sábado, 28 de dezembro de 2013

Vontade de ser zambeziano

      Estreou quase há um ano, mas só hoje o vi. Mais vale tarde do que nunca.

     Trata-se do filme animado Zambézia, realizado por Wayne Thornley - uma história que tem tanto para crianças como para adultos, pelas aprendizagens e pela moralidade destacadas.


      A intriga foca o percurso de vida de Kai, um jovem falcão que sai do Catungo, onde viveu apenas com o pai (Bravo), antigo protetor e fundador dos furacões que patrulham os céus da Zambézia. Um desastre no passado, que quer esquecido, leva este último a preservar-se e a livrar o filho dos perigos que persistem para lá da fronteira que agora vigia. Chega, porém, a hora em que o jovem afirma a sua vontade e o seu espírito livre, acabando por migrar para aquele que é apresentado como o lugar mais seguro de toda a África - no reino de Madagáscar, junto a uma velha árvore que se impõe no limite da terra e no início das quedas de água.
      Mais do que Kai (o Raio Azul), que arrisca nos voos e se aventura na vida para se tornar um furacão, toda uma comunidade de aves se afirma na história, numa mensagem capaz de mostrar que há bem mais no que a aproxima do que naquilo que a separa. Inclusive para os heróis voadores vale esta lição, ao rever(ter)-se um passado que excluiu da cidade a espécie dos Marabus (por preconceito face à aparência diferente, à rudeza e à impetuosidade). Por esta razão, momentaneamente estes últimos aliaram-se ao mal, tentados que foram para um poder assente no engano, na sevícia e na traição; também eles acabam por, a tempo, reconhecer as suas fragilidades: desfazem o prejuízo provocado com a aliança feita com o vilão e juntam-se aos restantes pássaros na luta contra o mal.
    Constantemente se sublinha a ideia de que em conjunto tudo é mais fácil, numa reação clara aos individualismos que possam surgir. O coletivo sai sempre vencedor, mesmo nas situações de maior perigo, como a que é protagonizada pelo lagarto Brutus, o invasor da cidade das aves, na ânsia de controlar a cidade e encontrar a maior omoleta para a sua gula de poder.
       Não houvesse já aqui razões para se ver esta película, acresce ainda o facto de na tradução e versão portuguesas se encontrar um outro ponto de interesse: linguisticamente, está explorada a variação nas vozes de várias espécies de aves. Do português africano de Nonô, da variedade alentejana dos Marabus ou de Canja, da pronúncia nortenha do chefe dos furacões até à gíria estudantil de Canja ou o registo afetado das passaruchas (que não gostam de passarecos, só de passarões), há toda uma riqueza e versatilidade da língua motivadas para os diálogos das aves mencionadas.

       Um filme a não perder, para trabalhar com os alunos seja pela moralidade seja pelo material com valor linguístico (pela variação), que a versão portuguesa consegue motivada e sugestivamente explorar.

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