sábado, 25 de abril de 2020

Celebrar a liberdade (ansiando pela libertação)

       Há sempre razões para celebrar a liberdade surgida da ditadura.

       Para que não se esqueça o passado mal vivido e se tenha presente as conquistas conseguidas, faz sentido celebrar este dia, aquele que "acordou" sem o peso dos grilhões do autoritarismo e do despotismo; do controlo e do poder ditatoriais que não dão felicidade nem permitem afirmar a dignidade humana; do medo da perseguição.
       Hoje, sem a liberdade de movimentos desejada, persiste a liberdade da democracia. Confinados, sim, mas livres do jugo político que alguma ideologia possa representar - aspirando à libertação, porém, com a liberdade garantida.
       Este é o 25 de abril dos tempos da pandemia. Ainda assim, 25 de abril: aquele que precisou de vítimas, de heróis, de canções e de poemas "de guerra" em "vozes de rebate" (com o diria Antero de Quental, em "A um Poeta"); de luta contra a resignação; de espírito de resistência.
      A poesia e o canto, comprometidos com a revolução (seja esta qual for), fazem ainda sentido. Hoje também é preciso "acordar" as mentalidades para a mudança de comportamentos; para os cuidados que trarão o desconfinamento necessário a uma vida com mais cor, dando-nos maior liberdade. 
   Por isso, relembro "Acordai", canção heroica, um dos hinos nacionais de resistência, que contribuíram para exaltar a liberdade e motivar quem lutava contra o salazarismo. Inicialmente publicada em 1946, foi silenciada pela Censura; contudo, muitos resistentes a divulgaram, de forma subreptícia, em encontros clandestinos ou em países de exílio. Hoje partilho-a sem "a dor / dos silêncios vis" de outrora; antes com a distância dos que, limitados, não são servis:

ACORDAI

Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raiz

Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações

Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!

A voz de Teresa Salgueiro 
com os versos de José Gomes Ferreira e a música de Fernando Lopes Graça

       Acordai ou a cor dai a este dia (sem frenesins), pelo que foi, pelo que é e pelo que poderá e deverá continuar a ser, sem que nada acinzente a democracia.

       Outro dia poderá ser mais feliz, mas tem este a liberdade há quarenta e seis anos conquistada.
        

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