O ano 2022 entrou e foi tempo para relembrar a obra-prima de Charlotte Brontë.
Na lista da Netflix figurava o título Jane Eyre - homónimo do romance da literatura romântica inglesa (vitoriana) na linha da narrativa pessoal, isto é, da evolução de uma personagem chamada Jane Eyre. Foi esta a escolha para abrir o ano em modo cinema televisivo.
Pode mesmo falar-se, a partir da narrativa em que o filme se baseia, de uma busca de "personal fulfillment" no percurso de uma personagem desde os seis aos vinte / trinta anos. A obra assenta na estrutura básica de uma viagem, referenciando cinco espaços perfeitamente distintos da zona de Yorkshire, a corresponder a fases distintas da vida da protagonista: Gateshead (criança), Lowood (menina e adolescente), Thornfield (jovem precetora da protegida de Rochester, Adele Varens), Marsh ou Moor End (mulher em processo de resolução) e Ferndean (mulher assumidamente adulta, autónoma).
A representação fílmica, numa versão de 2011, reflete esse percurso de afirmação da narrativa em primeira pessoa. Provam-no os grandes planos iniciais focados em Jane, num enredo protagonizado por Mia Wasikowska (Jane Eyre) e Michael Fassbender (Edward Rochester):
Trailer da versão fílmica de 2011, realizada por Cary Joji Fukunaga
Sem a natural obediência à obra de Brontë (nalguns dos seus pormenores) - conforme à expressão própria de cada uma das peças de arte -, não deixa de se rever na produção fílmica a afirmação do feminino que Jane Eyre simboliza face ao mundo e poder dominador masculinos, de Edward Rochester (que cai do cavalo; se vê impedido de se regenerar, de recompor a sua felicidade com um segundo casamento; acaba cego, depois de ver a sua casa destruída), do Sr. Brocklehurst (encarado na sua frigidez, no diabolismo punitivo, na orientação religiosa do metodismo) ou de St. John (a quem Jane muito quer apenas como irmão e, por isso, o recusa, quando ela é pedida em casamento). Confronta-se razão (o mundo realista do comportamento e das convenções sociais) com o sentimento (o mundo sentimental da consciência passional). Explora-se a dimensão do romance gótico (na apresentação da 'red room', em Gateshead; no aparecimento progressivo de Rochester, no primeiro encontro em Thornfield; a existência de Bertha Mason, no sótão; os incêndios e a destruição de Thornfield). Recria-se a imagética da cor e dos elementos naturais da água, do fogo e do ar.
Termina o filme com a recuperação da relação Jane-Rochester; a obra, com uma afirmação associada à fé e ao espírito de St. John (a expressão da espiritualidade romântica). Sem o romantismo oitocentista, também é preciso ter fé que este ano venha a ser melhor do que o anterior. No início, entre a fé e a esperança - é o que nos resta considerar para o caminho a fazer.
Maravilla de película.
ResponderEliminarConcordo em absoluto.
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