quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Um acordo com relativizações

      São várias as pessoas que já têm comentado este (des)acordo ortográfico.

      A deriva ortográfica está instalada, seja porque há orientações difusas quanto ao que pode ser feito seja porque, assumidamente, não pode haver acordo total para toda uma comunidade de falantes com grande variação na realização fónica da sua língua.
     Há dias, perguntavam-me o que queria eu dizer com a facultatividade relativa no acordo. É que "se é facultativo" faz-se como se quer, diziam-me.
     Cá vai um exemplo dessa facultatividade relativa (dependente, portanto, da realização padronizada na variedade considerada):


      Depois de se assumir que ambas as formas gráficas são corretas (receptivo / recetivo) - o que daria a liberdade de ação para os falantes -, a verdade é que se relativiza a assunção inicial: em Portugal, a grafia é sem 'p', dado estar-se perante uma consoante fonicamente não realizada (o que não sucede, por exemplo, no Português do Brasil). Conclusão, ambas as formas são corretas, mas para Portugal há uma realização gráfica e para o Brasil há uma outra (dependente da realização fónica de [p]).
     É nesta mesma linha de facultatividade e de aceitação de duas formas gráficas que devem ser entendidos outros casos - nomeadamente os já aqui abordados similares ao 'falámos / falamos'.


      A utilização ou não de acento é tomada como facultativa, mas no âmbito da sua relativização. É que a norma padrão da língua na variedade do português do continente europeu estabelece distintividade morfofonológica entre o tempo presente (falamos) e o pretérito perfeito (falámos) na forma da primeira pessoa do plural de verbos da primeira conjugação (os terminados em '-ar'). Se tal não acontece com as restantes variedades (nomeadamente as continentais não europeias), motiva-se o princípio geral da facultatividade para um normativo que, sendo tomado como universal para a comunidade lusófona, tem aplicação relativa à norma padronizada de cada variedade maior (a europeia / a não europeia).
       E, de novo, as duas formas gráficas são corretas, mas cada uma para a sua variedade, segundo a distintividade (inclusive fonética e fonológica) das suas realizações - conforme já foi apontado em anotações anteriores.

       De novo, impõe-se o contacto com a fonte e a leitura completa do Acordo Ortográfico (até para que não aconteçam generalizações que o texto original não permite).

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