quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Coesão sem coerência... não dá texto

      É uma questão já clássica, aquela que sublinha a dimensão interpretativa e a relação do interpretante com os enunciados que lê.

      O pensamento proposto no título surgiu-me ao ver uma foto num apontamento de um blogue (Mariana - cf. 'tag' com 'A minha lista de blogues', à direita). 
(Uma das várias fotos do blogue Mariana)
     Uma foto de quivis intitulada 'Coesão' pode ter muito para dizer, mas não deixa de sugerir o que fica em falta: a coerência.
    A coesão é importante, nos seus vários mecanismos, para se obter uma unidade significativa, de sentido. Mas a coerência também! É na base destes dois princípios da pragmática e linguística textual que se compõem os textos (e não só!). Também na vida política dir-se-ia que, por mais que se fale em coesão (numa coligação), falta por vezes a coerência. São já dois domínios (linguístico e político) a frisar a necessidade da última para que tudo faça sentido. Tal não acontece, mesmo quando a coesão se instaura.
       Senão vejamos:
             (a propósito da ramada que a foto dá a ver)

       "Há uma ramada cheia de quivis num quintal em Gondomar.
        No Brasil, ela serve de abrigo ao gado.
        Nos rios, também há quem a use para acolher o peixe.
        Por fim, o povo diz que a ramada é ainda bebedeira pegada.
      Em suma, em vários locais e no saber popular a ramada pode dar outros frutos, além dos quivis que também podem ser aves na Nova Zelândia".


       Por mais coesos que os enunciados acima se procurem mostrar (pouco mais além do que na sua dimensão frásica e interfrásica), há alguma dificuldade em entendê-los como texto - essa unidade significativa que o leitor / interpretante constrói à luz de conhecimentos e fatores relacionais, capazes de compor o todo que cinco enunciados parecem não ter.

       Assim, junte-se à coesão a coerência, porque aquela sem esta parece ser remendo para tecido sem medida (justa).

2 comentários:

  1. Pois, de facto, meu caro Vítor, tens toda a razão: os enunciados acima mais parecem lista de frases do que texto, por causa da (aparente) falta da tal coerência.

    Mas- em jeito de sugestão – dá-lhes a forma de poema, dá-lhes um título do género “Ser ou não ser Quivi” ou “A insustentável Leviandade do Quivi” (isto só para parafrasear, adulterando, os clássicos), ou talvez ainda “Há quivis e… quivis” e terminas com um ponto de exclamação! Voilà: tens o problema resolvido!

    Já sei: acrescentei informação, manipulei a forma!

    Segunda sugestão: assina-o com um nome possante, põe-no numa rubrica intitula “Poesia”… E os enunciados serão texto!

    Já sei: é melhor dedicar-me à minha rendinha que também vive da coerência e da coesão!
    beijinho e continuação de bom domingo!
    IA

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  2. Ai, minha prezada Isaura,

    Tu tanto sabes de rendinha como de coesão e coerência (poéticas ou não).
    É verdade que acrescentaste informação (título - como nas adivinhas, que aparentemente não têm coerência explícita, mas ganham-na assim que se descobre o tema-título); manipulaste a forma e derivaste no tema (focalizando os quivis, quando o tema recorrentemente utilizado e mais marcado pela coesão é 'ramada').
    Para ser poesia, falta aos enunciados respiração e ritmo; motivação intrínseca entre significante e significado capaz de derivar, no todo, como novo significante para submeter a nova interpretação; sonoridades; tom; relação artística, cultural e simbólica capaz de sugerir / produzir desafio, jogo, linha interpretativa mais ou menos audaciosa, com a escrita a instituir um código alternativo, lúdico, fictivo e/ou emocionalmente projetado, concentrado, intensificado, a ponto de parecer inspiração divina.
    Quanto ao nome possante, falta saber quem o empossa! Possa!
    Disto já tu sabes.
    Faz rendinha, escreve poemas, conta histórias e terás sempre coesão e coerência à medida que baste, para que tudo ganhe sentido.
    Beijinho e bom resto de domingo.
    VO

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