (adjetivo) a ser confundido com a forma verbal de 'ultimar' (eu ultimo, tu ultimas, ele ultima...). É a sílaba tónica distinta (em termos fónicos) e a acentuação gráfica (em termos ortográficos) que fazem a diferença.
       Um minutinho depois, é a vez de novo caso crítico:

As legendas da RTP no seu pior (III)

     Nova esdrúxula que o devia ser enquanto nome (tráfico), e sai nova forma verbal grave (eu trafico, tu traficas, ele trafica,...). Isto de traficar nunca deu bom resultado!
      Quando tudo parecia crer que havia alguma coisa contra a acentuação gráfica das esdrúxulas (tão elementar quanto obrigatória no português), surgem, duas horas depois, duas falsas esdrúxulas com o mesmo problema (o da ausência de acentos):

As legendas da RTP no seu pior (IV)

As legendas da RTP no seu pior (V)

       'Queda às' em vez de 'Queda nas' é questão menos problemática, quando, por comparação, se conclui que não há queda nenhuma, efetiva, para a acentuação gráfica - inclusive das palavras terminadas com encontros vocálicos habitualmente proferidos em ditongo crescente (casos de tio e de água, ou as chamadas "falsas esdrúxulas").
        Não fosse isto suficiente, falta o momento de "Última hora". Na festa, tudo se passa e muito se consente; mas no que toca à sua notícia, para além da falha / troca de letra ou grafema (se > de), a discordância sintática é evidentemente contraproducente:

As legendas da RTP no seu pior (VI)

     As comemorações, na justa medida, sempre animaram e não há santo que tal mude: a concordância no plural é processo de coesão frásica tipicamente verificado e normalizado na língua. Contudo, na cabeça de alguns nem sempre tal se verifica, para mal dos pecados de quem tem que os ler, quando escrevem (MAL).

      Nem Fernando nem António nos livram, por mais santos ou poetas que tenham sido. É muito mau receber isto tudo num só dia. Dizem que à dúzia é mais barato, mas, definitivamente, já à meia a imagem do canal do "Bom Português" sai bastante comprometedora. Mais uma imagem que não dá para comprar.

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