terça-feira, 11 de agosto de 2015

Um ano depois (de 'Aladdin' a Robin Williams)

     Há um ano, a notícia chegava: Robin Williams punha fim ao papel da vida.

     Porque ontem, num canal da TVCine (TVC3) foi exibido o filme da Walt Disney Aladdin (na sua versão original de 1992), realizado por Ron Clements e John Musker, reencontrei-me com a voz de Robin Williams. É ela que se faz notar na personagem do narrador-vendedor-viajante do mundo que abre o musical animado; é também ela que, na sequência fílmica, verbaliza os pensamentos e as desconcertantes réplicas cómicas do próprio Génio da Lâmpada.
     Mais do que a tradicional história inspirada no conto árabe "Aladim e a Lâmpada Maravilhosa", inserido em As Mil e uma Noites, foi a memória de um ator de eleição que me fez produzir esta nota.
      Os amores do jovem de rua Aladdin e da princesa Jasmine, as artimanhas e intrigas do poderoso e maléfico grão-vizir Jafar (coadjuvado pelo papagaio Iago) podem constituir-se como núcleos fundamentais da ação narrativa; contudo, é o Génio que acaba por se impor em toda a trama por variadas razões. Primeiro, porque é ele que tem o poder de satisfazer os desejos (tanto os de Aladdin como os de Jafar); segundo, porque é um dos mais produtivos fatores de cómico na película, nomeadamente com a apresentação de uma versatilidade de tons e de vozes fora de série; terceiro, porque mantém com Aladdin uma relação de cumplicidade e amizade, salvando este último de diversos perigos; quarto, porque é o benfeitor que sai recompensado com o que é ficcionalmente assumido como o maior dom da vida - a liberdade.

 
O Génio de "Aladdin" (1992), a cantar o tema "Friend like me"

      Se o tratamento temático da ambição desmedida (protagonizada por Jafar e o papagaio Iago), da satisfação dos desejos (de Aladdin, de Jafar e do próprio Génio), da diferenciação social no cruzamento com o amor se evidencia num filme que ainda coloca em discussão o facto de se poder ser alguém que se não é (quer Aladdin quer Jasmine vivenciam situações perigosas, fingindo ser pessoas distintas do que à partida são), não menos relevante é o tópico da prisão ou da falta de liberdade da maioria das personagens: o par amoroso diz-se preso aos seus estilos de vida e, por razões / vivências diferentes, ambos se sentem encurralados (ele, por nada ter; ela, por não poder escolher à vontade); o sultão de Agrabah age em conformidade com a tradição ou a força hipnótica de Jafar, até se libertar de ambos; este último está dominado pela contínua e ameaçadora sede de poder; o Génio lamenta-se por viver no interior da minúscula lâmpada, até que o amo / dono o faça sair para cumprir os três desejos a que tem direito. 
     É nesta precisa condição que se destaca o terceiro desejo de Aladdin: depois de desejar ser príncipe (para conquistar Jasmine) e de querer ser salvo da morte no mar (a que Jafar o votara, para poder casar com a princesa), cumpre-se a promessa feita ao Génio - a de o libertar da sua limitação (o que, curiosamente, sucede quando Jafar é feito prisioneiro na própria lâmpada que sempre quis possuir).
       O final feliz da história acaba por ser a concretização de "a whole new world" - título musical principal do filme - para os bons da fita. E, entre eles, está o Génio. Para além do virtuoso e generoso Aladdin, é ele o louco bom; o cómico que traduz alguma da seriedade da mensagem; o pateta alegre que reflete sobre a condição triste em que vive e sai recompensado por se colocar do lado dos justos.

       Na genialidade da personagem encontra-se o génio vocal de um ator que se destacou em vários filmes, particularmente Good Morning, Vietnam (1987), O Clube dos Poetas Mortos (1989), Despertares (1990), O Bom Rebelde (1997), entre muitos outros. Também ele procurou libertar-se de um drama (bem mais real) que o limitava. Pena que o tenha feito da forma mais extrema, sofrida e contrária à própria existência.

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