segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Uma questão de bocados...

      É caso para dizer que estamos em autêntico desnorte, no que à utilização da língua diz respeito.

   Já estamos habituados às "pérolas" com que alguma comunicação social nos presenteia na sua programação informativa. Foram já apontados aqui casos diversos: problemas ortográficos, sintaxe incorreta nas legendas fílmicas, seleção vocabular inexistente, pontuação indevida e outras coisas mais
      O que agora se apresenta é, no mínimo, uma ironia da situação hoje vivida.


     Para lá da agramaticalidade sintática, está aqui em questão a interferência do oral no escrito, mesmo no que possa ser entendido como um primeiro rascunho - o qual, inadvertidamente, foi publicitado. Por estas e por outras é que digo aos meus alunos que pensem bem antes de escrever; que não passem para o escrito a "voz" que lhes fala ao cérebro, numa cópia do que mal ouvem / mal falam. 
     Precisamente aconteceu isto aqui: estou mesmo a ouvir alguém dizer "Angela Merkel abandonou Portugal há bocado" (ainda por cima com a deturpação do adverbial e num registo que, de tão oralizante, até torna o tempo como algo massivo, do qual se corta um pedaço, um bocado). A escolha oral já não é a melhor e, depois, os reflexos na escrita veem-se...
     Cá está a razão pela qual peço aos meus alunos para utilizarem "um pouco", "há pouco" em vez de "um bocado", "há bocado". Ensinar uma linguagem diferente daquela que se utiliza no seio familiar ou da socialização primária, particularmente quando esta se afasta dos códigos socialmente reconhecidos e normativizados, é um imperativo da escola, para que, depois, não haja eventuais jornalistas a escreverem títulos-resumo deste estilo (mesmo que de rascunho se trate).
      Tanto percurso formativo (possivelmente com muitos testes de escolha múltipla e de associação, não compositivos) para tão triste produção!

     Só espero que este exemplo não seja um prenúncio ou uma evidência: o(a) de que Portugal está aos bocados e que Merkel o deixou só com um (sabe-se lá para onde foram os restantes, se é que alguma vez existiram na cabeça destes políticos!)

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